Brasileiros passam em média 56% do dia em frente às telas de smartphones e computadores

Especialistas alertam que o uso excessivo de aparelhos eletrônicos pode ocasionar prejuízos de grande impacto para a saúde física e mental das pessoas

 29/06/2023 - Publicado há 1 ano
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São cerca de 9 horas por dia em frente às telas - Foto: Freepik

No Brasil, as pessoas passam aproximadamente 16 horas do dia acordadas, mas um dado chama a atenção: mais da metade desse tempo é destinado ao uso de smartphones e computadores. O levantamento foi feito pela plataforma Electronics Hub, um site de informações eletrônicas, a partir da pesquisa Digital 2023:Global Overview Report da DataReportal, considerando 45 nações, e concluiu que o Brasil é o segundo país com mais pessoas em frente a uma tela.

São cerca de 56,6% das horas acordadas em frente a telas, ou seja, cerca de nove horas do dia.  Em primeiro lugar do ranking estão os sul-africanos, que passam 58,2% acordados usando o computador ou um smartphone. 

Ainda segundo a plataforma, uma possível explicação para esse tempo poderia estar ligada ao crescimento dos serviços de streaming on-line, com dados revelando que 64% dos usuários brasileiros de smartphones são assinantes de serviços como Netflix, Apple TV ou Prime Video da Amazon.

Estado do digital no Brasil em 2023

Estado do digital no brasil
Usuários de internet no Brasil no início de 2023 era de 181,8 milhões de pessoas. Penetração da internet na população brasileira era de 84,3%
Usuários de internet no Brasil aumentaram 7,1 milhões (+4,1%) entre 2022 e 2023.
O Brasil tinha 152,4 milhões de usuários de mídia social em janeiro de 2023, o equivalente a 70,6% da população total
Conexões móveis celulares ativas no Brasil no início de 2023 era de 221,0 milhões, número equivalente a 102,4% da população total

Apesar dos inúmeros benefícios atrelados à tecnologia, tanto para o desenvolvimento econômico quanto social do País, com o aumento de conexões e possibilidades, o uso excessivo de aparelhos eletrônicos pode ocasionar prejuízos de grande impacto para a saúde física e mental das pessoas, e também trazer percepções sobre para onde e como o País está caminhando em seu desenvolvimento socioeconômico.

Em contrapartida, mesmo sendo um país altamente tecnológico, o Japão, ficou em último lugar no levantamento. Os habitantes daquele país têm as taxas de tempo de tela mais baixas do mundo, com usuários destinando apenas 21,7% de seu tempo para olhar para seus dispositivos. 

Ao analisar esses dados, a partir do nível de desenvolvimento dos países, onde o Japão está classificado como um dos mais desenvolvidos, o professor Ildeberto Aparecido Rodello, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP, aponta que este tempo poderia ser considerado um dos fatores para explicar essa diferença. 

Ildeberto Aparecido Rodello - Foto: Leonardo Costa Rezende
Ildeberto Aparecido Rodello - Foto: Leonardo Costa Rezende

“De certa forma, podemos tentar fazer a associação do impacto dessa diferença de tempo em tela, entre Brasil e Japão, considerando o desenvolvimento socioeconômico”, afirma. Mas, segundo o professor, é necessário também levar em conta fatores como a idade mediana da população brasileira e da japonesa, em que uma é mais jovem do que a outra, respectivamente, e questões culturais. “Existe assim uma possibilidade de relação, porém, eu não afirmaria com certeza”, pontua. 

Produtividade em questão

Para o professor de Psicologia Social Sérgio Kodato, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, a tecnologia é extremamente favorável para efeitos do desenvolvimento do País. No entanto, ele apresenta uma série de fatores que levam a um desequilíbrio nas situações de trabalho, entre os aspectos pessoais e profissionais. 

Kodato aponta que o uso de aparelhos celulares durante o horário de serviço pode levar à distração, dependência, falta de engajamento e concentração na atividade de trabalho. “Sabemos que existem ferramentas essenciais para utilização no desenvolvimento profissional, mas para combater essa distração e esse desperdício na produtividade é preciso um bom treinamento e conscientização em termos de maturidade, disciplina e engajamento nos objetivos da empresa ou instituição”, coloca o professor. 

Sérgio Kodato - Foto: FFCLRP-USP
Sérgio Kodato - Foto: FFCLRP-USP

Além disso, a psicóloga Tatiane Possani, doutora em Psicobiologia pela FFCLRP da USP, ressalta esse manejo do uso da tecnologia no ambiente de trabalho. Para ela, é indiscutível que o uso da tecnologia pode colaborar para a otimização do tempo, gerenciamento de tarefas e trazer maior rapidez para desempenhar diversas atividades, entretanto, o estar a todo momento conectado pode dificultar o estabelecimento de prioridades. 

“Ao chegar um e-mail, uma mensagem, um vídeo que podem ser interpretados como algo urgente a serem resolvidos, mesmo não sendo na realidade, pode fazer com que múltiplas tarefas sejam executadas ao mesmo tempo e com que haja dificuldade em limitar o tempo de trabalho, tempo de lazer e o tempo de descanso”, explica a psicóloga.  “Não é o uso da tecnologia em si o problema, mas a forma que eu faço o uso e a quantidade de tempo”, complementa. 

Cuidados com a saúde

Não é de hoje que os especialistas alertam para o mal à saúde que o uso excessivo da tecnologia pode causar. Em seu último mapeamento de transtornos mentais, a Organização Mundial da Saúde (OMS) revelou que o Brasil possui a população com maior prevalência de transtorno de ansiedade do mundo e isso não é uma coincidência.

De acordo com Tatiane, o tempo de tela e a ansiedade possuem uma relação positiva, ou seja, quanto maior o uso excessivo de tela, maior a ansiedade, como também quanto maior ansiedade, maior o uso excessivo de tela. “O uso excessivo de aparelhos eletrônicos pode decorrer dos perigos do cenário que vivenciamos, como o medo de ser assaltado, dificuldade financeira, o que pode  favorecer ainda mais o isolamento social.”  

Kodato comenta ainda que a ansiedade “é a distância que existe entre o que eu deveria ser e o que eu consigo ser”. “Então basicamente todo o brasileiro ou quase todo o brasileiro, seja por procrastinação, seja por falta de condições infraestruturais, sabe muito bem que não está rendendo o máximo daquilo que é possível”, indica. 

Tatiane Possani - Foto: Linkedin
Tatiane Possani - Foto: Linkedin

O especialista cita a China como exemplo. “Se você passar uma temporada na China, vai ver que em todos os setores da vida social a velocidade, a competência, a rapidez, a esperteza com que são realizadas as tarefas é praticamente muito maior do que no nosso país.” Dessa maneira, a ansiedade estaria atrelada a uma consciência de “dívida”. 

Por outro lado, Kodato explica que a ansiedade também tem relação com o imediatismo. “Também somos uma cultura de resultados imediatos e isso é obtido na tela do computador, tanto a questão do prazer imediato, quanto a questão da informação. Nesse sentido, essa ansiedade tem a ver com a questão dos resultados imediatos, do imediatismo, e não trabalhar, batalhar, lutar, brigar e cultivar para obter o resultado almejado”, finaliza.


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