Espetáculo no Teatro da USP conta história de guerrilheira amiga de Dilma Rousseff

“Dora”, espetáculo que reestreia no Centro Cultural Camargo Guarnieri, retrata a vida e luta de Maria Auxiliadora Lara Barcelos a partir de trechos de cartas e escritos trocados entre a guerrilheira e sua mãe

 25/10/2024 - Publicado há 2 meses
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Cena da peça Dora, em cartaz no Teatro da USP, no Centro Cultural Camargo Guarnieri – Foto: Jr Pinheiro

Neste final de mês o espetáculo Dora reestreia no Teatro da USP (Tusp), em sua sala no Butantã, em curta temporada, de 25 de outubro a 3 de novembro. As sessões serão às sextas e sábados, às 20h, e aos domingos, às 18h, com ingressos gratuitos. Em razão das eleições municipais, não haverá sessão no domingo, 27, e uma sessão extra será realizada na quinta-feira, 31/10, às 20h.

A reestreia conta com um debate com o escritor Julián Fuks, após a apresentação. No sábado, depois da peça, a conversa é com Adriano Diogo, que presidiu a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo.

No espetáculo, Sara Antunes, que escreve, dirige e interpreta a personagem, mergulha na história de Dora – como a guerrilheira era conhecida –, que aos 23 anos se uniu à luta armada contra a ditadura militar brasileira, enfrentando a prisão, a tortura e o exílio, que culmina em seu suicídio em 1976, na Alemanha. A peça resgata trechos de cartas e escritos trocados entre ela e sua mãe, gerando um espaço de diálogo entre as realidades do confinamento e os anseios por um futuro utópico.

Fotografia: Alessandra Nohvais

“É uma figura que entregou o corpo inteiro à luta que acreditava. Mais do que contar sua morte, desejo trazê-la para a vida”, conta Sara Antunes. “Dora foi uma figura feminina política no âmbito pessoal – porque o pessoal é político, como diz Simone de Beauvoir –, e também na esfera pública.” Entrou na faculdade de medicina em terceiro lugar, em uma época em que 90% dos alunos do curso eram homens. “Ela se envolveu politicamente nas organizações, foi presa, exilada e denunciou a ditadura. Foi muito amiga e parceira de casa de Dilma Rousseff”, completa.

Em um espaço cênico que combina a sala de anatomia de uma estudante de medicina com o corpo de uma guerrilheira, Dora explora os escritos autênticos  durante a ditadura, estabelecendo um diálogo sensorial e íntimo entre Maria Auxiliadora e sua mãe. O espetáculo ressoa a história do Brasil nos 60 anos do golpe militar, criando um espaço de reflexão sobre a luta pela liberdade e a preservação da memória daqueles que resistiram à injustiça.

A peça propõe uma reflexão sobre a jornada que a levou à luta política, transformando o palco em um espaço onde sua presença se faz viva, e explora resistência e memória. A trilha sonora inclui Tropicália, Violeta Parra e Torquato Neto, canções que marcaram aquela época e que a própria Dora ouvia.

“O cenário tem aspectos singulares, porque resolvi reunir os papéis, as cartas e os documentos coletados nesses anos todos numa espécie de instalação”, conta Sara. “Sempre senti que os documentos da Dora ficavam me olhando, me indagando, numa espécie de ‘quando você vai colocar enfim para estrear?’. Chegou a hora e eu literalmente quero colocá-los em cena” explica.

Trajetória de Dora

A peça teve seu início em 2016, quando Sara Antunes começou sua pesquisa após convite do diretor José Barahona para atuar no documentário Alma Clandestina. Ao conhecer a história de Dora, idealizou um espetáculo, inicialmente planejado para 2020.

Com a pandemia, o projeto foi adaptado, resultando no curta De Dora, por Sara, lançado na Mostra de Cinema Tiradentes, em janeiro de 2021. Em seguida, o espetáculo foi apresentado de forma on-line em plataformas digitais e, quando os palcos se abriram ao fim da pandemia, foram realizadas duas aberturas do processo, no Theatro Municipal de São Paulo e na Mostra de Direitos Humanos de João Pessoa. Em 2024, a obra estreou presencialmente no Sesc Ipiranga, retomando suas temporadas agora na sala do Tusp Butantã, no Centro Cultural Camargo Guarnieri.

Sobre Dora

Maria Auxiliadora Lara Barcelos (1945-1976), nascida em 25 de março na cidade de Antônio Dias (MG), é uma figura rica em história, embora pouco conhecida. Estudante de medicina e integrante da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR-Palmares), Dora tinha 23 anos quando foi presa e torturada.

Foi libertada junto de outros prisioneiros em troca do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher e banida do Brasil. Viveu no Chile, Bélgica, França e, em 1974, estabeleceu-se na Alemanha, onde cometeu suicídio dois anos depois jogando-se na frente de um trem, devido às sequelas causadas pela tortura.

Durante seu tempo na prisão, foi submetida a diversas formas de violações, principalmente de natureza desmoralizante por sua condição de mulher. Foi exposta como objeto de visitação para militares curiosos, e sofreu degradação moral diante de seus companheiros. Dora denunciou essas violências durante seu julgamento na Justiça Militar.

No exílio, escreveu: “Sou boi marcado, fui aprendiz de feiticeira. Eu era criança e idealista. Hoje sou adulta e materialista, mas continuo sonhando. Dentro da minha represa, não há lei neste mundo que impeça o boi de voar.”

Dora

De 25 de outubro a 3 de novembro | Sextas e sábados, 20h; domingos, 18h
No dia 27 de outubro não haverá sessão por conta do segundo turno das eleições municipais.
Sessão extra no dia 31 de outubro, quinta-feira, 20h

14 anos | 60 min. | 60 lugares | Gratuito – Retirada uma hora antes na bilheteria

TUSP Butantã – R. do Anfiteatro 106, Cidade Universitária
(entrada temporariamente pela lateral esquerda do prédio – entrada do Cinusp)

 

* Texto de Fábio Larsson com edição da Divisão de Comunicação da PRCEU


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