O Teatro da USP (Tusp) recebe em novembro o artista e pesquisador Rodrigo de Odé na mais nova edição das Diaspóricas: Residências Artísticas. Os encontros acontecem entre os dias 25 e 29, de segunda a sexta-feira, das 14h às 17h30, na Rua Maria Antônia, 294, região central da capital. Com o tema Afrocerimônias – A Filosofia da Cena no Teatro de Nação, o encontro oferece uma série de oficinas que trabalham elementos do teatro, do audiovisual, da capoeira angola, do samba reggae e do afrobeat na produção de uma poética da negritude contemporânea, com a participação de Loiá Fernandes e Anderson Sales, da Malta Teatro de Nação. As inscrições gratuitas seguem até o dia 18, segunda-feira, pelo formulário on-line. Clique aqui.
Na sexta, 29/11, a partir das 15h, a edição finaliza em um encontro aberto ao público geral, com apresentações musicais e exibição dos exercícios teatrais e textos produzidos durante a residência, acompanhada de comentários sobre a filosofia do teatro de nação.
Teatro de nação é como Rodrigo de Odé denomina a linguagem e o modo de pensar os processos de criação – nas artes e na vida – que aplica ao orientar as ações da Malta Teatro de Nação, núcleo de pesquisa e criação que dirige. “É uma necessidade existencial minha, da mesma forma que a filosofia da capoeira e diversas outras culturas de nação também são tão necessárias à vida e ao bem-estar de tantas pessoas – especialmente à vida da gente negra numa sociedade como a nossa, formada nos moldes da situação colonial”, afirma.
A linguagem emergiu de uma trajetória de estudos e vivências, iniciada há 25 anos no Rio de Janeiro, que unem sua atuação junto à Cia dos Comuns, companhia de teatro negro fundada pelo artista e produtor cultural baiano Hilton Cobra; junto à Escola Ngoma de Capoeira Angola, fundada por Henrique Anastácio de Jesus, o Mestre Marrom, e ao terreiro de candomblé Ile Omiojuaro, articuladas com uma base teórica consolidada na tese de doutoramento Baraperspectivismo e teatro de nação: uma poética da revolta, defendida em 2021 no Departamento de Filosofia da UFRJ.
A partir destas experiências, o artista estabelece a importância da história da filosofia africana, da mitologia nagô e do cultivo da capoeira angola como dinâmicas essenciais à produção de uma poética para o teatro negro, na qual os conceitos de ancestralidade, educação e resistência cultural exercem papéis mais que fundamentais.
Na oficina de investigação e criação teatral denominada Afrocerimônias, o artista vem propor aos participantes um momento para desmontar e reconstruir, para criar e fomentar uma aptidão teatral voltada a corpos e grupos sensibilizados no esquema da imanência africana. “No trânsito entre a capoeira angola e a nação de candomblé, colhemos elementos essenciais dessa pesquisa. Coisas da ordem do corpo, do pensamento e da espiritualidade”, indica Rodrigo. “Trabalho de corpo, análise do discurso, musicalidade, audiovisual e performance são alguns dos dispositivos que a gente usa na elaboração de uma teatralidade negra”, completa.
O dia final da oficina (29/11, às 15h) se transfigura em um grande encontro aberto, intitulado Xirê Oralitário. Rodrigo explica: “A ideia de ‘xirê’, ‘festa’, designa nosso desejo de produzir uma sensação comunitária entre palco e plateia, nosso desejo de formar uma comunidade em que cada parte se reconhece, se estranha e se surpreende na outra, tendo o teatro como momento de celebração e aprendizado para a manutenção e a renovação da resiliência, da vontade e da sabedoria dos indivíduos e do grupo”. O xirê oferece a todo o público uma oportunidade de conhecer um pouco dos resultados da oficina e do trabalho do teatro de nação, com leituras cênicas e breves apresentações musicais.
“O lugar da música e do ritmo nesse processo é essencial, uma vez que passamos a compreender a música como a performance de uma estrutura ontológica que simula o poder em expansão da própria duração, isto é, do próprio espírito do tempo. Criar, na música, é estabelecer uma forma nova da temporalidade, isto é, um fragmento novo do mundo. E – quem sabe? – a semente de um processo civilizatório”, finaliza.
Dentre os projetos de Rodrigo como ator, destacam-se no teatro Silêncio (2007), dirigido por Hilton Cobra, produzido pela Cia dos Comuns; O subterrâneo jogo do espírito (2009), de autoria e direção próprias; Julia (2011), direção de Christiane Jatahy; e Navalha na carne negra (2018), projeto idealizado pelo próprio artista, e que teve sua temporada de estreia no Tusp, com direção de José Fernando Peixoto de Azevedo.
No audiovisual, participou de Amor perfeito (2023), novela de André Câmara, produzida pela Rede Globo; Cidade dos homens (2007), longa de Paulo Morelli; Filhos do Carnaval (2006 e 2009), série de Cao Hamburger e Elena Soares; e Negociador (2023), série produzida para a Amazon Prime, com direção de Isabel Valiante.
Recentemente, lançou também o livro Elegbára Beat: um comentário épico sobre o poder, publicado pela Editora Kitabu, contemplado em primeiro lugar no Proac 2023 de Publicação de Obras Teatrais Inéditas. A dramaturgia é uma composição de sete cenas e 23 personagens, que se articulam através de uma conexão entre o mito que trata do nascimento de Exu Elegbára, o afrobeat de Fela Anikulapo Kuti e tragédias da vida real decorrentes do racismo intrínseco ao sistema, explorando a relevância da diversidade racial negra para compreender as relações contemporâneas de poder e propor uma discussão sobre racismo.
As Diaspóricas: Residências Artísticas visam estabelecer no Tusp as bases para constituição de um campo voltado a práticas e pesquisas em torno dos teatros negros e das teatralidades e performatividades de matriz afrodiaspórica, consolidadas em uma sequência de oficinas que, em seu último dia, finalizam em eventos abertos a todo o público interessado.
Serviço
Inscrições até 18 de novembro pelo formulário online. Clique aqui.
Encontros entre 25 e 29/11, das 14 às 17h30, na sede do Teatro da USP (R. Maria Antônia, 294, Vila Buarque).
Todos podem acompanhar os trabalhos de corpo. Além de garrafa d’água e roupas leves, incentiva-se trazer instrumentos musicais.