A microglia é uma célula do sistema imunológico e deveria proteger o cérebro de infecções, reparar lesões e limpar células mortas. Mas, quando um câncer se instala, ela passa a agir como um tumor.
[embedyt] https://www.youtube.com/embed?listType=playlist&list=PLAudUnJeNg4sGQgaXvY-5z5daZ8eezFrc&v=4j2_lmuhJpA&layout=gallery[/embedyt]Contradição
Ou seja, em vez de combater o câncer, a microglia cria melhores condições para ele prosperar. Essa uma das principais conclusões dos estudos de doutorado da biomédica Thaís Galatro, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP).
Orientada pela médica Suely Marie, professora da FMUSP, Thaís ganhou o prêmio Tese Destaque USP 2017 na categoria Ciências da Saúde.
15 meses de vida
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Em geral, os gliomas – os mais comuns cânceres do cérebro – passam despercebidos nas fases iniciais.
Muitos são detectados apenas tardiamente, quando têm uma progressão rápida e já invadiram outras áreas cerebrais. Nesse grau, são chamados de glioblastoma.
As opções de tratamento – quimioterapia, radioterapia e cirurgia – não costumam prolongar a sobrevida das pessoas para além de 15 meses.
Novo foco de pesquisa
Há décadas, cientistas investigam as células desse tumor em busca de uma forma de barrar sua progressão. Mesmo depois de tantas pesquisas, porém, os tratamentos são limitados.
Diante desse impasse, Thaís resolveu olhar para células ao redor: a microglia.
Dados iniciais
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O ineditismo do estudo cobrou seu preço: não havia dados genéticos sobre a microglia humana. Thaís precisava saber quais substâncias a microglia “saudável” produz para compará-las com as produzidas pelas células do microambiente do tumor.
Decidiu usar cérebros de pessoas mortas, mas que não tiveram problemas neurológicos ou câncer.
Nas autópsias, constatou que a microglia fica funcional até 24 horas depois do óbito. Essa foi a primeira grande descoberta da pesquisa.
Envelhecimento
Como as amostras vieram de pacientes de idades muito variadas, também pode comparar as células de pessoas mais novas e mais idosas. Veio a segunda constatação: a microglia perde capacidade de movimentação com a idade.
A mobilidade é fundamental para que a célula faça bem suas funções de monitoramento, limpeza, defesa e reparo de todo o tecido cerebral.
Essa parte da pesquisa, feita em conjunto com a Universidade de Groningen, da Holanda, foi publicada em um artigo na revista Nature Neuroscience:
Transcriptomic analysis of purified human cortical microglia reveals age-associated changes
No câncer, as surpresas
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Na terceira análise, Thaís esperava definir se a microglia tinha um perfil pró-inflamatório (contra o câncer) ou anti-inflamatório (a favor do câncer). Mas percebeu que ela se comporta dos dois jeitos, ao mesmo tempo, em um mesmo tumor.
E não foi só essa a surpresa: notou que a microglia tem atividades alteradas típicas das células de tumor – como as que envolvem a divisão exagerada, o bloqueio do gatilho para se autodestriur em caso de defeitos e maior capacidade de invadir o tecido ao lado.
Não é tumor, mas ajuda
A pesquisadora deixa claro: a microglia não virou um tumor. Mas as alterações beneficiam o câncer.
Essas conclusões, ela acredita, podem levar a novos caminhos de tratamento para os glioblastomas e para doenças neurodegenerativas.
Reportagem: Ana Paula Chinelli e Isabella Yoshimura | edição: Ana Paula Chinelli
Imagens extras: Thales Figueiredo; European Molecular Biology Laboratory (EMBL); Long-Jun Wu (Mayo Clinic); Suzanne Hickman, Joseph El Khoury (MSDF); Debasis Nayak, Theodore L. Roth, and Dorian B. McGavern (the Annual Review of Immunology); GerryShaw; Wai Wong (National Eye Institute); Teamsuperawesome.