Campus de Ribeirão Preto quer ciclovia para se integrar à cidade

Ideia não é nova mas ganha força com pandemia. Projeto se inspira em iniciativas de várias cidades pelo mundo

 11/08/2020 - Publicado há 4 anos
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O campus da USP em Ribeirão Preto estuda a possibilidade de implantar uma ciclovia de 9,343 km, com custo orçado em R$ 1,7 milhão, que vai permitir ao usuário circular entre os diversos prédios das oito unidades de ensino e os serviços prestados como o restaurante universitário, as moradias estudantis e a biblioteca, por exemplo. Um projeto nesse sentido foi feito pelo USP Recicla, programa de educação ambiental da Superintendência de Gestão Ambiental (SGA).

Foto: Silvio Tucci Junior/FMRP – Fotomontagem/Jornal da USP

A ideia ganhou força em função do isolamento social devido à pandemia do Sars-Cov-2 e à ciclovia que a Prefeitura da cidade está construindo e que vai ligar o centro de Ribeirão Preto ao campus pela Avenida do Café, principal artéria de acesso ao campus. Outras questões como a sustentabilidade, com menor poluição ambiental, e de saúde também foram levadas em conta. “As pessoas que se deslocam para o trabalho ou para a escola de bicicleta têm de 10 a 14% menos chances de morrer de doenças cardiovasculares do que quem usa carro,” explica o professor Fernando Bellíssimo Rodrigues, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.

Bellíssimo é membro da comissão do USP Recicla e encomendou o projeto ao estagiário do programa, Vinícius Gomes de Oliveira, estudante do terceiro ano de graduação na Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP. Oliveira adaptou projeto já existente e que está no Plano Diretor do campus. “Fizemos reuniões com pessoal da Prefeitura do campus para alinhar as ideias e o resultado é um projeto com traçado mais enxuto,” garante o estudante que pesquisou ainda iniciativas semelhantes adotadas por cidades em todo o mundo e escreveu um artigo, defendendo a ideia da ciclovia no campus (leia o artigo no box). 

O novo projeto leva em consideração padrões existentes na atual legislação, o respeito a distanciamentos laterais e as sinalizações de trânsito necessárias. “Tudo vai respeitar os parâmetros de segurança e aproveitar as vias existentes. As obras serão de melhorias das vias para adequar à ciclovia. Calculamos que haja um acréscimo de 1,4 mil novos usuários de bicicletas com a construção da ciclovia,” afirma.

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Foto: Vinicius Gomes de Oliveira

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A ideia da ciclovia não é nova. Na administração do professor José Aparecido Da Silva, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, à frente da Prefeitura do campus de 2005 a 2009, foi construída uma faixa de ciclovia da USP na Avenida Catão Roxo. Outras ideias apareceram, mas o assunto se aprofundou na gestão do professor Américo Ceiki Sakamoto, da FMRP, de 2016 a 2019, quando entrou no Plano Diretor do campus. Mas, adiantou o professor Bellissimo, agora a discussão da ciclovia será encaminhada para o Conselho Gestor do Campus da USP Ribeirão Preto. Se aprovada, a ciclovia vai ser construída em etapas.

Ouça no player acima a entrevista completa de Fernando Bellissimo Rodrigues e Vinícius Gomes de Oliveira ao Jornal da USP no Ar, Edição Regional.

 

O uso da bicicleta como meio de transporte no ambiente pós covid-19

Por: Vinícius Gomes de Oliveira

Muito tem-se falado sobre o novo normal, um estilo de vida diferente a que vamos ter que nos acostumar no mundo pós coronavírus. Nesse novo normal, parece cada vez mais claro que maior higiene, uso de máscaras e distanciamento social entre pessoas será a regra. Mas o que esperar da mobilidade urbana, cenário que estamos habituados a ônibus e trens lotados?

Em Ribeirão Preto,  a divisão modal da mobilidade é caracterizada por 52% das viagens por veículo motorizado individual (carro ou moto), 22,3% não motorizado a pé, 18,2% motorizado coletivo (os ônibus), 2,8% não motorizado por bicicleta, e 4,7 por outros meios, de acordo com o plano de mobilidade urbana municipal de 2010.

A tendência da nova forma de deslocamento será por aumento do uso de transporte motorizado individual, que já corresponde a mais da metade das viagens, por motorizado coletivo ou não motorizado por bicicleta. Dado o cenário de grave crise econômica, com aumento dos preços de combustíveis regulados pelo dólar, e o novo mindset ecológico, o aumento do uso do carro não parece ser a aposta.

Tampouco o transporte coletivo é uma aposta muito inteligente, dada a necessidade de distanciamento social. Apesar de, enquanto escrevo essa matéria em 09 de Julho, observarmos retorno dos ônibus e trens lotados nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, a realidade de Ribeirão Preto tem uma oportunidade ímpar de mudar a forma como se desloca. 

Ao observar iniciativas europeias incentivando de forma robusta o uso da bicicleta como o novo meio de transporte ideal, as quais falarei mais detalhadamente abaixo, sabemos qual seria o melhor caminho para a mobilidade urbana. Ribeirão Preto possui características que a tornam propícia para acompanhar essa tendência. Centro urbano relativamente pequeno, avenidas principais com larguras amplas e topografia favorável, número de dias chuvosos pequeno. 

Se houvesse maior segurança no trânsito ao se deslocar por bicicleta, certamente os usuários de automóveis e ônibus coletivos seriam encorajados a mudar seu padrão de mobilidade. Vejamos então as ações adotadas por países que são exemplo de mobilidade urbana.

No último mês de Junho na Itália, o governo passou a oferecer até 60% de bônus na compra de uma bicicleta nova, somando subsídios de 120 milhões de euros. A prefeitura de Roma declarou plano de ampliar a malha cicloviária em mais 150 quilômetros. A cidade de Milão anunciou em Maio um plano para substituição de veículos poluentes por novos e incentivo de compra de bicicletas e scooters elétricas. Para os cidadãos Milaneses o incentivo é de 1.500 euros. Além disso, o plano de reestruturação prevê construção de mais 35 quilômetros de ciclovias na cidade, e redução de velocidade dos carros nas diversas pontes existentes nas ruas. Outra iniciativa da cidade de Milão é o incentivo das scooters elétricas compartilhadas. Em Maio o governo autorizou mais 3500 unidades com a licença de mais 5 empresas do setor.

Em Londres o governo anunciou intenção de ampliar ciclofaixas e calçadas, bem como implantar corredores de ciclovias seguindo as linhas do metrô. O pacote de mobilidade monta certa de 5 bilhões de libras. Um montante de 250 milhões de libras está sendo destinado para ciclovias temporárias, pavimentação mais larga e espaços de estacionamentos. Uma pesquisa da ONU mostra que 57% dos usuários de transporte coletivo pretendem reduzir seu uso, com medo de infecções. Na Escócia, a mesma iniciativa monta 10 milhões de libras. O uso da bicicleta no Reino Unido já disparou. A BBC reportou aumento de 200% no uso para ir ao trabalho, com aumento das vendas das bicicletas elétricas em 184% entre Fevereiro e Abril.

Bruxelas anunciou pacote de 500 mil euros ampliando 40 quilômetros de ciclovias e espaços de estacionamento para mais 6.000 bicicletas. Além disso, estipulou lei reduzindo a velocidade no centro para veículos de 30 para 20 km/h. Paris anunciou em Maio a liberação de 22 milhões de euros para criação de ciclovias temporárias. A cidade acumula 650 quilômetros de vias para bicicletas e scooters. Na Alemanha, mais de 100 cidades já aderiram ao plano de remarcar algumas faixas de trânsito originalmente usadas por carros, para ciclovias temporárias durante a pandemia. O incentivo é tamanho que durante o lockdown as lojas de bicicletas de vendas e reparos puderam permanecer abertas. Barcelona removeu temporariamente 21 quilômetros de estacionamentos de carros para ciclovias. Budapeste também criou ciclovias temporárias e reduziu o preço para o compartilhamento de bicicletas pagas. Em Pequim o uso da bicicleta compartilhada por aplicativos já aumentou em 150% desde o início do afrouxamento do lockdown, de acordo com notícia da revista Fortune. 

Nos Estados Unidos as iniciativas são menos contundentes. Contudo, Nova Iorque também se prepara para o aumento do transporte por bicicleta. A prefeitura está viabilizando um projeto para reduzir as áreas destinadas a carros e espera aumentar em até 60% o uso de bicicletas compartilhadas nos próximos meses. Berlim, Paris, Bruxelas e Milão também estão investindo em educação, com aulas sobre como iniciar no ciclismo e realizando reparos mecânicos grátis. Paris inclusive está oferecendo reembolso de 50 euros para os cidadãos que voltarem a utilizar velhas bicicletas reformadas.

Diante disso, Ribeirão Preto pode aproveitar a oportunidade da crise e melhorar seu quadro de mobilidade urbana. Acompanhar as principais iniciativas das cidades que são exemplo no transporte urbano é, além de uma boa tendência, uma saída para grandes congestionamentos e transporte público lotado.

Este texto é parte integrante do projeto de mobilidade urbana do USP Recicla, vinculado à Superintendência de Gestão Ambiental de Ribeirão Preto, sob coordenação do professor Fernando Bellíssimo. Um dos objetivos é propor a construção de ciclovias dentro do campus da USP.

 


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