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O Memorial aos Membros da Comunidade USP Vítimas do Regime da Ditadura Militar foi inaugurado em 2011, na Praça do Relógio, em frente ao Auditório Camargo Guarnieri. Composta de placas de concreto, a obra idealizada pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade (NEV) é uma homenagem aos professores, funcionários e estudantes que foram mortos ou desapareceram durante o período da ditadura militar (1964-1985). O monumento faz parte do projeto Direito à Memória e à Verdade da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR).
Roberta Astolfi, uma das responsáveis pelo Memorial, contou que o projeto passou a ser desenvolvido pois ainda faltava um reconhecimento institucional da USP sobre a ditadura. Inicialmente, a ideia era de que o Memorial abrangesse a todos, como pessoas que foram demitidas e/ou perseguidas. Mas, por ser algo muito amplo, houve um enfoque em quem foi afetado de forma mais severa: “Era para ser uma homenagem mais ampla, para vários tipos de atingidos, mas no fim acabou se focando nas pessoas que foram as vítimas fatais, aquelas que sofreram da forma mais absoluta, que tiveram violado o próprio direito à vida”.
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No memorial estão nomes como o de Ana Rosa Kucinski Silva. Integrante da Aliança Libertadora Nacional (ALN), era uma das mais jovens professoras do Instituto de Química (IQ) da USP quando foi dada como desaparecida, em 1974. O nome de Vladimir Herzog, um dos símbolos da ditadura militar, também figura no monumento. O jornalista e professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP foi morto nas dependências do Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) em 1975, após ser convocado para prestar depoimento sobre suas ligações com o Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Ainda que sua existência seja de grande importância, atualmente, o monumento está com várias pichações em quase todas as placas. Sua vandalização é um desrespeito a todos: aos estudantes e docentes da Universidade, aos homenageados e seus familiares.
Bernardo Kucinski, irmão de Ana Rosa Kucinski, também é professor de Jornalismo da ECA. Em 2012, Kucinski lançou K – Relato de uma busca, livro de ficção sobre um pai que busca encontrar sua filha, militante política desaparecida durante a ditadura militar. Em entrevista ao Jornal da USP, o autor falou sobre o esquecimento do Memorial. Para Kucinski, esse “esquecimento forçado” faz parte do sistema de dominação cultural e ideológica implantado desde o início da colonização, que só vem se sofisticando. Kucinski exemplifica: “Ontem mesmo fiquei sabendo que um grande painel de seis metros por 70 centímetros, do artista plástico Elifas Andreato, instalado na Câmara dos Deputados, em Brasília, sumiu sem que ninguém saiba explicar como. O painel retratava as atrocidades cometidas durante a ditadura militar”.
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“Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”, a frase, quinto artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos, está inscrita na primeira coluna do monumento. A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi elaborada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, após o fim da Segunda Guerra Mundial. Mesmo com declarações, acordos e toda a história que conhecemos, atos de tortura e que desrespeitam os direitos humanos voltaram a acontecer 20 anos depois no Brasil, como em outros lugares do mundo. Em alguns países, ainda acontecem. Para Roberta Astolfi, a existência de um Memorial é uma iniciativa fundamental, devido ao momento de polarização ideológica em que vivemos: “Começa a se colocar em jogo aquilo que a gente não deveria mexer, que é a base da democracia: o direito fundamental à vida. Nesse momento político que a gente vive é fundamental os jovens entenderem o que aconteceu. Não perderem de vista, estarem sempre passando, vendo e se lembrando. E essa história estar sempre sendo recontada e rememorada para que isso não se repita”.