Hora de comemorar as conquistas alcançadas sem esquecer as lutas que estão por vir

Por Danielle Palma de Oliveira, presidente da CAV-Mulheres, e Ana Regina Martins Moreira, vice-presidente da CAV-Mulheres

 10/03/2023 - Publicado há 1 ano
Danielle Palma de Oliveira- Foto: Arquivo pessoal

 

Ana Regina Martins Moreira – Foto: Arquivo pessoal

 

A humanidade tem cerca de 5.500 anos de história de escrita sistematizada. Entretanto, somente no ano de 1879, com a autorização de D. Pedro II, as mulheres puderam ingressar nas universidades brasileiras. Em 1932, com a criação do primeiro Código Eleitoral Brasileiro, as mulheres puderam votar. Porém, ainda em 2023, havia lei que proibia a laqueadura sem o consentimento do cônjuge/parceiro. Essa é parte da história de lutas que as mulheres travaram por igualdade e reconhecimento.

Ao longo do século 20, as mulheres se mobilizaram buscando, inicialmente, melhoria das condições de trabalho e igualdade salarial. Durante esse período, algumas tragédias relacionadas às más condições de trabalho ocorreram e alguns historiadores atribuem o Dia Internacional da Mulher a um desses eventos, como o incêndio em uma fábrica em Nova York em 1911. Mas há também quem atribua que a data comemorativa seja em decorrência de uma manifestação ocorrida na Rússia, em 1917, quando 90 mil operárias russas do setor de tecelagem entraram em greve, exatamente no dia 8 de março, reivindicando a ajuda dos operários do setor de metalurgia. Este movimento contribuiu para o ciclo revolucionário que derrubou a monarquia czarista. Mais de 50 anos depois, em 1975, a ONU comemorou oficialmente o Ano Internacional da Mulher e, em 1977, o “8 de março” foi reconhecido oficialmente pelas Nações Unidas como o Dia Internacional da Mulher.

Desde então nós, mulheres, temos cada vez mais nos empoderado e entendido que nosso papel na sociedade é tão importante quanto o dos homens. Não há distinção ou hierarquia entre os gêneros. Assim, tivemos grandes avanços ao longo dos anos: conquistamos o direito ao voto, à educação, à proteção em casos de violência, licença-maternidade, entre outras conquistas. Isso é suficiente? Claro que não!

Há ainda muitas lutas a serem travadas. É amplamente discutido nas mídias que algumas empresas oferecem salários maiores para homens em relação a mulheres na mesma função. Somos maioria dos eleitores, mas ainda temos pouca representação em cargos elevados. Naturalmente, o ambiente acadêmico reflete a sociedade em geral, embora tenhamos o direito ao mesmo salário dos homens, ainda temos poucas representantes em cargos de direção.

Em 2022, na USP, somos 1.931 docentes (37,47%), 6.134 (47,70%) servidoras técnico-administrativas, 27.690 alunas de graduação (46,01%) e 14.583 (50,42%). Porém, em 89 anos de existência, tivemos apenas uma mulher reitora da Universidade. No campus de Ribeirão Preto, tivemos uma diretora na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), uma diretora na Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP), quatro diretoras na Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), quatro diretoras na Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (Forp), uma diretora na Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP), nove diretoras na Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP), três prefeitas no campus e nenhuma mulher na diretoria da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP). Hoje, temos a ampla representação na prefeitura do campus, como prefeita e vice-prefeita, mas este é um quadro raro em nossa comunidade.

Como um pequeno recorte dessa história de luta dentro da USP em Ribeirão, podemos citar a edição do livro Mulheres e Medicina, escrito pela professora Marta Edna, docente da FMRP, homenageando as “pioneiras” do curso de Medicina de Ribeirão Preto, no qual temos um retrato histórico das lutas das mulheres para cursarem Medicina no Brasil, dos obstáculos e dificuldades enfrentadas em tempos mais remotos. O livro lista, dentre outras histórias de vida, uma conquista a ser comemorada e que ocorreu no primeiro vestibular em 1952 para o curso de Medicina, quando tivemos somente 15 mulheres dos 320 candidatos, mas a primeira classificada foi uma mulher, Laone Gessy Sperandio. Depois dela, outras tantas alunas ingressaram no ensino superior da USP em Ribeirão Preto, muitas se tornando, posteriormente, docentes nas próprias unidades.

Assim, vemos que já avançamos, mas a sociedade como um todo precisa se mobilizar e refletir sobre o papel da mulher em todas as esferas. Não podemos, mulheres e homens, aceitar a violência contra a mulher. Segundo um estudo publicado recentemente pelo IPEA, no Brasil são estimados cerca de 822 mil casos de estupro por ano, o que equivalente a dois por minuto. O número é estimado, pois se acredita que menos de 10% dos casos sejam denunciados e menos de 5% sejam identificados pelo Sistema de Saúde. Estes números são assustadores, mas ainda não revelam toda a problemática envolvendo a violência contra mulheres, que, além da violência sexual, engloba também a violência moral, patrimonial, psicológica e física, que pode chegar ao extremo do feminicídio (para mais informações sobre os tipos de violência de gênero, consultem nossa cartilha).

Mas por que as mulheres não denunciam? Muitas nem sabem onde procurar ajuda, outras sentem vergonha e até mesmo sentimento de culpa pela violência que sofreram. Para tentar coibir e apurar casos de violência contra mulheres e gêneros na comunidade acadêmica, foi criada a Comissão para Apurar Denúncias de Violência contra Mulheres e Gêneros (CAV-Mulheres) do campus Ribeirão Preto da USP. A CAV-Mulheres tem como principal atribuição apurar os casos de violência que são denunciados por meio de um formulário, disponível em nosso site. Porém, não temos o poder punitivo: nosso papel é acolher as vítimas, ouvir seu relato, orientar sobre seus direitos e encaminhar o caso ao dirigente responsável pela unidade à qual o agressor pertence, para que sejam tomadas as medidas administrativas cabíveis.

Outro papel de extrema importância da CAV-Mulheres é de conscientizar a comunidade acadêmica com ações voltadas tanto às mulheres quanto aos homens. Para tanto, a CAV-Mulheres está sempre à disposição (cavmulheres@gmail.com) das unidades para palestras, mesas-redondas e outras atividades, principalmente na Semana de Recepção aos Calouros, porque acreditamos que unidas somos mais fortes.

Assim, em nome da CAV, terminamos este texto parabenizando todas as mulheres pela capacidade única de unir força e delicadeza, firmeza e carinho, razão e emoção. Nos colocamos mais uma vez à disposição de todas, a CAV-Mulheres está aqui por vocês, seja para escutar ou orientar, mas o importante é que nós não nos calemos.

Não se cale, denuncie!

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