O professor Guilherme Wisnik, em sua primeira coluna do ano, responde à seguinte pergunta: a razão dos desastres que aconteceram na região de São Sebastião se deve unicamente à força da chuva, que foi excepcional e inédita na história das medições no Brasil? Claro que isso fez diferença, diz ele, mas também é preciso lembrar que as pessoas mais atingidas pela tragédia são as mais pobres e desassistidas, ocupando moradias informais em ocupações localizadas em áreas de risco. O detalhe, que fez e faz toda a diferença no caso, é o de que estão totalmente desassistidas pelo poder público e também pelo privado. Muitas delas eram caiçaras que moravam há muito tempo nesses lugares e que foram vendendo suas propriedades para as classes média e alta que foram chegando. Estas, por sua vez, construíram suas casas de veraneio nesses lugares e contrataram aquelas pessoas para trabalhar a seu serviço nessas moradias.
O poder público, por outro lado, tem tudo a ver com uma urbanização que segue por condomínios privados, já de início verificando se essas ocupações encontram-se em aéreas de proteção ambiental. “E aí muitas das casas das classes médias e altas ocupam essas áreas que não deveriam e, ao ocupar, cortando morros, acabam submetendo esses lugares a transformações, acabam piorando o desempenho depois na época das chuvas, quando então as raízes das árvores já não estão mais ali para segurar aquele solo, que vem desabando. E, sim, a Prefeitura e o governo do Estado têm que entender que, para uma cidade existir, ela tem que ter essas populações que realizam os serviços.”
Por isso, na visão de Wisnik, essas pessoas têm que estar dignamente assentadas, morando em lugares que não representem um risco para ninguém, o que subentende a construção de conjuntos habitacionais de baixa renda, os quais sejam previstos na urbanização desses locais e que sejam subsidiados por esse mesmo poder público, “porque essas pessoas não surgem do nada para fazer os serviços de limpeza na casa dos mais ricos, elas não se materializam do além, elas são justamente pessoas que moram ali e são como se fossem invisíveis no processo de urbanização periférico. O que nós temos que atentar e batalhar à luz dessas tragédias, que vão se repetir no futuro próximo, é que essa urbanização mais includente possa acontecer daqui para a frente”.
Espaço em Obra
A coluna Espaço em Obra, com o professor Guilherme Wisnik, vai ao ar quinzenalmente quinta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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