Cerca de 73 milhões de brasileiros apresentam algum distúrbio relacionado ao sono, de acordo com estudos realizados pela Associação Brasileira do Sono (ABS). Apesar de ser comum, especialistas apontam que o problema vem aumentando nas últimas décadas e apresenta influência direta de alguns aspectos, como idade, gênero e posição socioeconômica.
Entre os diferentes problemas associados ao sono, encontra-se a insônia, que é marcada pela dificuldade de manutenção do sono contínuo durante a noite e pelo aumento da latência do sono — período que o indivíduo demora para começar a dormir. Assim, as pessoas que sofrem com essa condição costumam se sentir cansadas, mal-humoradas e sonolentas ao longo do dia.
Rosa Hasan, médica e coordenadora do Laboratório e Ambulatório do Sono do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) da USP, explica que existem diferentes fatores que podem explicar o desenvolvimento da insônia em algumas pessoas. Atualmente, o principal motivo são as doenças mentais ou psiquiátricas, como a depressão e a ansiedade.
Origem e consequências
A insônia pode se apresentar, inicialmente, como um sintoma dessas doenças e, em alguns casos, pode se desenvolver como uma doença crônica. Nesses casos, mesmo que o sujeito trate de outros problemas a partir de terapias e medicação, é comum que a insônia permaneça. “Outras causas que favorecem a pessoa a dormir mal são: não ter uma rotina adequada de sono, trabalhar em turno, estresse e maus hábitos de sono de uma forma geral”, comenta a especialista.
Atualmente, pesquisas apontam que, além de acontecer com um maior número de pessoas, a insônia tem atingido um grupo etário mais novo. Rosa avalia que isso acontece em decorrência de uma juventude que faz o uso exacerbado das redes sociais, fator que deixa o jovem superestimulado na hora de dormir.
A falta de sono apresenta consequências diretas na vida daqueles que sofrem com ela, dessa forma, um dos problemas imediatos que podem ser observados nesse cenário é a não capacidade de desempenhar algumas funções ao longo do dia. “Se isso acontece uma noite ou outra, não tem problema. Contudo, no momento em que isso fica crônico e que passa a acontecer na maioria das noites, há um impacto no desempenho acadêmico, profissional, no humor e toda a parte cognitiva pode ficar um pouco prejudicada”, adiciona a médica.
A insônia crônica também está diretamente relacionada com maiores riscos de desenvolvimento de doenças cardiovasculares e de enfraquecimento do sistema imunológico.
Uso de medicação
Com o aumento dos casos, especialistas passaram a observar também o aumento do uso de medicamentos para tratar essa doença. Assim, entre os diferentes remédios utilizados no tratamento desse problema, encontra-se o Zolpidem — fármaco que está disponível no mercado há mais de 30 anos, mas que passou a ser utilizado com maior frequência na última década.
Sobre seu uso, Rosa Hasan explica que a automedicação não deve ser feita em nenhum cenário, nem mesmo para o consumo de medicamentos como antialérgicos e melatoninas, já que todos os remédios apresentam efeitos adversos e consequências específicas para cada indivíduo.
“Existe uma classe de remédios muito gostosa de tomar, por exemplo, o Zolpidem e essa classe de indutores do sono, calmantes e benzodiazepínicos que realmente melhoram, em um primeiro momento o sono da pessoa, apresentam o risco de causar uma dependência”, avalia a médica. Assim, pode ocorrer de os sujeitos passarem a usar esses medicamentos de forma crônica.
O tratamento padrão para o combate à insônia não é feito com a utilização de remédios, mas com tratamento psicológico e comportamental, contudo, esse tipo de terapia não é conhecida ou acessível para uma boa parcela da população. Esse tipo de acompanhamento é importante para que o médico especialista possa compreender a origem e os motivos de manutenção da insônia — que são únicos para cada paciente.
Individualização
Em alguns casos, a utilização de medicamentos é necessária, mas a sua receita é feita de forma individualizada e com um acompanhamento constante por parte dos especialistas. Rosa avalia ainda que medicamentos como o Zolpidem são muito atraentes por apresentarem uma meia-vida curta, assim, ele é atraente por, normalmente, não deixar uma ressaca em quem o está utilizando.
A médica explica ainda que medicações desse tipo perdem o efeito após algumas horas. Com isso, conforme o indivíduo utiliza o remédio uma tolerância a ele é criada, fazendo com que se tenha que tomar doses cada vez mais altas para obter o mesmo efeito de indução do sono. Por esse motivo, pessoas que já apresentam um histórico de dependência com outros remédios não são recomendadas a fazerem esse uso, sendo recomendada a utilização de outras classes de medicamentos.
Para melhorar esse cenário, Rosa considera que seria possível trocar a atual receita desses medicamentos por uma mais controlada, fator que diminuiria a sua prescrição. Além disso, é importante que os especialistas indiquem aos leigos no assunto que o uso corriqueiro desse tipo de medicamento deve ser evitado.
*Estagiária sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira
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