Prêmio destaca produção científica no combate ao câncer

Os vencedores desenvolveram uma molécula com atividade antitumoral e anticoagulante e marcadores biológicos da saliva que indicam a evolução de um tipo comum de câncer de boca

 16/08/2016 - Publicado há 8 anos     Atualizado: 24/04/2018 as 13:16
A partir da glândula que produz a saliva, pesquisadores desenvolvem proteína que mata células tumorais - Foto: Guilherme Lara Campos/ Divulgação Gov. ESP
A partir da glândula que produz a saliva, pesquisadores desenvolveram proteína que mata células tumorais – Foto: Guilherme Lara Campos/Gov. ESP

A criação de novas estratégias de combate ao câncer é a ganhadora da sétima edição do Prêmio Octávio Frias de Oliveira, concedido em três categorias pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) em parceria com o Grupo Folha.

A premiação foi realizada em 9 de agosto, no teatro da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), e laureou pesquisadores cujos estudos levaram à obtenção de uma molécula com atividade antitumoral e anticoagulante e de marcadores biológicos da saliva que podem indicar a evolução de um tipo comum de câncer de boca.

Ana Marisa Chudzinski-Tavassi coordena a pesquisa premiada na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia - Foto: Guilherme Lara Campos/Gov. ESP
Ana Marisa Chudzinski-Tavassi coordena a pesquisa premiada na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia – Foto: Guilherme Lara Campos/Gov. ESP

Os vencedores na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia são pesquisadores do Laboratório de Bioquímica do Instituto Butantan, coordenados por Ana Marisa Chudzinski-Tavassi.

Como resultado de uma pesquisa iniciada em 2006, eles obtiveram uma proteína a partir da glândula salivar do carrapato-estrela (Amblyomma cajennense) com potencial para se tornar um medicamento antitumoral e anticoagulante.

Em testes in vitro, a proteína, chamada Amblyomin-X, inibiu a proliferação de 23 linhagens de células tumorais humanas, sem, no entanto, agir sobre as células sadias.

Os pesquisadores verificaram também que a Amblyomin-X, inicialmente caracterizada como anticoagulante, tem afinidade por células tumorais. Uma vez incorporado por elas, reduz a atividade do proteassoma, estrutura responsável pela eliminação de resíduos do metabolismo celular, e das mitocôndrias, responsáveis pela respiração celular. Como resultado, a célula entra em apoptose (morte celular programada) e a proliferação das células tumorais é interrompida.

Com seu mecanismo de ação esclarecido, a Amblyomin-X foi submetida a testes pré-clínicos em modelos animais (camundongos e coelhos), os quais indicaram uma toxicidade aceitável. Mais recentemente, foi iniciada a transferência da tecnologia de produção escalonada para uma empresa farmacêutica nacional, a União Química, com a qual trabalha em colaboração neste projeto.

A estrutura da molécula desenvolvida a partir da glândula que produz a saliva - Foto: Guilherme Lara Campos/Gov. ESP
A estrutura da molécula desenvolvida a partir da glândula que produz a saliva – Foto: Guilherme Lara Campos/Gov. ESP

A parceria foi concebida no âmbito do Centro de Toxinas, Resposta Imune e Sinalização Celular (CeTICS), um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). O projeto conta ainda com apoio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

“Se tudo correr bem, os ensaios clínicos para avaliar a segurança do produto em seres humanos devem começar no primeiro semestre de 2017 envolvendo pacientes de diferentes hospitais”, disse Ana Marisa, que é a coordenadora de Inovação do CeTICS.

A expectativa é que o possível medicamento se mostre eficaz contra o melanoma, o câncer de pâncreas e o renal.

Marcadores para câncer de boca

Na categoria Pesquisa em Oncologia foram premiados pesquisadores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), em Campinas, da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas (FOP-Unicamp) e do próprio Icesp.

Eles verificaram que proteínas da saliva podem indicar a evolução do carcinoma oral de células escamosas (OSCC), um tipo bastante comum de câncer de boca.

Adriana Franco Paes Leme coordena o trabalho premiado na categoria Pesquisa em Oncologia - Foto: Arquivo pessoal/BV FAPESP
Adriana Franco Paes Leme coordena o trabalho premiado na categoria Pesquisa em Oncologia – Foto: Arquivo pessoal/BV Fapesp

Em um estudo publicado em 2015 na revista Scientific Reports, da Nature, o grupo, coordenado por Adriana Franco Paes Leme, do LNBio, comparou as proteínas de amostras de saliva e de vesículas extracelulares salivares de dez indivíduos saudáveis e de 20 com OSCC, com e sem lesão ativa, por meio da técnica de proteômica baseada em espectrometria de massas.

A análise mostrou diferenças significativas na composição de proteínas da saliva, permitindo uma classificação dos indivíduos saudáveis e com câncer oral com 90% de acurácia.

O estudo fortalece a possibilidade de uso de proteínas da saliva como marcador biológico complementar não invasivo da progressão de tumores de boca. O grupo de pesquisa pretende agora avaliar amostras de saliva, sangue e tecidos de um número maior de indivíduos saudáveis e com lesões orais, ativas ou não, para validar essa nova abordagem.

“A saliva se mostrou uma potencial fonte de marcadores de prognóstico que podem ajudar na decisão do tratamento. Isso é animador porque se trata de um fluido que pode ser obtido sem a necessidade de procedimentos invasivos”, disse Adriana.

Menção honrosa

O médico baiano Aristides Pereira Maltez Filho ganhou uma menção honrosa pela consolidação de uma das mais antigas instituições de combate ao câncer no País, o Hospital Aristides Maltez (HAM), em Salvador.

Formado pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 1957, Maltez assumiu em 1992 a presidência da Liga Bahiana Contra o Câncer (LBCC), em Salvador, prosseguindo o trabalho do pai, Aristides Maltez, que idealizou um instituto para atender pessoas carentes com câncer. Inaugurado com apenas 15 leitos em 1952, nove anos depois da morte de seu criador o HAM se tornou um dos principais centros de combate ao câncer no Nordeste.

Como presidente da LBCC, instituição mantenedora do HAM, Maltez Filho implantou centros de radioterapia, unidades de terapia intensiva, centros de imagem, cuidados paliativos e assistência domiciliar, além de aumentar a capacidade do hospital para 232 leitos, destacando-se na especialização e no aprimoramento de profissionais de saúde e na implantação de campanhas de prevenção de câncer na Bahia. “Atendemos, em média, 3.500 pessoas por dia, exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde, o SUS”, disse.

Pesquisas premiadas têm apoio da Fapesp

Os estudos premiados agora, coordenados por Ana Marisa e por Adriana, têm em comum o fato de contarem com financiamento da Fapesp. Desde que o Prêmio Octávio Frias de Oliveira passou a ser concedido para pesquisas em Oncologia, em todas as edições foram premiados cientistas que contaram com auxílio à pesquisa da Fapesp.

Na edição de 2015, por exemplo, o vencedor na categoria Pesquisa em Oncologia foi um estudo coordenado por Dirce Maria Carraro, do A. C. Camargo Cancer Center.

No ano anterior, os vencedores foram Luís Carlos de Souza Ferreira e Mariana de Oliveira Diniz, do Instituto de Ciências Biomédicas (IB) da USP. Eduardo Magalhães Rego, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP e do Centro de Terapia Celular (um Cepid da Fapesp) levou a Menção Honrosa.

Em 2013, André Luiz Vettore de Oliveira, da Universidade Federal de São Paulo, ganhou em Pesquisa em Oncologia. Iseu Nunes, da Farmabrasilis, e Wagner José Fávaro e Nelson Duran, da Unicamp, foram os premiados em Inovação Tecnológica em Oncologia.

Rodrigo de Oliveira Andrade/Agência Fapesp


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