Garantia de direitos trabalhistas no Brasil merece atenção

Antonio Rodrigues de Freitas Júnior relaciona o agravamento das condições trabalhistas após a Reforma Legislativa de 2017, na medida em que houve alterações extensas e pouco diálogo para realizá-las

 17/11/2023 - Publicado há 8 meses
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A maior parte das reclamações trabalhistas consiste em horas extras não pagas e falta de indenizações por dispensa – Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil
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O Brasil é o segundo pior país para trabalhadores, de acordo com os critérios estabelecidos por um estudo do Índice Global de Direitos da Confederação Sindical Internacional, divulgado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). O levantamento analisa as aplicações das leis trabalhistas em 148 países ao redor do mundo e os divide em cinco categorias. Como evidência desse cenário, entre 2012 e 2020 o País registrou mais de 6 milhões de notificações de acidentes de trabalho e cerca de 25,4 mil acidentes com morte, segundo o Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho. 

Antonio Rodrigues de Freitas Júnior, professor da Faculdade de Direito da USP, relaciona o agravamento das condições trabalhistas após a Reforma Legislativa de 2017, na medida em que houve alterações extensas e pouco diálogo para realizá-las. “As mudanças receberam críticas, sobretudo, porque desatenderam uma das recomendações mais relevantes da OIT: qualquer alteração da legislação social interna dos países deve ser precedida de esforços do chamado diálogo social e negociação”, destaca o professor. 

Reforma Trabalhista de 2017

A falta de troca de opiniões entre os grupos envolvidos na Reforma Trabalhista gerou um desequilíbrio que, segundo Freitas Júnior, favoreceu a parcela dos empregadores. As críticas vão além das condições em que foi discutida e aprovada e perpassam suas consequências práticas e teóricas também. “Não foi apenas a maneira pela qual foi feita a reforma, mas também o fato de que ela foi extremamente unilateral e regressiva do ponto de vista dos direitos trabalhistas”, afirma. 

Grande parte do retrocesso nos direitos dos trabalhadores parte da premissa de autonomia do indivíduo, que orientou as mudanças na legislação e que vai de encontro ao princípio do “poder diretivo” dos empregadores, ou seja, o poder de dar a ordem. Na visão do professor, a reforma, ao tentar transmitir uma ideia de igualdade entre as partes, ignorou o desequilíbrio basilar dos poderes no Direito do Trabalho, que regulava as relações entre empregado e empregador. “Não há como pensar em uma estratégia de regulação futura que desconsidere essa desigualdade essencial na relação de emprego”, destaca. 

Antonio Rodrigues de Freitas Júnior – Foto: Divulgação/Enamat

Preocupações atuais

De acordo com os dados do Conselho Nacional de Justiça, a maior parte das reclamações trabalhistas consiste em horas extras não pagas e falta de indenizações por dispensa, isto é, quando demitidos sem qualquer falta grave. Diante de julgamento dos casos, o professor comenta da competência específica da Justiça do Trabalho em tratar dos temas, que não deveriam ser direcionados à justiça comum, porque toda a estrutura dessa organização não foi pensada para receber reclamações trabalhistas, mas para receber outro tipo de demanda. É nesse contexto que a OAB/SP recentemente assinou a Carta em Defesa da Competência Constitucional da Justiça do Trabalho, por exemplo. 

“Há outro lado também criticado, que reconhece que o Brasil caminha na direção da precarização das relações de trabalho”, pontua Freitas Júnior. Como evidência dessa perspectiva, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua mostra cerca de 70 milhões de trabalhadores em situações precárias. Essa condição, segundo o especialista, deve promover políticas públicas, uma vez que implica carência ou ausência de diversas garantias, como a cobertura previdenciária. 

Atuação dos sindicatos 

O fortalecimento do papel dos sindicatos frente à precarização desse cenário torna-se primordial, tendo em vista que representa um caminho para o diálogo democrático e uma representação dos trabalhadores. Apesar de sua importância, Freitas Júnior chama a atenção para os desafios financeiros enfrentados pelas organizações: “O Sindicato dos Trabalhadores perdeu a sua fonte principal de custeio e tem sido cada vez mais, do ponto de vista financeiro, limitado na sua capacidade de atuação”. 

Além da participação dos representantes dos empregados, o professor também ressalta a importância da presença de todos os atores sociais envolvidos, como representantes dos patrões, para a regulação das relações de trabalho. Sem a participação das principais figuras as propostas sempre irão tender em favor de um lado ou de outro, ou haverá uma terceira solução que seja autoritariamente imposta pelo Estado.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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