Ministério da Educação deixou 60 milhões de alunos à deriva

Especialista acompanha a pasta há 30 anos e alerta que governo ainda não anunciou um projeto para a Educação

 09/04/2019 - Publicado há 5 anos     Atualizado: 18/04/2019 as 12:03
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jorusp

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Foto: Reprodução / Secretaria da Educação do Estado de São Paulo

O Ministério Público, junto ao Tribunal de Contas da União, demanda a apuração das consequências da atual crise do Ministério da Educação (MEC) no andamento das políticas públicas da área. O documento elenca impactos negativos da atual situação, como o risco para a realização do Enem, após a falência da gráfica que imprimia a prova, e os recentes problemas que alunos enfrentaram para a renovação do Financiamento Estudantil (Fies). Também questiona o abandono do Plano Nacional de Educação (PNE) por parte do MEC. Vários assuntos terão que ser tratados pelo novo ministro Abraham Weintraub, que susbstitui Ricardo Vélez Rodríguez. Ele é formado em Ciências Econômicas pela Universidade de São Paulo, mestre em administração na área de finanças pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Na iniciativa privada, trabalhou no Banco Votorantim por 18 anos, onde foi economista-chefe e diretor.

O professor Ocimar Alavarse, da Faculdade de Educação (FE) da USP e coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Avaliação Educacional, lembra que o MEC é responsável por 60 milhões de alunos, que dependem de alguma maneira do órgão, e qualquer isenção tem efeitos. O pedagogo relembra que 8 milhões de estudantes do ensino médio não receberam livros didáticos em fevereiro. A gestão perdeu o prazo de assinatura da licitação de compra do material, pois a pasta ficou sem um secretário executivo frente à sequência de demissões no Ministério.

“Fora essa irresponsabilidade, o Enem corre risco, em virtude da paralisação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pelas avaliações de ensino.” O Brasil passa por um processo de adaptação das universidades públicas à prova nacional. As principais já adotam totalmente ou parcialmente a prova para selecionar seus ingressantes. Nas instituições privadas, o exame não deixa de ser importante, uma vez que é um parâmetro qualificativo de programas inclusivos, como Fies e Prouni. Mesmo algumas instituições do exterior, sobretudo Portugal, aceitam o resultado da avaliação. “A não realização daria um nó no ensino superior do País”, argumenta Alavarse.

A Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) foi cancelada até 2021, neste mês de março. O teste era aplicado a crianças do terceiro ano do ensino fundamental. Esses alunos seriam avaliados, depois disso, pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb). Mas, “a última portaria responsável pela iniciativa, adequando-a às novas necessidades, foi anulada. Voltou a valer a de 2018, que nada previa sobre a adaptação após o fim da ANA”, indicou.

O professor defende que a falta de articulação e programas na educação causaram prejuízos mesmo a projetos já consolidados. O próprio Saeb conta com uma série histórica desde 95. “Algumas crises e tensões são normais, mas não por um período tão prolongado. O ensino é uma política de Estado, não deve ser afetado por questões de governo, disputa de grupos e facções. O ministro tem o direito inalienável de indicar quem quiser, porém a responsabilidade também é sua. No entanto, a abstenção é tamanha que mesmo o Ministério Público está cobrando”, diz o pedagogo, que por motivos acadêmicos e profissionais acompanha o MEC há mais de 30 anos.

“A falta de planejamento era previsível, dada a falta de propostas de Jair Bolsonaro para a Educação. Ao longo da campanha ele não citou o Plano Nacional de Educação nenhuma vez. Ainda que fosse contra a Lei 13.005 de 2014, deveria falar de sua substituição ou alteração, só que nem a citava”, reclamou Alavarse. O especialista pede propostas na área, a fim de então se poder discutir educação de qualidade novamente. “Avanços no ensino são atrelados a boas políticas educacionais, logo, a articulação não é estranha e sim necessária. O governo federal, por si, é responsável por coordenar a ação dos estados e municípios (responsáveis diretos pela operação de escolas da rede básica, logo, por mais de 90% dos alunos)”, alega.

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