Urbanização já afeta chuvas e funcionamento do clima amazônico

Poluição influencia a química de isopreno lançado pela vegetação da Amazônia na atmosfera, alterando a formação de nuvens e a ocorrência de chuvas

 19/05/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 14/11/2017 às 8:39
Por
Foto: Claudio Matsuoka/Wikimedia Commons
Poluição atmosférica de Manaus interfere no equilíbrio do clima e ecossistemas amazônicos – Foto: Claudio Matsuoka/Wikimedia Commons

O impacto da urbanização de Manaus na floresta amazônica é muito significativo pois altera os mecanismos de formação e desenvolvimento de nuvens. E as chuvas constituem um dos ingredientes mais importante para o funcionamento do ecossistema amazônico. O alerta é do professor Paulo Artaxo, do Instituto de Física (IF) da USP, um dos autores do artigo Isoprene photochemistry over the Amazon rainforest, publicado em 16 de maio na revista científica PNAS. “Várias cidades da região amazônica como Santarém (Pará) e Porto Velho (Rondônia) também estão sofrendo um processo de crescimento acelerado. É preciso pensar quais consequências essa urbanização vai trazer para a floresta nas próximas décadas”, adverte.

Artaxo explica que o isopreno é o gás emitido para a atmosfera pelas plantas em maior quantidade entre todas as emissões da vegetação da floresta. Ele se transforma nas partículas que formam os núcleos de condensação de nuvens, e são estes núcleos que auxiliam na formação das chuvas da região.

O estudo avaliou quais são as razões de emissão de isopreno para a atmosfera; o quanto desse gás se transforma em núcleo de condensação de nuvens; e como a poluição de Manaus afeta o funcionamento natural da floresta ao alterar os mecanismos de oxidação do isopreno.

Conclusões

Imagem: Thais H. Santos/jornal.usp.br

O estudo faz parte do experimento GoAmazon e envolveu, além da USP, cientistas de diversos polos de pesquisa do mundo: Universidade de Harvard, Brookhaven National Laboratory, Universidade de Wisconsin-Madison, Universidade da Califórnia, Instituto de Tecnologia da Califórnia e do Pacific Northwest National Laboratory, todas do Estados Unidos; e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia e da Universidade do Estado do Amazonas, no Brasil.

Graças aos equipamentos sofisticados e às medições feitas em solo e com auxílio de avião do Departamento de Energia dos Estados Unidos, foi possível quantificar, com muita precisão, o fluxo de emissão de isopreno.”Nós observamos que as razões de emissão são mais elevadas que os valores medidos anteriormente. Esses resultados alteram a importância da vegetação amazônica e seu impacto no clima da região”, esclarece Artaxo. O principal equipamento utilizado é o PTR-MS (sigla em inglês para Proton Transfer Reaction Mass Spectrometry), específico para medir a concentração de compostos orgânicos voláteis como o isopreno.

O estudo também obteve dados sobre a fração de isopreno que se transforma em partículas e qual o efeito delas para nuclear as gotas de nuvens. Para formar uma nuvem, explica Artaxo, é necessário vapor de água, e uma minúscula partícula que atue como semente dessas gotas de nuvens para que o vapor possa se condensar na superfície das partículas. “Sem elas, não se formam gotas de nuvem e, portanto, nem nuvens ou chuvas”, diz.

Controle climático da Amazônia

Floresta amazônica - Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
Floresta amazônica – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens

De acordo com Artaxo, até recentemente não se tinha uma ideia exata da fração que vem da oxidação de isopreno, pois havia somente medições pontuais em algumas torres do experimento LBA (Experimento de Grande Escala da Biosfera e Atmosfera da Amazônia). “O avião fez essa medição em uma escala muito grande, em um raio de 200 a 300 quilômetros de Manaus”, relata. Os dados obtidos reforçam a evidência do controle climático da Amazônia pela própria floresta. “A floresta controla a quantidade de núcleo de condensação de nuvens na atmosfera. Era uma suspeita que tínhamos há alguns anos. Este estudo confirmou e quantificou esse impacto.”

A pesquisa traz ainda dados sobre como a poluição de Manaus influencia a região. “Descobrimos que determinados compostos, como os óxidos de nitrogênio, expelidos por automóveis e indústrias, alteram os mecanismos de oxidação de isopreno. Essa oxidação é crítica para fazer esse isopreno formar novas partículas”, adverte o pesquisador.

Para efeitos comparativos, São Paulo tem 7 milhões de automóveis, 10 vezes mais que Manaus. Mas a capital amazonense está localizada em uma região muito isolada, no meio da floresta. “Trata-se de uma configuração muito especial. É uma fonte de poluição pontual completamente distinta do restante do planeta, pois está isolada por 1.500 quilômetros de florestas em todas as direções. Isso nos permitiu desenhar o experimento GoAmazon e analisar o impacto dos poluentes atmosféricos emitidos por automóveis nas emissões naturais da floresta”, conclui.
.

Imagem: Thais H. Santos/jornal.usp.br

.

Mais informações: email artaxo@if.usp.br, com o professor Paulo Artaxo
.
.


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.