Desde fevereiro passado, um grupo de vizinhas da Vila Romana, em São Paulo, se reúne semanalmente na Casa Amarela – uma construção histórica em processo de tombamento, localizada naquela vila – para refletir sobre o bairro, as casas antigas e os sentimentos e recordações que envolvem essas edificações. O Coletivo das Vizinhas – como se denominou o grupo – é formado por seis moradoras da Vila Romana, com idades entre 75 e 85 anos, e tem a coordenação da artista plástica e educadora Janice de Piero, proprietária da Casa Amarela, que foi construída em 1921 por seu avô – o imigrante italiano Angelo de Bortoli – e hoje funciona como um centro cultural e de preservação da memória.
Depois de seis meses de encontros semanais – em que também foram lidos trechos do livro Poética do Espaço, do filósofo francês Gaston Bachelard (1884-1962) -, o Coletivo das Vizinhas promove a sua primeira exposição, Onde a Casa Mora?, que foi inaugurada no dia 24 passado e fica em cartaz até 30 de novembro na Casa Amarela da Vila Romana.
A mostra traz fotos das casas e dos moradores, que foram objeto de reflexões naqueles encontros. Há também imagens que registram as marcas do tempo nas paredes das casas, como rachaduras e descascados, obtidas através do processo conhecido como frotagem (fricção do lápis sobre papel em superfície texturizada). “Essas mulheres são moradoras muito antigas do bairro e atualmente sofrem graves abalos causados pelo mais recente empreendimento imobiliário na região, no coração de suas habitações, que são próximas umas das outras”, explica Janice. “O componente espacial é muito importante, e nele existe como que um adensamento da memória, misturando história privada e pública.”
Uma atividade sensorial realizada pelo Coletivo das Vizinhas – a medição das casas e dos corpos das moradoras, com o objetivo de refletir sobre as transformações ocorridas ao longo do tempo – também é destacada na exposição. “A intenção é criar ambientes relacionais na atualidade, mesmo que mobilizem o passado e que impulsionem por conta disso livres pensamentos, novos olhares, possibilitando que cada cidadão possa acrescentar sua própria visão sobre o que lhe é apresentado”, afirma Janice.
Um desdobramento da exposição é uma ação pública intitulada Coisas do Saber. Ela consiste em afixar nos postes das ruas do bairro – em forma de sticker (papel adesivado) – textos sobre o modo de vida, a estrutura urbana e os lugares de convívio da Vila Romana antiga. Os textos foram escritos pelo Coletivo das Vizinhas. Essa ação contou com a colaboração do designer e artista visual Gustavo Piqueira, que criou a arte para o suporte dos textos. “Todo o processo de produção dos textos é mostrado na exposição”, acrescenta Janice.
A exposição Onde a Casa Mora? faz parte de um projeto da Casa Amarela que é acompanhado por um coletivo curatorial formado por seis colaboradores da Casa Amarela. Eles são o professor Leonardo Mello e Silva, do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, a professora Cibele Lopresti Costa, doutora em Literatura Portuguesa pela FFLCH, a educadora Helena Freire Weffort, formada em História pela FFLCH, a pesquisadora Ros Mari Zenha, formada em Geografia pela FFLCH, e a educadora Diana Tubenchlak, mestre em Artes pela Universidade Estadual Paulista (Unesp).
.
.A exposição Onde a Casa Mora?, do Coletivo das Vizinhas, coordenado pela artista Janice de Piero, fica em cartaz até 30 de novembro, sempre aos sábados, das 14 às 18 horas (outros dias e horários podem ser agendados previamente), na Casa Amarela da Vila Romana (Rua Camilo, 955, Vila Romana, em São Paulo). Entrada grátis. Mais informações estão disponíveis neste site.