Falta de divulgação televisiva dos Jogos Pan-Americanos pode prejudicar o futuro de jovens atletas

Pela primeira vez em 28 anos evento não teve transmissão de canais de televisão

 14/11/2023 - Publicado há 8 meses
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Jogos Pan-Americanos não tiveram transmissão na televisão aberta ou fechada pela primeira vez desde 1995 – Foto: Mateusz Dach via Pexels
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Foi evidente o sucesso esportivo do Brasil nos Jogos Pan-Americanos de Santiago, no Chile, que chegaram ao fim no último dia 5 de novembro. Com 205 medalhas conquistadas, sendo 66 delas de ouro (recorde nacional), o País ficou em segundo lugar no quadro geral, apenas atrás dos Estados Unidos. Apesar das conquistas em diversas modalidades, a audiência, ao menos até pouco antes do último fim de semana de competições, representou um terço do número batido na edição anterior do evento, disputada em 2019, em Lima, no Peru, que teve exclusividade de um canal aberto de televisão.

Enrico Fuini Puggina – Foto: Arquivo Pessoal

Pela primeira vez desde 1995, os direitos do Pan não foram adquiridos por nenhuma emissora e toda a transmissão foi realizada em plataformas de streaming. Isso, na visão de Enrico Fuini Puggina, professor da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP, tende a trazer prejuízos a várias modalidades que, no âmbito do investimento de patrocinadores, dependem da visibilidade proporcionada por eventos poliesportivos.

O especialista afirma que o esporte, sozinho, movimenta cerca de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial. “Quando não há interesse pela modalidade, é natural que o desinvestimento em atletas e estruturas esportivas em condições de prática também seja reduzido. Então eu vejo com algum pesar a não transmissão, mas entendo o fato de ser uma consequência do desinteresse da população, porque nós não somos educados a gostar de esporte, não somos educados a praticar esportes, e isso não é bom”, lamenta.

Uma das maiores potências nos esportes, os Estados Unidos mostram que fomentar o interesse por mais modalidades esportivas além somente do futebol traz benefícios ao país. Com grandes incentivos financeiros, os principais atletas estadunidenses podem se concentrar nas maiores competições, enquanto o Pan-Americano serve para dar chances às promessas, de olho no futuro.

Puggina reforça que o Brasil é um país que não tem uma cultura esportiva bem desenvolvida, “então os melhores atletas brasileiros participam tanto dos Jogos Pan-Americanos quanto dos Jogos Olímpicos. Isso acontece por uma razão muito simples: o Brasil não tem representação. Então, principalmente nas modalidades individuais, como atletismo, ginástica e ciclismo, os nossos principais atletas, os mesmos que conseguem acesso aos Jogos Olímpicos, vão para competições como os Jogos Pan-Americanos”.

Baixo interesse afasta talentos

Nem mesmo a participação de grandes nomes do esporte brasileiro, como Rayssa Leal (skate), Rebeca Andrade (ginástica artística) e Hugo Calderano (tênis de mesa) fez com que o Pan tivesse números de audiência próximos dos que costumam bater os tradicionais Jogos Olímpicos, maior competição poliesportiva do planeta.

Esse fato, no ponto de vista do especialista, interfere negativamente no futuro de jovens atletas e no desenvolvimento de competidores que já vivem o auge de suas carreiras. Para Puggina, isso vai além do Pan. “Nós temos um atleta daqui da região, de São Joaquim da Barra, o Alisson dos Santos, o Piu, que venceu todas as etapas da Liga de Diamante na prova dos 400 metros com barreiras, mas nem por isso as pessoas se interessaram. Algumas provas até foram televisionadas, mas normalmente nós recebíamos a notícia pelos jornais e pela mídia escrita.”

O resultado, no final, pode ser a intensificação de um êxodo já existente de grandes atletas brasileiros para o exterior, o que poderia deixar uma lacuna para as novas gerações. É o exemplo de Darlan Romani, bicampeão pan-americano do arremesso de peso. “Ele, até bem pouco tempo atrás, treinava na Europa. Muitos dos nossos atletas de natação e de ciclismo passam boa parte da temporada fora do País. Isso não é apenas por condições de competitividade, mas também por falta de infraestrutura, de pesquisa e de treinamento”, completa o professor.

*Estagiário sob supervisão de Ferraz Junior


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