Mosaicos Culturais #46: Pedaço de Mim, de Chico Buarque, através de testemunho e ferida aberta, expressa a dor da perda

Ouvintes da Rádio USP podem ouvir os versos como uma instância capaz de traduzir experiências traumáticas que aludem à tragédia pessoal de Zuzu Angel, que perde o filho, assassinado pelos militares durante a ditadura, algo que ecoava nos fones de ouvido de Davi, estudante de Ciências Sociais na USP

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 Publicado: 18/06/2024
Mosaicos Culturais - USP
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Mosaicos Culturais #46: Pedaço de Mim, de Chico Buarque, através de testemunho e ferida aberta, expressa a dor da perda
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Pedaço de Mim, composta pelo escritor e compositor Francisco Buarque de Holanda e interpretada por Zizi Possi, é um lamento de profunda dor. Uma expressão lírica intensa sobre a saudade e a perda. A música descreve a sensação de ter algo essencial arrancado de si, algo que é sentido como uma parte integral do ser. A repetição do verso “Oh, pedaço de mim” enfatiza a ideia de incompletude e de um vazio deixado pela ausência de alguém muito querido (com informações de letras.mus.br).

Um testemunho histórico sob a forma de uma canção popular:

Mãe de Stuart Angel Jones, preso político em 1971, Zuzu Angel, ativista contra a ditadura, foi homenageada por Chico Buarque nas canções Angélica e Pedaço de Mim.

Conhecida como Zuzu Angel, Zuleika Angel Jones (1921-1976) foi uma brasileira de classe média, estilista de moda reconhecida internacionalmente. Seu filho, Stuart Angel, militante político de esquerda, desapareceu em 1971 na cidade do Rio de Janeiro. Em depoimentos à investigação conduzida pela Comissão Nacional da Verdade, constam em arquivos da Aeronáutica documentos que provam que Stuart teria sido morto dois dias depois de seu desaparecimento. O paradeiro do corpo jamais foi descoberto (com informações de Bezerra& Barcelos, 2020).

Capa do álbum: Chico Buarque. 1978

Pedaço de Mim foi composta em 1977, dentro da estrutura da Ópera do Malandro, mas gravada em 1978 no LP Chico Buarque em dueto com a cantora Zizi Possi.

Em meio à brutalidade da ditadura militar

Na letra da música vivenciamos a agonia da mãe enlutada pelo filho Stuart, vítima da repressão. A letra, em sua simplicidade brutal, mostra metáforas que traduzem a ferida dilacerante da perda: um “pior tormento”, um “barco” à deriva, o “revés de um parto”. A cada estrofe, um lembrete da crueldade humana e da impotência diante da morte.

Símbolo da ausência eterna

A referência ao “quarto do filho que já morreu” é particularmente tocante, sugerindo uma perda irreparável e profunda, talvez a mais dolorosa de todas: a perda de um filho. Chico Buarque é conhecido por suas letras que frequentemente exploram temas de amor, política e questões sociais, com uma habilidade única de tecer críticas sociais sutis em suas canções. Pedaço de Mim se destaca como uma obra que explora a dimensão pessoal e íntima da saudade, um sentimento universal que toca a alma humana. A música se torna um veículo para expressar a dor da separação e o desejo de uma conexão perdida, ressoando com ouvintes que já experimentaram a amargura de dizer adeus (com informações de letras.mus.br).

Para Davi Hidro, estudante de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, “Pedaço de Mim é uma música bem triste, mas eu acho lindo também! O Chico, quando compôs, tinha na mente o caso que aconteceu com uma moça na ditadura. Ela era uma estilista e o filho dela foi morto e seu corpo desapareceu.” Davi encontra na letra a expressão do luto e a força para se colocar no lugar de Zuzu, imaginando a angústia de uma mãe que buscou em vão por seu filho. Davi também comentou sobre Construção. Leia mais e ouça por aqui.

Ouvir Pedaço de mim nos ajuda a refletir sobre a fragilidade da vida, a importância da memória e a necessidade de lutar por um mundo sem violência e injustiças.

Ouça o podcast no link acima.

O programa celebra a diversidade cultural, a riqueza da música brasileira e cria um senso de comunidade. O objetivo é dar voz aos estudantes da USP por meio de entrevistas sobre gostos e percepções musicais. Este podcast reproduz a experiência de escuta no programa Mosaicos Culturais – Ouça o Que os Estudantes Ouvem, transmitido nos dias 17 e 18 de junho de 2024. Dia 19 de junho, Chico Buarque completa 80 anos!


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Ouça o que estudantes ouvem

Estudantes da USP podem participar de Mosaicos Culturais. Basta gravar um áudio respondendo à pergunta “O que você anda ouvindo?” e enviá-lo para a Rádio USP pelo WhatsApp (11) 97281-5789.
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vai ao ar de segunda a sexta-feira, às 11h e às 16h na Rádio USP (93,7 MHz, em São Paulo, e 107,9 MHz, em Ribeirão Preto), e ainda via internet, através do site da emissora no link jornal.usp.br/radio/. É possível também sintonizar a versão podcast pela internet em jornal.usp.br/podcasts/ Todos os episódios de Mosaicos Culturais – Ouça o Que os Estudantes Ouvem estão disponíveis na página de seu arquivo neste link.

Apresentação e edição: Caroline Kellen
Identidade sonora e produção: Bruno Torres
Edição: Cid Araujo
Supervisão: Magaly Prado

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