Prêmio internacional reconhece 20 anos de pesquisa arqueológica na Amazônia

Academia Chinesa de Ciências Sociais premiou o trabalho realizado por professor do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP

 21/01/2020 - Publicado há 4 anos     Atualizado: 23/01/2020 as 12:01
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Escavação de depósitos antrópicos de solo escuro (Terra Negra Antrópica) no sítio de Hatahara, Amazônia Central, em 2006 – Foto: Cedida pelo pesquisador
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Em 2019, a arqueologia brasileira foi mais uma vez reconhecida internacionalmente. Entre os dias 14 e 17 de dezembro, o 4th Shanghai Archeology Forum (SAF), organizado pela Academia Chinesa de Ciências Sociais, premiou o trabalho realizado pelo professor Eduardo Góes Neves, do Laboratório de Arqueologia dos Trópicos do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP.

Desde os anos 1990, o docente atua em um projeto na Amazônia que, além de estar em um dos maiores estados brasileiros, tem um histórico de ocupação humana que ultrapassa os 14 mil anos. Entretanto, até recentemente, a área era pouco explorada pela arqueologia moderna.

O professor Eduardo Góes Neves – Foto: Reprodução / Pesquisa Fapesp

“Foi premiado um conjunto de pesquisas que faço na Amazônia brasileira há mais de 20 anos, desde o meu doutorado”, conta Neves. De 1995 a 2010, ele coordena, em parceria com os pesquisadores Michael Heckenberger e James Petersen, o Projeto Amazônia Central, onde vários sítios grandes foram escavados pela primeira vez. O trabalho envolveu a participação de estudantes e profissionais do Brasil e do exterior.

Em artigo para o fórum em Xangai, o professor esclarece que a maior parte das escavações estava associada a escolas de campo, o que permitiu o treinamento de toda uma geração de jovens arqueólogos. Somente entre 1999 e 2000, Neves supervisionou oito escolas de campo na Amazônia Central. “Muitos dos estudantes que frequentaram essas escolas de campo estão atualmente trabalhando em faculdades de universidades no Brasil, nos Estados Unidos e no Reino Unido”, afirma ele.

Além do treinamento de futuros arqueólogos, o objetivo do trabalho foi mostrar como povos indígenas e populações tradicionais têm modificado os biomas amazônicos. “A gente não pode olhar para a Amazônia como uma floresta natural, mas como floresta que é resultado de manejos populacionais ao longo dos milênios”, explica.
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Eduardo Góes Neves no Sítio Floresta, na bacia do Rio Negro, em 2009 – Foto: Filippo Stampannoni

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De acordo com o professor, a conquista científica mais importante da pesquisa foi o mapeamento e escavação sistemática de vários locais com matrizes compostas por solos escuros e altamente férteis, conhecidos como terras pretas ou Terra Negra Antrópica.

Apesar da importância do território amazônico, “não havia arqueologia organizada na região”, reforça ele. “É difícil encontrar no Amazonas sítios datados de mais de 2500 anos, apesar dos mais de 10 mil anos de ocupação”, revela.

Por isso, o trabalho no sudoeste da Amazônia envolveu vários projetos. “Venho realizando escavações de longo prazo em dois locais, Teotônio e Monte Castelo, ambos com registros de ocupação humana em grande parte do Holoceno [período atual da história da Terra, iniciado há cerca de 11 mil anos]. Também mapeei escavações de locais do Holoceno tardio associados a montes e uma rede de estradas lineares no estado do Acre”, conta em artigo.

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Escavação do estrato inicial do holoceno (cerca de 7.000 a.C.) em Teotônio, Amazônia, 2019 – Foto: Cedida pelo pesquisador
Amostragem do perfil do monte no sítio Sol de Campinas, Acre, Amazônia, 2014 – Foto: Cedida pelo pesquisador

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Uma arqueologia vibrante

Com o envolvimento de grandes equipes no decorrer de duas décadas de pesquisa, o professor defende que o campo da arqueologia no País está “cada vez maior e mais vibrante”. E o reconhecimento internacional é um dos sinais de sua qualidade.

“Para uma universidade como a USP, esse reconhecimento é muito positivo porque mostra que a qualidade da pesquisa que fazemos aqui é comparável com a dos maiores centros do mundo”, opina Neves.
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Exame e discussão do perfil do monte em Sol de Campinas, no Acre, 2014 – Foto: Cedida pelo pesquisador

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A partir de agora, ampliar os programas de pós-graduação na área nas universidades brasileiras é crucial. “A Arqueologia está crescendo, e é cada vez mais interessante no Brasil. Isso é resultado do incentivo pelo qual passou a pós-graduação nos últimos anos”, defende ele.

Para o professor, que participou do fórum pela primeira vez, o importante neste momento, em que a Ciência brasileira sofre com contingenciamentos e perseguições, “é não perdermos as conquistas que fizemos nos últimos 20 anos”.

Mais informações: site http://shanghai-archaeology-forum.org/, email edgneves@usp.br, com Eduardo Góes Neves

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