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Um clássico do Cinema Novo, Terra em Transe completa 50 anos e é considerado a obra-prima do diretor brasileiro Glauber Rocha, que recebeu o prêmio de direção no Festival de Cannes e de melhor filme no Festival de Havana. A obra do diretor ainda interessa ao público e estudiosos de diversos campos e esse foi um dos motivos que levou Joabe França Mendonça a discutir e “a deslindar o papel que o filme ocupou em nossa história, em aspectos tanto políticos como estéticos e técnicos”, sempre sob uma perspectiva histórica. O artigo da revista Humanidades em Diálogo mostra a história do Brasil como metáfora apresentada no filme.
Com o golpe militar de 1964 e os consequentes conflitos sociais, políticos e econômicos, Glauber e outros artistas se ressentiram da esperada revolução na sociedade, apostando na conscientização “dos oprimidos”. Na época da censura, Terra em Transe acabou motivando a mudança do espectador de cinema, acostumado à linearidade dos filmes americanos, na medida em que possibilitou “múltiplas interpretações, uma fragmentação visual e narrativa”, deslocando o espectador e estimulando uma visão crítica que, muitas vezes, acabava gerando desconforto. Isso porque, como afirma o autor, os filmes nacionais não condizem “a um mundo tecnicamente desenvolvido e moralmente ideal como se vê nos filmes de Hollywood”.
Mendonça conta que, para Glauber, a arte, para ser moderna, precisa ser ética e revolucionária, oposta à dominação – isso é Cinema Novo, aquele que propõe desafios importantes como o tipo de linguagem a ser utilizado, não simplificada, altamente questionada por Glauber, pois, segundo ele, “o povo é complexo”. Ambientado na fictícia República de Eldorado, o filme conta com uma gama de personagens que incorporam períodos ou personagens da história da República, na crítica ao populismo, à estratégia da esquerda, ao conservadorismo que chegou ao Brasil Colonial e aqui permaneceu “como apanágio da aristocracia” . O enredo mostra uma crítica objetiva: “a esquerda não tem um projeto claro e racional”.
“Câmera nervosa”
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câmera nervosa.
Glauber Rocha, em seu filme premiado, ficou famoso pela intrigante movimentação da câmera, a chamada “câmera nervosa”, que atua como personagem, retrato das turbulências desse triste período histórico brasileiro. Terra em Transe “é um rico documento não apenas para analisar a história e evolução do cinema brasileiro, mas também para compreender a vida política do país”, afirma Mendonça, salientando a reivindicação de Glauber por meio da voz do personagem Paulo: “Precisamos resistir, resistir! Eu preciso cantar”, apesar de, no último plano do filme, a luta armada prenunciar que “os planos da esquerda tinham falhado”.
O filme de Glauber é uma alegoria, um símbolo de resistência política e um rompimento com os padrões comerciais, éticos e estéticos normalmente associados ao cinema americano. Em uma analogia com o Brasil de hoje, observa-se que o “transe” mostrado no filme, é a pura realidade, o que faz de Glauber Rocha um diretor atual e pertinente, que, para fazer cinema, precisava apenas de “uma ideia na cabeça e uma câmera na mão”.
Joabe França Mendonça é graduando em História pela USP.
MENDONÇA, Joabe França. “Precisamos resistir, resistir! Eu preciso cantar”: Terra em Transe e seu contexto histórico. Humanidades em diálogo, São Paulo, v. 8, p. 133-140, jun. 2017. ISSN: 1982-7547. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/humanidades/article/view/140543/135523>. Acesso em: 28 nov. 2017.
Margareth Artur / Portal de Revistas da USP