Uma disputa que vem de longe

Raquel Rolnik comenta a disputa por um terreno entre o Teatro Oficina e o Grupo Silvio Santos, um conflito que teve início há décadas e ainda persiste em desdobramentos

 08/02/2024 - Publicado há 3 meses
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Na sua primeira coluna do ano, Raquel Rolnik aborda um tema que se arrasta por décadas e que coloca em lados opostos o Teatro Oficina e o Grupo Silvio Santos. O Teatro Oficina, em conjunto com outras organizações do bairro do Bixiga, pretende transformar um terreno ao lado do local onde funciona o teatro num parque, o Parque do Rio Bixiga, mas encontra no meio do caminho o proprietário do terreno, que é o Grupo Silvio Santos, que tem outros planos para o lugar. No último round dessa disputa, o Oficina construiu uma escada para dar acesso do teatro ao terreno do Grupo Silvio Santos, abrindo também no muro que separava os dois terrenos uma passagem para o livre trânsito de pessoas. O proprietário do terreno, Silvio Santos, entrou na Justiça e solicitou a retirada da escada e o fechamento do muro.

“Depois de muita discussão jurídica, e como o Teatro Oficina é um bem multitombado  por várias instâncias governamentais, inclusive pelo Iphan, que é federal, acabou que o Ministério Público decidiu que, sim, a escada poderia ser retirada. Porém, o fechamento do muro, para poder acontecer, como é um bem tombado, só poderia ser feito a partir de uma autorização do Iphan, coisa que se aplica para qualquer bem tombado. Acontece que esta coreografia aconteceu  justamente depois do anúncio, em dezembro, de que poderia acontecer um acordo junto ao Ministério Público para que recursos de uma multa devida pela Uninove pudessem ser utilizados para pagar uma desapropriação do terreno e, portanto, transformá-lo em público e parque. Junto com isso, veio a aprovação, na Câmara Municipal, de uma lei […] de transformação  daquele lugar num parque público. Quando justamente o grupo Silvio Santos recebe essa comunicação e  o Ministério Público pede a sua manifestação, eles entram para fechar o muro.”

Para além dos argumentos jurídicos e urbanísticos, de um lado e de outro, Raquel Rolnik entende que esse conflito é um conflito de modelo de cidade, “é um conflito das formas de uso e ocupação do solo por um espaço público aonde é possível vislumbrar a natureza, aonde essa natureza também esteja presente  na cidade, num momento em que se discute profundamente o modelo de ocupação das cidades e do planeta em função da própria crise climática. É o mesmo conflito também que deveria pautar a nossa discussão de Plano Diretor e Zoneamento, porque, na verdade, é um conflito muito central sobre o destino desse lugar que é de todos nós”.


Cidade para Todos
A coluna Cidade para Todos, com a professora Raquel Rolnik, vai ao ar quinzenalmente quinta-feira às 8h30, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e TV USP.

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