Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos completa 30 anos unindo ciência, alimentação e meio ambiente

Localizada em uma fazenda em Pirassununga, faculdade conta com quatro graduações e cinco programas de pós-graduação

Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

 29/09/2022 - Publicado há 2 anos

Texto: Luiz Prado

Arte: Adrielly Kilryann e Rebeca Fonseca

Orgulhosa do lema “Ciência e inovação da fazenda à mesa”, a Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA) da USP completa 30 anos de existência em 2022. Situada no campus Fernando Costa, na cidade de Pirassununga (210 km da capital paulista), a instituição é referência nacional nas áreas de produção animal e de alimentos.

Contando atualmente com 1.353 estudantes de graduação, 309 de pós-graduação e 44 pós-doutorandos, a FZEA oferece hoje quatro cursos de graduação (Zootecnia, Engenharia de Alimentos, Medicina Veterinária e Engenharia de Biossistemas) e possui cinco programas de pós-graduação (Zootecnia, Engenharia de Alimentos, Engenharia e Ciência de Materiais, Biociência Animal e mestrado profissional em Gestão e Inovação na Indústria Animal). Em 30 anos, sua produção científica, nacional e internacional, soma 12.640 publicações.

Localizada numa verdadeira fazenda, o maior campus da USP em área contígua (2.200 hectares), conta com um quadro de 102 professores e 128 funcionários técnicos-administrativos, distribuídos em cinco departamentos, hospital veterinário, uma biblioteca com mais de 73 mil itens e uma série de laboratórios e instalações de ensino prático.

Após enfrentar um incêndio na vegetação do campus e ter de lidar com os estragos de uma tempestade que danificou diversos prédios, alagou salas e interrompeu o fornecimento de energia elétrica e internet, tudo isso em 2021, a faculdade retomou a normalidade com o retorno das aulas presenciais no primeiro semestre de 2021.

O professor Carlos Ambrosio, vinculado ao Departamento de Medicina Veterinária (ZMV) e atual diretor da FZEA, destaca como o grande diferencial da unidade sua participação em todas as etapas do processo de produção alimentícia. “Temos desde a célula até o produto na prateleira”, comenta. “Temos aqui pessoas que mexem com uma célula, com um microrganismo, que atuam na produção de um determinado tipo de alimento, de um determinado animal, que cuidam de sua saúde e que focam na qualidade de produção, seja um sensor para avaliar a patologia de um animal ou um problema nas gramíneas, o tipo de embalagem ou a aceitação do mercado.”

Carlos Ambrósio - Foto: Reprodução/FZEA

Carlos Ambrósio - Foto: Reprodução/FZEA

Uma história antiga

Apesar de sua criação remeter à Resolução USP 3.946 de 3 de julho de 1992, as origens da FZEA levam a uma história de 80 anos. Uma trajetória que conta as transformações pelas quais passou o espaço físico no qual a faculdade se insere e com o qual se confunde.

Seu primeiro capítulo se dá em 1942, quando o Decreto-Lei 12.742 cria dez Escolas Práticas de Agricultura (EPAs) em cidades do interior de São Paulo. Fernando Costa, interventor do Estado, ex-ministro da Agricultura e ex-prefeito de Pirassununga, trata de incluir o município na lista e desapropria terras na região para a construção da escola.

Planejadas para a formação do produtor rural, as EPAs deveriam oferecer um ensino gratuito, prático e utilitário, voltado para a melhoria da produção e do aperfeiçoamento dos processos da industrialização agrícola. Um desenho alinhado às perspectivas do Estado Novo para o desenvolvimento nacional. Os estudantes viriam do meio rural, tendo de 15 a 25 anos e possuindo diferentes níveis de escolarização. Seria uma continuação do ensino primário, profissionalizando os jovens.

O projeto, entretanto, só sairia do papel em 1945, e com apenas cinco das dez escolas previstas. A falta de interesse e de investimentos dos governos seguintes levaria ao sucateamento das EPAs e ao encerramento de suas atividades. Foi o que aconteceu com a unidade de Pirassununga, fechada em 1956.

Mas suas instalações não ficariam desocupadas por muito tempo. Apesar de cogitar transformar as dependências da antiga escola em um presídio agrícola, o então governador de São Paulo Jânio Quadros acaba entregando o espaço para a Faculdade de Medicina Veterinária (FMV), atual Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP. Surge assim, em 1957, o Instituto de Zootecnia e Indústrias Pecuárias (Izip), como um anexo da instituição.

Com a doação, a FMV passou a contar com um espaço apropriado para suas atividades, já que sua sede no bairro da Aclimação, em São Paulo, não atendia a todas as necessidades da instituição. Mas além de receber estudantes de graduação, o Izip também oferecia um curso técnico agrícola de nível médio, dando em certa medida continuidade ao trabalho da EPA e respondendo à demanda por formação de trabalhadores especializados sem os custos e a duração da formação superior.

Depois de formar 15 turmas, o Izip encerra seu curso técnico em 1974 e dá lugar ao Centro Interunidade de Zootecnia e Indústrias Pecuárias (Cizip). O novo órgão passa a se concentrar na realização de pesquisas e na formação dos estudantes da FMV. Um passo importante dado nesse período foi a criação do curso de Zootecnia, em 1978. Inicialmente com parte das aulas na capital e parte em Pirassununga, o novo curso se instalaria completamente no interior em 1982.

Fachada do prédio central da FZEA - Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

Apesar da nova graduação, a Universidade reconhece o subaproveitamento do espaço, o baixo número de estudantes e as dificuldades de sua gestão pela faculdade. Isso levaria à criação do campus de Pirassununga (atual campus Fernando Costa) em 17 de outubro de 1989 e da FZEA em 1992, a fim de expandir e melhorar a ocupação do local.

A faculdade começa a funcionar em 1993, com corpo docente composto de professores da FMVZ que escolheram migrar para a nova unidade. A FZEA assume o curso de Zootecnia, cria no ano seguinte a pós-graduação em Qualidade e Produtividade Animal e planeja o curso de Engenharia de Alimentos, que seria implementado em 2000. A criação dos cursos de graduação em Medicina Veterinária e Engenharia de Biossistemas e a pós em Engenharia de Alimentos viriam em 2009. Nova expansão se daria em 2013, com o mestrado profissional em Gestão e Inovação na Indústria Animal e os programas de Engenharia e Ciência de Materiais e Biociência Animal.

Desafios do presente

Segundo o diretor Carlos Ambrosio, o momento agora é de consolidação dos cursos criados em 2009, com a contratação de novos docentes e funcionários e a ampliação da infraestrutura necessária, incluindo a construção de laboratórios de pesquisa. A falta de pessoal, aliás, é um problema crônico da unidade, conforme relata o diretor. “Desde a criação da faculdade temos um déficit de professores e servidores. Com o PIDV (Programa de Incentivo à Demissão Voluntária, realizado na USP entre 2014 e 2016) e a falta de ingresso de funcionários e docentes, o quadro se agravou. Esse é o nosso grande gargalo.”

Essa opinião é compartilhada pelo professor Celso Oliveira, que ocupa atualmente a 2a Vice-Presidência da Associação dos Docentes da USP (Adusp) e foi presidente da comissão responsável pela implantação dos cursos de Engenharia de Biossistemas e Medicina Veterinária. “O projeto de Engenharia de Biossistemas nunca precisou de nenhum retoque, foi unânime em todas as instâncias pelas quais passou, mas teve seu processo abortado com a crise financeira da USP”, conta Oliveira. “Alguns laboratórios deixaram de ser construídos, o que agora voltou à pauta, assim como a contratação de funcionários e professores e a aquisição de equipamentos para essas instalações.”

Celso Eduardo Lins de Oliveira - Foto: Arquivo pessoal

Celso Oliveira - Foto: Arquivo pessoal

A questão de falta de pessoal e sobrecarga de trabalho que afetam a FZEA, conforme explica o docente, não é exclusividade da unidade. Com sua experiência na Adusp, Oliveira reconhece que a situação afeta outras faculdades e institutos da USP. A particularidade da FZEA, nesse tema, teria a ver com sua própria localização no campus de Pirassununga.

“Por se tratar de uma unidade do interior, que fica em um campus no qual está praticamente sozinha, já que a FMVZ possui apenas algumas instalações aqui, a FZEA tem um peso político muito pequeno”, comenta o professor. “E esse peso político influencia na hora de sermos agraciados em alguns critérios montados pela Reitoria. A FZEA precisa a todo momento validar seu reconhecimento e sua qualidade, diferente de outras unidades da USP onde isso se dá como resolvido. Precisamos sempre nos colocar, impor, mostrar resultados. A FZEA é muitas vezes tomada como exemplo para a administração, porque somos uma unidade muito enxuta. Mas para nós esse é um exemplo negativo, porque todo mundo fica sobrecarregado de trabalho.”

Apesar desses problemas, Ambrosio vê motivos para celebrar a faculdade neste trigésimo aniversário. “Temos os únicos cursos de Zootecnia, Engenharia de Alimentos e Engenharia de Biossistemas da USP, além de um hospital veterinário próprio”, se orgulha. O diretor também comemora a sensível mudança de perfil dos ingressantes na FZEA, fruto das políticas afirmativas adotadas pela USP.

Suinocultura - Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

“Acredito que temos hoje uma universidade pública mais acessível e é isso que precisamos devolver para a sociedade: ensino gratuito de qualidade, público, superior, para a população que necessita. Isso é algo que já deveria ter acontecido há anos”, enfatiza.

Oliveira relativiza, entretanto, os bons números das políticas afirmativas, salientando que eles dizem respeito somente aos estudantes egressos da escola pública. Para pretos, pardos e indígenas, a presença na FZEA, assim como em diversas unidades da USP, ainda precisa crescer. “As cotas tiveram impacto dentro do perfil econômico, mas aqui não estão tendo impacto no perfil da diversidade racial. Eu desconheço que tenhamos algum aluno indígena, apesar de termos cursos de muito interesse para comunidades quilombolas e para aldeias.”

Além da inclusão, outro desafio social da FZEA, na opinião de Oliveira, envolve estreitar a relação da faculdade com a cidade de Pirassununga. “Vivemos aqui um dilema. A cidade tem orgulho de ter uma unidade da USP, dos indicadores que publicizamos. Mas, para uma parte da sociedade, a vida estudantil às vezes incomoda a vida pacata do interior. Contudo, de maneira geral, a USP ainda tem muito para oferecer a essa comunidade. Gastamos muito tempo com projetos de pesquisa aqui dentro e precisamos, às vezes, olhar um pouco para o lado de fora. Não que essa interação seja inexistente, mas poderia ser aprofundada, tornando a Universidade um eixo de desenvolvimento da cidade.”

Estudantes na ciclovia do campus - Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

Nesse sentido, o professor sugere que a FZEA poderia ampliar a divulgação de seu curso noturno de Engenharia de Alimentos, para atrair moradores de Pirassununga que, em virtude do trabalho, não podem frequentá-lo durante o dia. Além disso, outra sugestão do docente é a ampliação da oferta de eventos culturais e esportivos para a comunidade externa. “Ajudaria a juventude da cidade e, ao mesmo tempo, traria mais visibilidade para a FZEA.”

Esses desafios, contudo, não tiram de Oliveira o orgulho pela faculdade. “Acredito muito na FZEA, no que está sendo feito e no que ainda pode ser feito aqui.” Como atributos de destaque da unidade, o professor elenca o foco em pesquisa e desenvolvimento científico de seu corpo docente e discente e a alta empregabilidade de seus egressos. Lembra ainda do curso de Engenharia de Biossistemas, pioneiro no Brasil. “Acho que não são todas as unidades da USP que podem dizer que criaram uma profissão no País”, enfatiza.

Quando reflete sobre a posição que a FZEA ocupa hoje no País, Ambrosio faz questão de sublinhar seu papel fundamental para a educação brasileira. “Temos que lutar bravamente nesse cenário que vivemos hoje, de incerteza na ciência, para trazer algo de positivo para o futuro. Porque sem ciência, sem pesquisa e sem educação o Brasil não cresce”, arremata o diretor.

A vivência estudantil

Estudar na FZEA é uma experiência única dentro do universo de faculdades, escolas e institutos que fazem parte da USP. A exclusividade da maior parte de seus cursos, sua localização na cidade de Pirassununga, os anos de moradia nos alojamentos da faculdade ou nas repúblicas do entorno, a extensão territorial do campus Fernando Costa e a paisagem avizinhada por pastos, plantações, cavalos, vacas, cabras, pôneis, porcos e ovelhas não encontram paralelos na Universidade.

Dentre as diversas associações estudantis que ampliam a vivência da experiência universitária na FZEA, se encontra o Centro Acadêmico Unificado de Pirassununga (CAUPi). Entidade preocupada com a vivência estudantil, permanência acadêmica e a formação profissional e cidadã dos graduandos, o CAUPi é um espaço auto-organizado para se enfrentar as dificuldades e desafios de ser estudante na FZEA e, ao mesmo tempo, mobilizar politicamente a comunidade.

“Um dos nossos desafios atuais é ter maior conexão com os estudantes, por conta do distanciamento que a pandemia ocasionou”, comenta Mariana Martins, graduanda do curso de Engenharia de Alimentos e presidente do CAUPi. “Queremos aumentar o engajamento nos eventos e incluir a política no dia a dia, ainda mais agora, quando sabemos da importância desse momento que o Brasil está vivendo.”

Mariana Martins - Foto: Reprodução/LinkedIn

Mariana Martins - Foto: Reprodução/LinkedIn

No âmbito da FZEA, o CAUPi se mobiliza junto à diretoria da unidade, à Prefeitura do campus e à própria Reitoria da USP no intuito de buscar soluções para problemas vividos pelos estudantes. Suas atuais diretoras reconhecem viver um momento de diálogo positivo com as instâncias superiores da FZEA e declaram ter esperança na atuação da recém-criada Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) da USP. Isso não significa, contudo, que todos as questões já foram resolvidas.

De acordo com Érika Oliveira, graduanda de Medicina Veterinária e também diretora do CA, uma demanda urgente do centro acadêmico envolve o restaurante universitário, com a reivindicação de café da manhã diário e refeições aos finais de semana, como já acontece nos restaurantes de outros campi da USP.

Outra questão na pauta do CAUPi é o aumento no auxílio financeiro para os estudantes e a criação de um auxílio de início de ano. “Até conseguir uma bolsa, esses alunos ficam desamparados”, conta Érika. “Como alguém vai ter saúde mental para ir às aulas, se não tem a condição básica de sobrevivência? Como a faculdade cobra desempenho e a Universidade não oferece permanência estudantil básica?”

Érika Oliveira - Foto: Reprodução/Facebook

Érika Oliveira - Foto: Reprodução/Facebook

Segundo a estudante, o centro acadêmico tem conhecimento de alunos que enfrentam dificuldades com aquisição de itens básicos para aulas e atividades laboratoriais, como jalecos, obrigatórios em algumas seções. “Isso afeta diretamente a permanência estudantil. Esses alunos não terão autoestima suficiente para entrar em uma sala de aula e se sentir parte daquela população. É tão difícil passar no vestibular e as pessoas ainda têm esse empecilho para acessar uma sala de aula, porque não possuem os itens básicos.”

Experimento no Laboratório de Engenharia de Separações - Foto: Cecília Bastos / USP Imagens

Ainda no tema da assistência estudantil, Érika pede mais atenção da USP para a situação das estudantes que também são mães, em especial as mães solo. “Não vemos políticas de permanência voltadas para esse público, que existe e é muitas vezes ignorado.” De acordo com a graduanda, a ausência de creche no campus e a limitação do auxílio-creche a professores e funcionários criam uma situação complicada, agravada por conta do horário de funcionamento das creches municipais de Pirassununga, que não oferecem atendimento noturno. “As mães solo não têm condições mínimas de permanência sem rede de apoio”, comenta Érika, ela mesma mãe solo.

Mais uma demanda estudantil que está no radar do CAUPi e já foi até mesmo levada ao reitor em sua visita ao campus, em agosto, envolve as instalações da faculdade. Além de alertar que o número atual de salas de aula não atende com qualidade à demanda das turmas, o centro acadêmico chama a atenção para a acessibilidade do espaço físico da FZEA. “A faculdade não tem estrutura para receber pessoas com deficiência e essa é uma questão pouco falada”, aponta Mariana.

As estudantes pedem um olhar especial também para a biblioteca, cujo projeto elaborado há cerca de dez anos ainda aguarda a conclusão. Segundo Érika, o atual espaço não é suficiente para comportar os estudantes durante o período de provas e, além disso, falta isolamento acústico nas salas de estudo. Sua abertura por 24 horas e a construção de um anfiteatro, copa e sala de convivência para os alunos também são esperadas. “É importante pontuar que nós já estamos contando com a conclusão do projeto original”, salienta a estudante.

Saúde mental é outro assunto importante para a atual gestão do centro acadêmico. As estudantes denunciam cobranças excessivas e pressão psicológica por parte de alguns docentes da faculdade. Tais práticas, somadas ao grande histórico de reprovação dos cursos, criariam um ambiente desestabilizador para o corpo discente, sobretudo para os estudantes ingressantes. Tudo isso em um cenário no qual a comunidade é atendida por sete psicólogos voluntários e um psiquiatra, número insuficiente para a demanda, segundo Mariana.

No que diz respeito aos cursos de graduação, as estudantes indicam tanto pontos positivos quanto áreas nas quais esperam melhorias. Mariana, que é estudante de Engenharia de Alimentos, elogia a visão de conjunto oferecida pelo curso, no qual os alunos têm acesso a uma fábrica de ração, podem acompanhar a produção de lácteos e conhecer uma planta piloto, para citar apenas algumas das atividades. “No quesito interdisciplinar, de dar uma visão bem ampla dentro do lema do ‘campo à mesa’, a faculdade realiza isso de forma muito satisfatória”, reconhece a graduanda.

Érika, por sua vez, da Medicina Veterinária, gostaria que o curso oferecesse mais espaço para quem tem interesse em seguir nas áreas de animais de pequeno porte, silvestres ou pets não convencionais. “É incrível que as pessoas interessadas em produção possam ter essa diversidade – suínos, aves, equinos, ruminantes – e acompanhar toda a cadeia. Mas para quem gostaria de seguir por outras áreas é complicado até para termos casuística no Hospital Veterinário.”

O problema da falta de quadros, sobretudo de professores, também é sentido pelos estudantes. Mariana relata que algumas disciplinas obrigatórias já chegaram a não ser oferecidas por conta da aposentadoria de docentes e ausência de alguém para substituí-los. “É inconcebível que a faculdade deixe uma disciplina sem oferecimento. Esperamos que a partir de agora sejam contratados professores com antecedência, para não termos mais esse problema”, cobra a estudante.

A experiência dos funcionários

Assim como todas as outras unidades da USP, nem só de professores e estudantes se faz a FZEA. Parte fundamental do dia a dia da faculdade passa pela atuação de seus 128 funcionários técnico-administrativos. Atuando em laboratórios, setores administrativos e no trato com os animais, os servidores contribuem com histórias de afeto e momentos de protagonismo na unidade.

Uma dessas pessoas é Luci Vercik, especialista de Laboratório, cuja trajetória na unidade começa ainda em seu pós-doutorado, feito na Unicamp mas com a co-orientação da professora Eliana Rigo. Além dos estudos realizados na FZEA, há mais de uma década Luci trabalha nos Laboratórios de Biomateriais e Biossensores (Biolab) e de Nanotecnologia, Biossensores e Dispositivos (nanoBioDev) do Departamento de Ciências Básicas (ZAB), o mesmo lugar onde realizou parte de seus trabalhos de pós-doc.

No laboratório, Luci auxilia professores e estudantes no desenvolvimento de biomateriais, como implantes ortopédicos e odontológicos, membranas à base de quitosana e colágeno e também nas pesquisas com nanotecnologia voltadas para setores da medicina. Essa atuação tem a ver com a interdisciplinaridade dos laboratórios, já que seus professores são vinculados ao Programa de Pós-Graduação Interunidades em Bioengenharia, sediado no campus da USP em São Carlos.

Isso não significa, porém, que estudantes da FZEA não passem regularmente pelo laboratório. Luci enfatiza as aulas de graduação que acontecem no espaço e servem de treinamento para as turmas. “Isso oferece a eles experiência e segurança para trabalhar em laboratório e em grupo, para sair de situações que não dão certo, por exemplo”, comenta a funcionária.

Trabalhando há 11 anos na FZEA, Luci sente que a relação com a equipe e os estudantes é a de uma grande família e considera a experiência de estar em uma cidade do interior bastante positiva. “É sempre muito bom chegar aqui e ver todo esse verde.” Por outro lado, ela também sente os problemas de infraestrutura e falta de materiais relatados por parte da comunidade. “Falta material para os alunos terem aulas práticas adequadas e a infraestrutura de laboratório não comporta muitos estudantes. Isso acaba desgastando um pouco nosso trabalho”, desabafa.

A servidora fala do ponto de vista de quem está acostumada a prestar atenção nas demandas dos trabalhadores. Luci é diretora de base do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) e está constantemente atenta para os problemas da categoria. Justamente por isso ela faz um apelo aos colegas.

Luci Vercik - Foto: Reprodução/FZEA

Luci Vercik - Foto: Reprodução/FZEA

“Os funcionários da FZEA se envolvem muito pouco nas atividades. Temos apenas dez associados ao Sintusp, é muito pouco. Porque na hora de batalhar por nossos direitos é só o sindicato, ninguém toma nossas dores, ninguém recebe nossas reclamações melhor do que o sindicato. Os funcionários são muito individualistas, não se preocupam com o coletivo, não se articulam, não estão dispostos a ir a uma reunião ou assembleia. Depois vêm e reclamam para mim, mas eu não posso brigar por eles. Eu espero que o funcionário venha e vá comigo até o sindicato expor o que está passando. Mas ele não tem coragem, não sei o que ele sente para não falar.”

Enquanto a experiência de Luci transita entre o laboratório e a organização sindical, a de Delaine Rocha envolve outros atores e espaços da comunidade. Juntas, as duas vivências ajudam a mostrar um pouco da diversidade do engajamento dos funcionários da FZEA. Servidora da Universidade há 17 anos, Delaine já atuou em várias áreas como o setor de Compras, Tesouraria e a Secretaria do Departamento de Engenharia de Biossistemas (ZEB) onde está atualmente.

Delaine Rocha - Foto: Reprodução/LinkedIn

Delaine Rocha - Foto: Reprodução/LinkedIn

Vinda de Minas Gerais, Delaine conta que a adaptação ao campus foi difícil nos primeiros anos, mas uma caminhada por suas paisagens e setores despertou uma ideia que transformou sua trajetória. “Certo dia vi uma vaca tendo um filhote e achei aquilo uma das coisas mais impressionantes do mundo. Comecei então a andar pelo campus e a conhecê-lo, ver que é um lugar lindo. E, conversando com amigas e outras pessoas da cidade, percebi que a gente de Pirassununga não conhecia a USP.”

A partir dessa constatação, Delaine teve a ideia de um projeto de extensão que levaria crianças da cidade para conhecer o campus. Surgia assim, em 2013, o USP na Escolinha, com apoio inicial dos professores Holmer Savastano e Alessandra Lopes.

Hoje o USP na Escolinha atende, em sua maioria, crianças de 5 a 10 anos da rede pública de ensino. As escolas recebem um material impresso que é distribuído para as crianças, com informações sobre o campus e os cursos, e depois uma visita é agendada. Nela, as crianças entram em contato com os animais e vivenciam uma experiência sensorial, investida de cheiros, cores e sons.

A visita padrão, conta Delaine, passa pela caprinocultura, suinocultura, cunicultura e os gados de leite do campus e é feita com a ajuda de voluntários – geralmente estudantes, mas professores e funcionários também já se dispuseram a participar do projeto. “O segredo do USP na Escolinha é que em momento algum da visita eu falo o que são exatamente as coisas. São as crianças que me contam”, comemora a funcionária.

Atualmente, a professora Luciane Martello é a responsável pelo projeto junto à Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária (PRCEU) da USP, mas Delaine conta que a parte prática do USP na Escolinha permanece com ela. “É um momento de carinho, para que as crianças percebam que isso aqui também é delas. Minha intenção é gerar esse pertencimento, para que as crianças, quando tiverem 16, 17 anos, pensem que podem passar na USP”, comenta Delaine.


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