A chamada tarefa sem solução é uma técnica amplamente aplicada para estudar a comunicação entre cães e humanos. A atividade consiste em fornecer desafios simples ao animal, como virar um recipiente para pegar alimento de dentro e, depois de algumas tentativas, a tarefa se torna impossível de resolver — pregando o pote, por exemplo. Geralmente, há humanos a quem o animal possa recorrer, e, dessa forma, o comportamento comunicacional do animal pode ser observado e analisado.
Um estudo do Instituto de Psicologia (IP) da USP analisou sua efetividade na análise do comportamento canino e traz uma revisão da literatura para entender como a aplicação da tarefa varia de acordo com a pesquisa e como isso afeta no resultado final. Os resultados mostraram que a tarefa é eficiente para investigar a comunicação entre cães e humanos, desde que sejam tomados cuidados na experimentação e análise. Para isso, o estudo propôs formas de uniformizar a metodologia.
O artigo A review of the unsolvable task in dog communication and cognition: comparing different methodologies é fruto da dissertação de mestrado da pesquisadora Juliana Mendes e foi orientado pela professora Carine Savalli, da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e co-orientado por Briseida Resende, do IP. “Durante a pesquisa, eu reparei que havia muitas inconsistências no uso da tarefa sem solução, cada autor utilizava um tipo de desafio diferente, daí surgiu a revisão. E, no meio do caminho, começaram a sair estudos que questionavam a própria tarefa, então resolvemos investigar”, explica Juliana ao Jornal da USP.
Ao revisar 35 artigos que pesquisaram a tarefa, Juliana identificou que seu uso não é normatizado, o que pode afetar nos resultados. As inconsistências na metodologia de aplicação da tarefa sem solução são: qual tipo de desafio é proposto, por quanto tempo e quantas pessoas ficam disponíveis para comunicação.
A pesquisadora conta que há vários exemplos de diferenças na utilização do desafio. Por exemplo, alguns estudos usavam uma bolinha alimentadora, enquanto outros fixavam recipientes com o alimento em um pedaço de madeira. “Eu vi trabalhos que aplicavam a tarefa de forma bem complexa, ligando o alimento a uma corda que o cachorro deveria puxar para conseguir pegar, isso acaba ficando inviável para o animal”, explica.
A presença de humanos disponíveis também é crucial e é preciso manter o contato visual com o cachorro, alguns estudos faziam o uso de óculos de sol nos seres humanos. Além disso, é preciso manter o dono do animal durante o experimento, alguns trabalhos mantinham apenas o experimentador na sala do desafio e a ausência do dono pode inibir a comunicação do animal.
Fixar o pote com alimento em uma barra de madeira, usar tempo de um minuto para os cães tentarem realizar a tarefa, fazer três tentativas solucionáveis antes de passar para a sem solução, estarem presentes o experimentador e o dono do cachorro, e manter o contato visual com o animal são as recomendações feitas pela pesquisadora para normatizar a aplicação da tarefa.
“Analisando os estudos nós encontramos esses critérios bem claramente. Então é possível dizer que a tarefa sem solução serve para a proposta que tem sido usada, desde que cumpra os critérios”, explica. O trabalho conseguiu obter uma forma de homogeneizar a tarefa para futuros estudos que irão investigar a comunicação entre cães e humanos.
Padronização
Para a professora Briseida Resende, co-orientadora da pesquisa, trabalhos de revisão trazem uma reflexão sobre como o assunto tem sido tratado na área. “Os estudos com a tarefa sem solução para cães se mostram úteis para pesquisar comunicação, mas falta padronização, o que dificulta as interpretações dos resultados. Então nós trouxemos algumas propostas para a padronização na metodologia”, destaca a professora ao Jornal da USP. Ela explica que para que os padrões propostos sejam comparáveis, é importante observar as diferenças entre cada animal, o tamanho é um exemplo. “Para que a tarefa tenha o mesmo nível de dificuldade para um cão grande e um pequeno, pode ser necessário usar tamanhos de potes diferentes”, finaliza.
O Departamento de Psicologia Experimental do IP, onde o estudo foi realizado, desenvolve pesquisas em diversas áreas do conhecimento, entre elas a do comportamento canino, no Laboratório de Cães. Investiga-se os animais por diversas perspectivas, como a comportamental.
Mais informações: e-mail juliana.werneck@alumni.usp.br Juliana Mendes