No Brasil, o oligopólio está presente em vários setores da economia, e não é necessariamente ruim

Daniel Bergmann e Diogo Coutinho explicam as principais características desse modelo de mercado e como isso impacta a sociedade

 10/01/2024 - Publicado há 4 meses     Atualizado: 01/02/2024 as 8:28
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A produção da cana-de-açúcar e de laranja já tem sentido os efeitos do surgimento de oligopólios e oligopsônios – Foto: Léo Ramos/Revista Pesquisa Fapesp

 

O oligopólio é um conceito importante na economia, caracterizado pela existência de poucas empresas que dominam determinado setor do mercado e controlam os seus preços e condições. Esse modelo possui dois tipos: concentrado, quando poucas empresas detêm quase a totalidade do campo, ou competitivo, quando há algum nível de concorrência entre os participantes — apesar de ainda ser centralizado.

O professor do Departamento de Administração da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) da Universidade de São Paulo Daniel Bergmann desenvolve: “Para identificar um oligopólio na prática, observam-se características como poucos produtores dominando a maior parte do mercado, produtos similares, barreiras à entrada de novos competidores e uma interdependência significativa entre as empresas no que diz respeito a preços e produção”.

O conceito na prática

Os setores de telecomunicações e petróleo são exemplos nos quais poucas empresas exercem um controle significativo do mercado e essa realidade apresenta tanto benefícios como prejuízos para a economia de um país. O especialista descreve como “uma espécie de espada de dois gumes”, a qual pode proporcionar inovação e eficiência por conta do capital dessas entidades e, por outro lado, pode resultar em altos preços e menos opções aos consumidores — visto que tem o potencial de inibir a entrada de novos concorrentes.

Daniel Bergmann – Foto: Arquivo Pessoal

Bergmann cita um exemplo internacional dessa prática: “Empresas como Google, Apple, Meta e Amazon dominam aspectos como motores de busca, smartphones, mídias sociais e comércio eletrônico, respectivamente. Essas empresas influenciam fortemente inovação, práticas de mercado e até mesmo aspectos culturais e sociais”. Em contrapartida, ele ressalta que as entidades enfrentam críticas e regulações, devido a preocupações relacionadas à privacidade de dados, monopólios e influência sobre a opinião pública.

Sob outro prisma, Diogo Coutinho, professor de Direito Econômico e Economia Política da Faculdade de Direito (FD) da USP, opina que, quanto menos empresas no mercado maior é a possibilidade de que elas deixem de competir e comecem a cooperar entre si, possibilitando o surgimento de um cartel. 

Não obstante, o docente apresenta uma outra visão: “Alguns mercados, por características específicas, tendem a funcionar melhor com menos empresas, como é o caso das telecomunicações e das companhias aéreas”. De acordo com ele, isso é possível porque são os “monopólios naturais”, isto é, não funcionam em regime de alta concorrência — ela se dá de forma mais acirrada quando existem menos entidades no mercado.

Realidade brasileira

Diogo Coutinho – Foto: ResearchGate GmbH

O Brasil é popularmente conhecido como “o país dos oligopólios”, uma vez que esse modelo está presente em vários setores, como o bancário, de aviação, telecomunicações e alimentício. Isso impacta de diferentes maneiras a economia e a sociedade como um todo, desde o estímulo em investimentos de larga escala até a restrição de escolhas no mercado.

Os grandes bancos identificados no Brasil — Itaú, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil — caracterizam um clássico exemplo de oligopólio em que controlam taxas de juros, serviços e disponibilidade de crédito. Além disso, na área de comunicação, se destacam apenas três empresas — Vivo, Claro e TIM —, que dominam o mercado de telefonia móvel e fixa no País.

Regulamentação

Os oligopólios, em si, não são ilegais, ou seja, não são punidos por sua própria existência, mas estão sujeitos a regulação, a fim de prevenir práticas anticompetitivas. Frente a isso, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) é o órgão estatal brasileiro responsável por monitorar e agir em casos de abusos de poder econômico, possuindo a Lei de Defesa da Concorrência, conhecida também como Lei Antitruste. 

“A regulação é crucial para equilibrar esses impactos, promovendo a concorrência saudável enquanto permite que as empresas aproveitem as eficiências de operar em grande escala”, afirma Bergmann. Para ele, isso é fundamental para garantir, de forma geral, que os benefícios dos oligopólios sejam potencializados ao mesmo tempo em que os prejuízos são atenuados.

Antenas de telecomunicações – Foto: Igorh84/Wikipedia/CC BY-SA 4.0

 

Nesse cenário, a legislação conta com mecanismos responsáveis por sancionar e punir as entidades que se comportam como um cartel e, também, diante de fusões e aquisições. Coutinho explica: “Caso uma empresa de um oligopólio queira comprar outra, a concentração vai aumentar muito e, provavelmente, não vai ser possibilitada de adquirir”.

Por fim, ele ressalta que, por essência, o oligopólio não é necessariamente ruim, sendo uma configuração comum do capitalismo e, caso seja construído de forma orgânica, sem a prática de atos anticompetitivos, não terá nenhum problema diante da lei. Essa conformação organizacional é sancionada somente quando se converte na ausência de concorrência saudável, com a atuação da Lei Antitruste — visto que causa perda de bem-estar ao consumidor.

Rádio USP

Ouça a entrevista sobre o tema levada ao ar nesta quinta-feira (01/02), na primeira edição do Jornal da USP no Ar:

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(Post atualizado em 1/02, às 8h27)

*Sob  supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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