Meio ambiente, um compromisso reafirmado com pompa e circunstância, mas…

Por Luiz Roberto Serrano, jornalista e coordenador editorial do “Jornal da USP”, da Superintendência de Comunicação Social

 07/06/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 12/06/2023 as 16:30

O governo Lula reservou a comemoração oficial do Dia Mundial do Meio Ambiente, no último dia 5 de junho, para reafirmar com pompa e circunstância o seu compromisso com a preservação ambiental no Brasil, especialmente da Amazônia, uma das maiores contribuições que o País tem a oferecer para si mesmo e para o mundo no combate à degradação ambiental. “Esse é o compromisso que reafirmo hoje. Um compromisso não só com a população brasileira, mas com todos os povos que estão passando ou passarão pelos eventos climáticos mais severos de todos os tempos”, disse Lula na cerimônia no Palácio do Planalto, diante de uma plateia que reunia inúmeras das personalidades mais expressivas da área ambiental no Brasil. E assinou oito atos que apontam para a mitigação das mudanças do clima e o controle do desmatamento no País.

Em pronunciamento em rede oficial de rádio e TV na comemoração do mesmo Dia do Meio Ambiente, a ministra Marina Silva relacionou as iniciativas do governo na área, desde a posse no início deste ano: “Desde janeiro, foi recomposta a participação social em todas as políticas ambientais. Estamos retomando a criação de áreas protegidas, parques e reservas. Realizaremos as Conferências Nacionais de Meio Ambiente, incluindo a Conferência Infantojuvenil, para engajar a sociedade no debate e na ação ambiental. Estamos combatendo o desmatamento ilegal em todos os biomas e o presidente Lula acaba de aprovar o plano que, em seus dois primeiros mandatos, produziu a maior redução nas taxas de desmatamento na Amazônia da história do Brasil. Além disso, o governo iniciou a retomada das terras indígenas com o combate ao garimpo ilegal”.

A cerimônia teve um ar de reação do governo ao recente ataque das bancadas conservadoras da Câmara dos Deputados, que retiraram importantes atribuições dos recém-recriados Ministério do Meio Ambiente e Ministério dos Povos Indígenas, transferindo parte de suas funções para outros órgãos, numa iniciativa inédita de interferência na estrutura de um governo eleito, nunca antes registrada. A iniciativa foi interpretada como uma manifestação do desagrado de setores da Câmara Federal com o pouco diálogo que estariam tendo com o governo federal para apresentarem suas reivindicações em favor de suas bases eleitorais. Mas a escolha dos alvos de seus ataques mostra que a escolha visou, muito mais, o enfraquecimento dos ministérios, cujas políticas contemporâneas afetam e controlam diretamente seus interesses em atividades fundiárias que promovem deflorestamentos e prejudicam os povos indígenas.

A cerimônia sobre a questão ambiental foi um primeiro ato afirmativo público por parte de um governo que convive com uma pesada barragem de críticas e resistências oriundas especialmente da Câmara dos Deputados, regida pelo deputado Arthur Lira, considerado herdeiro dos métodos do ex-presidente da Casa, Eduardo Cunha, que encurralou a ex-presidente Dilma Rousseff, levando-a ao impeachment.

Até agora, apenas a proposta de “arcabouço fiscal” apresentada ao Congresso pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve trânsito fácil na Câmara dos Deputados, mesmo assim passando por adaptações.

Desde o início do governo Lula, era preciso colocar algum regramento em substituição à política do pseudo “teto de gastos” (pseudo porque sempre foi desrespeitada) herdada do governo anterior. Tornou-se imperativo criar algum horizonte para a retomada do crescimento da economia e essa premência foi reconhecida por toda a sociedade, o que facilitou a tramitação do “arcabouço” na Câmara dos Deputados.

Coincidência ou não, a economia vem dando sinais animadores em algumas áreas e as previsões para o crescimento neste ano, que rondavam pouco mais de 1%, já estão sendo esticadas até 2% pelos mais otimistas.

A frente polêmica mais recente aberta pelo presidente Lula foi a da produção de “carros populares”, uma política que deu certo no longínquo governo de Itamar Franco, que levou à reintrodução do simpático Fusca no mercado, à época, quando não havia ainda a sofisticação de modelos do mercado atual. Outros tempos.

A proposta, que chega em um momento em que o mercado de automóveis está fraco, o mais barato custa R$ 68.900,00, acabou transformando-se em um programa de apoio à venda de carros mais em conta e renovação de frotas de ônibus e caminhões, que valerá enquanto durarem os recursos a ele destinados, R$ 1,5 bilhão – “dinheiro de pinga”, na crítica do engenheiro (USP), economista (Unicamp) e ex-presidente do BNDES, Luiz Carlos Mendonça de Barros.

De fato, trata-se de uma solução que tem um certo quê de improvisação e que deve desaparecer assim que o montante a ela destinado for utilizado. O que virá em seguida?

Os muitos nós da economia brasileira exigem o desenvolvimento de programas e ações que apontem para soluções duradouras e de profundidade. Não faltarão resistências dos muitos que se beneficiam do atual status quo, que beneficia minorias.

As questões ambientais são o maior exemplo disso.

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