Arte sacra paulista se destaca pela exclusividade e valor histórico-cultural

Pesquisa ganhadora do Prêmio Tese Destaque 2018 analisa padrões estéticos de igrejas do Brasil colônia e imperial

 28/11/2018 - Publicado há 5 anos
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O arquiteto Mateus Rosada visitou 120 igrejas construídas durante os períodos colonial e imperial. A arquitetura e a ornamentação possuem traços únicos e autorais de artistas da região – Foto: arquivo pessoal do arquiteto Mateus Rosada

A arquitetura e a arte sacra de São Paulo guardam uma riqueza de valor histórico e cultural inestimável. Mesmo com influência externa, os templos apresentam traços únicos e características autorais. A avaliação é do arquiteto Mateus Rosada, que ganhou o Prêmio Tese Destaque USP 2018, na categoria Ciências Sociais Aplicadas, concedido pela Pró-Reitoria de Pós-Graduação da USP. O estudo foi feito no Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) da USP, em São Carlos, e analisou a arquitetura e a ornamentação de 120 igrejas remanescentes do Estado de São Paulo, construídas durante os períodos colonial e imperial.

Igreja Matriz Nossa Senhora da Candelária, Itu, SP. Construída em 1780, o acabamento interno é um belo conjunto de pintura e talha do período Rococó – Fotos: arquivo pessoal do arquiteto Mateus Rosada

Segundo o pesquisador, embora os autores das obras paulistas tivessem recebido influência de padrões estéticos de Portugal e de outros Estados brasileiros, eles mantiveram traços singulares que fizeram de seus trabalhos peças exclusivas. “Foram relidas, modificadas e recriadas em modelos e padrões únicos.” Os retábulos paulistas (estruturas de madeira que ficam atrás do altar), por exemplo, são mais limpos e menos carregados de elementos e cores, o que, na opinião do pesquisador, não se trata de um trabalho mais pobre do que de outras regiões porque apresenta esmero e acuidade nos traços, o que demonstra que o artista tinha total domínio da técnica, explica.

Naquela época, a taipa de pilão foi o método construtivo mais empregado nas edificações religiosas. A opção por esse sistema era a farta disponibilidade de barro vermelho que havia na região, a principal matéria-prima com a qual eram construídas as paredes. Já no litoral, com poucas áreas com solos ligantes como o barro, a alvenaria de pedra predominou. Segundo o arquiteto, os paulistas se tornaram ótimos taipeiros, que “dominaram o mercado”, inibiram as construções com pedra e acabaram difundido a técnica para áreas próximas como São João del-Rei e Tiradentes, em Minas Gerais.

Foram quatro séculos analisados pela pesquisa, cujos padrões estéticos se sucederam e transitaram pelo Maneirismo (séculos 16 e 17), Barroco (1700-1760), Rococó (1760-1830) e Neoclássico (após 1830). Durante esse período, muitas edificações passaram por transformações espaciais e arquitetônicas – houve demolição de parte de suas estruturas ou reformas, principalmente durante o século 20, quando houve maior crescimento das cidades.

Conjunto Jesuítico de Nossa Senhora do Rosário, Embu das Artes, SP. A construção é caracterizada externamente pela simplicidade e linhas retas. No interior, belos altares datados de 1700 e 1740 – Foto: arquivo pessoal do arquiteto Mateus Rosada

Dentre os templos observados, Rosada destaca dois que, segundo ele, possuem os conjuntos mais completos de ornamentação, englobando entalhe dos altares e pinturas de parede e de teto: o Conjunto Jesuítico de Nossa Senhora do Rosário, no município de Embu das Artes, e a Matriz de Nossa Senhora da Candelária, em Itu.

 

Com a construção iniciada em 1700, o Conjunto Jesuítico de Embu, composto pela igreja e pelo Museu de Arte Sacra, é um dos mais importantes remanescentes jesuítas em São Paulo. “A construção é caracterizada externamente pela simplicidade e por linhas retas. Seu interior exibe belos altares datados de cerca de 1700 e de 1740 e uma exuberante pintura nas paredes e no teto da capela-mor e da sacristia”, garante o pesquisador.

Já a igreja matriz de Itu chama a atenção pela grandiosidade de seu interior. Sua fachada atual, resultado de uma reforma em 1889, tem estilo bastante diferente do padrão da ornamentação de seu interior, que foi mantido com poucas modificações. Construída em 1780, o acabamento interno é um belo conjunto de pintura e talha do período Rococó.

Entalhadores e pintores paulistas

Além de catalogar as igrejas paulistas, a pesquisa também procurou entender qual foi a lógica da movimentação dos artífices  – artesãos e artistas – pelo território brasileiro, além de procurar conhecer as influências que eles tiveram. Na comparação de altares de igrejas paulistas com os de outros estados brasileiros, como Minas Gerais e Rio de Janeiro, a pesquisa encontrou semelhanças de padrões e de movimentos artísticos, demonstrando que várias obras executadas em São Paulo tiveram influências de artistas que vieram de diversas regiões, mas que criaram aqui exemplares com características e traços autorais locais.

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Uma cidade que as histórias vão desenhando

Segundo o pesquisador, tomando como exemplo Minas Gerais, que se orgulha de seus artistas coloniais – Antônio Francisco Lisboa (Aleijadinho), Mestre Ataíde e Francisco Vieira Servas -, São Paulo também precisava conhecer seus arquitetos, artistas, entalhadores, escultores e pintores, que deixaram marcas em solo paulista, para valorizá-los, e cita alguns nomes como os pintores Jesuíno do Monte Carmelo, José Patrício da Silva Manso e Manoel do Sacramento, bem como os entalhadores Luiz Rodrigues Lisboa, Bartholomeu Teixeira Guimarães, José Fernandes do Oliveira, João da Cruz e Gurdiano José das Chagas, dentre outros.

A tese Igrejas Paulistas da Colônia e do Império: Arquitetura e Ornamentação teve a orientação da professora Maria Ângela Bortolucci, do IAU, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Mateus Rosada é atualmente professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Maria – Campus de Cachoeira do Sul – RS.

Mais informações: e-mail mateusrosada@yahoo.com.br com Mateus Rosada


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