O sistema agroalimentar mundial é monótono e exige melhorias, de acordo com o G20

A Cátedra Josué de Castro produziu um documento que objetiva a melhoria das condições de vida dos animais de criação intensiva e sobre o qual fala a pesquisadora Rita Albernaz Gonçalves

 09/09/2024 - Publicado há 1 mês
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O bem-estar animal apresenta cinco componentes principais: saúde física, liberdade para expressar comportamento natural, ambiente adequado, ausência de estresse e sofrimento e manejo ético – Foto: PxHere/CC0 1.0
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De acordo com o Ministério da Agricultura e Pecuária, o bem-estar animal é definido pela maneira pela qual o animal está lidando com as condições em que vive. A partir de evidências científicas, ele deve estar saudável, bem nutrido, livre de doenças, angústia e possuir tratamento veterinário apropriado – abrigo, entre outras coisas. Ou seja, o bem-estar animal configura o seu estado atual.

Nesse sentido, a Cátedra Josué de Castro, membro temporário do Conselho Consultivo Nacional do Think20 Brasil (T20), produziu um policy brief que busca opções e ações que devem contribuir para melhorar as condições dos animais em cenários de criação intensiva.

O convite à cátedra foi feito após o Brasil ser oficializado como presidente do Grupo dos 20 (G20) — formado pelos ministros de finanças e chefes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo, mais a União Africana e União Europeia — e coordenador do T20, um dos grupos de engajamento que discutem e propõem soluções e políticas públicas para o desenvolvimento mundial. A reunião do G20 de 2024 acontecerá nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro, com a presença das lideranças dos membros.

Monotonia na produção alimentícia

A uniformidade dos produtos animais do sistema agroalimentar provoca problemas socioambientais, que são observados em três aspectos: na escolha das raças dos animais; na alimentação fornecida a eles; e na maneira pela qual são criados. Assim, a professora do Instituto Federal Catarinense, pesquisadora da Cátedra Josué de Castro e principal autora do policy brief sobre bem-estar animal, Rita Albernaz Gonçalves, afirma que essa seleção humana, baseada apenas na alta produtividade que favorece as indústrias, promove uma baixa qualidade de vida a esses animais — os quais desenvolvem doenças com maior facilidade.

Rita Albernaz-Gonçalves – Foto: ResearchGate

No que se refere à monotonia da alimentação, segundo a especialista, a pouca variedade de alimentos disponibilizados nas rações — como o milho e a soja — não são suficientes para garantir as necessidades nutricionais dos animais. “Dessa forma, há necessidade de inclusão de aditivos nutricionais comercializados por grandes empresas multinacionais. Isso torna a pecuária intensiva altamente dependente de insumos industrializados, o que aumenta ainda mais os custos de produção e a dependência de importação desses produtos”, explica.

Rita cita a maneira de confinamento dos animais para desenvolver a uniformidade na criação deles, uma vez que essa prática favorece a transmissão de patógenos e o estresse crônico e, com o intuito de mitigar esses efeitos negativos, os criadores abusam de antibióticos, o que influencia negativamente em sua qualidade de vida.

Alternativas e soluções

A fim de obter resultados duradouros e resolver os problemas da monotonia dos sistemas agroalimentares é necessário uma busca complexa por soluções integrativas e sistêmicas, como a diversificação dos alimentos componentes das rações — alimentos esses que não podem competir com a alimentação humana —, e deve ocorrer o resgate de genéticas perdidas e o desenvolvimento de linhagens com raças mais rústicas, com o objetivo de produzir animais mais saudáveis. Além disso, é essencial a implementação de ambientes de criação equilibrados e desconcentrados, nos quais os animais terão espaço para viver e interagir entre si e com humanos de forma positiva.

Tudo isso, de acordo com a professora, irá garantir a qualidade de vida dos animais de fazenda: “É nossa obrigação ética e moral garantir a qualidade de vida dos animais durante todo o processo, não somente no momento do seu abate”. Ela usa de exemplo alguns modelos de criação mais amigáveis, como os de aves livres de gaiolas, a bovinocultura e o agrossilvipastoril.

Por outro lado, aqueles que defendem esse sistema monótono utilizam como base de argumentação o fato de que apenas dessa forma será possível suprir as necessidades alimentares das sociedades humanas. Mas, na visão da especialista, isso não é verdade. Para ela, já são produzidos alimentos fontes de proteína animal suficientes para garantir a nutrição total da sociedade, no entanto, a sua distribuição é malfeita e, diante desse cenário, a monotonia alimentar surge.

“Além disso, não temos licença social para impor sofrimento e dor aos animais com a justificativa de nos alimentarmos. A sociedade não aceita mais consumir alimentos sem saber sua origem, sem saber a que situações os animais são submetidos. O crescimento de selos de bem-estar animal e os compromissos públicos de grandes corporações que comercializam alimentos de origem animal nos mostram que estamos num momento de transição dos sistemas agroalimentares. É um caminho sem retorno, ainda bem”, finaliza a professora.

*Sob supervisão de Cinderela Caldeira e Paulo Capuzzo


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