Proximidade entre animais domésticos e silvestres traz riscos de doenças a humanos

Programa da USP busca soluções para melhorar a convivência entre cães, gatos e animais silvestres

 01/03/2018 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 23/04/2018 às 14:56
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“O crescimento desordenado de áreas urbanas próximo a espaços antes habitados apenas por animais silvestres e a falta de conscientização de tutores quanto à posse responsável de cães e gatos são as principais causas do problema”, diz Anaiá Sevá – Foto: Arquivo de pesquisa Cãoservação.

O contato direto entre animais silvestres, cães e gatos pode resultar em propagação de doenças por vírus e bactérias de origem animal. As doenças transmitidas aos humanos como a raiva e a toxoplasmose são graves e podem levar à morte ou a distúrbios neurológicos. Para traçar diagnóstico e avaliar as implicações dessa proximidade para a saúde pública, pesquisadores da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP vêm monitorando desde 2015 o fluxo de entrada e saída de animais domésticos em uma Unidade de Conservação Ambiental em bairros do entorno do Parque Estadual Carlos Botelho, no município de São Miguel Arcanjo, interior de São Paulo.

Os dados do programa Cãoservação são preliminares, mas já foi constatada a morte de um cachorro-do-mato, encontrado na zona urbana do município, com sintomas de cinomose, doença que afeta os canídeos em geral – cachorros, raposas, cão-do-mato, dentre outros. Segundo Anaiá da Paixão Sevá, uma das pesquisadoras envolvidas no programa, “é alta a probabilidade deste animal ter sido contaminado ao entrar em contato com cães domésticos infectados ou com suas excreções”.

Coleta de material para pesquisa – Foto: Arquivo de pesquisa Cãoservação

Outro caso que chamou a atenção foi que, em contato com agentes da Secretaria da Saúde do município onde se realizou o trabalho, pesquisadores obtiveram a informação de que na região foram diagnosticados casos de gestantes infectadas com toxoplasmose, doença que traz graves complicações à gestação. A transmissão acontece pelo contato com fezes de gatos com o parasita ou pela ingestão de água ou carne crua ou mal passada infectada. Neste caso, a hipótese considerada foi transmissão por patógeno animal. Cães e gatos avaliados como positivos indicaram que o agente estava em circulação na região, afirma a pesquisadora.

A toxoplasmose, a leptospirose, a raiva e a leishmaniose são as doenças mais comuns transmitidas pelos animais aos humanos. A raiva, por exemplo, chega aos humanos por meio dos cães, gatos e animais silvestres, incluindo morcegos. A transmissão acontece pelo contato com a saliva infectada que pode ser repassada através da mordida ou pelo contato com excrementos. A pessoa contaminada com o vírus Lyssavirus sp tem o sistema nervoso central afetado e pode vir a óbito por encefalomielite. Mas os humanos também oferecem perigo aos animais silvestres. Eles podem ser infectados por bactérias que são mais prevalentes em humanos, como é o caso da tuberculose.

Coleta de material para pesquisa – Foto: Arquivo de pesquisa Cãoservação

Invasão urbana em áreas de mata

Além de animais domésticos que entravam e saíam do parque à procura de alimentos, moradores relataram ter visto roedores e canídeos silvestres em áreas residenciais do município. Anaiá acredita que o crescimento desordenado de áreas urbanas próximo a espaços habitados por animais silvestres e a falta de conscientização de tutores quanto à posse responsável sejam as principais causas do problema. Segundo a pesquisadora, cães e gatos foram encontrados soltos pelas ruas e sem nenhuma supervisão, muitos deles em estado de desnutrição e feridos devido a acidentes de trânsito, brigas ou maus-tratos, afirma.

Anaiá e Ana Pérola (ao centro), pesquisadoras do programa Cãoservação:  Foto: Arquivo de pesquisa Cãoservação
Equipe de pesquisadores envolvidos – Foto: Arquivo de pesquisa Cãoservação

Os pesquisadores trabalharam em várias frentes: utilizaram radiocolares para detectar o trânsito dos animais domésticos; armadilhas fotográficas para avaliação das áreas de uso dos animais silvestres; além da realização de exames de sangue em cães, gatos e animais silvestres para identificar agentes infecciosos e os possíveis fluxos entre eles. E, por fim, foi aplicado aos moradores um questionário para avaliar a percepção deles em relação à questão. Segundo Ana Pérola Brandão, outra pesquisadora envolvida no programa, o envolvimento da comunidade é fundamental para que as ações propostas pelos pesquisadores possam ser acolhidas.

O estudo ainda não foi concluído, mas a ideia depois do diagnóstico será elaborar e aplicar uma proposta de gestão sanitária, com ações de esclarecimentos à população com relação à transmissão de doenças entre as espécies, guarda responsável dos animais domésticos e conservação da natureza.

O professor responsável pela pesquisa é Fernando Ferreira, da FMVZ. Além de Anaiá Paixão Sevá e Ana Pérola Brandão, existem outros pesquisadores envolvidos. O projeto conta com apoio do ICMBio e da Fapesp.

Mais informações: no site do programa


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