Trabalhos artísticos em espaços públicos democratizam o acesso à cultura

Especialistas comentam a respeito dos benefícios provocados pela apreciação a obras de arte e os desafios para mantê-las preservadas

 Publicado: 18/06/2024
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Muitos locais públicos atuam como espaços para recebimento de obras – Foto: Cecília Bastos/USP Imagens
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A implementação de obras de arte em espaços públicos é uma prática comum nas grandes cidades e no Metrô de São Paulo, por exemplo, onde diversos quadros são expostos nas paredes das estações. Em praças públicas, é comum a presença de estátuas e monumentos que homenageiam figuras ou acontecimentos históricos. O professor Agnaldo Farias, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, discorre sobre a importância desses trabalhos artísticos para a cidade e para os cidadãos.

Segundo o especialista, independentemente da natureza do trabalho artístico, é extremamente importante que ele venha a ocupar espaços da cidade para que, de algum modo, possa contribuir para a qualidade de vida das pessoas. Ele esclarece que as obras de arte podem surtir efeitos de diferentes maneiras nos espectadores, algumas precisam ser observadas por bastante tempo para encantar ou intrigar o indivíduo, outras têm rápida comunicabilidade e atingem o transeunte instantaneamente.

Agnaldo Farias – Foto: Maria Leonor de Calasans/IEA-USP

Apesar do impacto causado pelos trabalhos artísticos, o docente acredita que a maioria das pessoas acaba não prestando atenção pelos mais diversos motivos, como a concentração e foco nos seus afazeres cotidianos ou o cansaço após mais um dia cumprido. Contudo, ele diz que mesmo os trabalhos que passam despercebidos podem atingir o inconsciente e ter influência sobre os transeuntes. “Mesmo esses trabalhos que acabam não sendo vistos podem falar no inconsciente de uma maneira muito sutil e discreta, porém, eficiente. Portanto, eu não vejo problema nas pessoas que não reparam, eu acho que de algum modo elas estão registrando aquilo, porque nós somos seres muito sensíveis, então acredito que um bom trabalho artístico tem esse poder de chegar até as pessoas de diversas formas”, explica.

Preservação

De acordo com o professor, muitos locais públicos atuam como espaços para recebimento de obras e, entre eles, destacam-se as praças, as quais são ocupadas dessa maneira pelo menos desde o início do século 20, com a presença de monumentos clássicos, estátuas figurativas de personagens históricos e relevantes. Além disso, ele conta que novas áreas estão emergindo como pontos de instalação dos trabalhos artísticos, como avenidas, viadutos e as próprias estações de Metrô, o que contribui para a existência de espaços nos quais os artistas podem expor suas produções.

Em contrapartida, Farias afirma que uma obra aberta ao público e exposta ao ar livre precisa ser muito estudada, porque pode sofrer vandalização e até mesmo ser perigosa para a população. Ele conta que, se é decidido que um trabalho ficará exposto ao ar livre, é preciso que haja o conhecimento de que  vai encarar ações de deterioração do tempo e de outras ações da população.

De acordo com o docente, para esse tipo de obra, é preciso que haja mais orçamento, pois são mais dispendiosas e exigem gastos com comissionamentos, vigilância, manutenção e o próprio projeto, além do atendimento à logística e à burocracia. Apesar dos valores envolvidos, ele conta que ainda falta sensibilidade ao poder público ao não perceber na arte um elemento fundamental para a qualificação do espaço urbano. “Conforme isso vai acontecendo, essa ideia vai sendo amadurecida. Desse modo, as próprias cidades adquirem uma maior proficiência e entendem o modo adequado de trabalhar com esse grande privilégio que é receber a obra de certos artistas, sem deixar que sejam vandalizadas ou destruídas pela ação do tempo”, analisa.

Benefícios

Sandra Patrício – Foto: Maria Leonor de Calasans/IEA-USP

A professora Sandra Patrício, do Instituto de Psicologia (IP) da USP, explica que as obras de arte podem representar diferentes sentimentos em cada indivíduo. Ela reforça que, no geral, a arte costuma ser utilizada pelas pessoas como um escape para que haja uma fuga dos problemas e dificuldades do cotidiano. Ela conta que não há problemas quando a arte é usada como escape, mas, desse modo, ela pode ser confundida com entretenimento e assumir um caráter mais decorativo ou propagandístico, tentando disseminar uma ideia defendida por algum artista em particular.

Segundo a docente, de qualquer modo, mesmo quando o contato com a arte se dá apenas como passatempo ou entretenimento, ela assume esse potencial de despertar o sujeito para aspectos da existência que desafiam o ser humano e exigem uma busca pela clareza. “Isso é benéfico não apenas para as pessoas que contemplam as obras, mas na medida em que essa contemplação e reflexão contribuem para aprimoramento pessoal dos indivíduos, refletem positivamente na melhoria dos lugares que são habitados por essas pessoas”, analisa.

Democratização

Conforme a especialista, expor obras de arte em locais de passagem com alto fluxo de pessoas é importante para difundir, popularizar e tornar acessível as produções culturais para aquela parcela da população que não possui condições de frequentar museus, teatros ou exposições, seja por fatores financeiros, educacionais ou apenas por falta de tempo.

“Eu penso que esse acesso pode contribuir para despertar nas pessoas que passam sentimentos de admiração e apreço pelo esforço feito pela humanidade para se aprimorar. A história da humanidade pode ser vista  como um esforço contínuo para superar situações difíceis, para descobrir verdades que ajudam a transformar o mundo e torná-lo mais bonito, rico, bondoso, e a arte faz parte desse esforço”, conta. 

Atividades 

De acordo com Sandra, existem outras atividades que podem auxiliar na redução do estresse e pressão do dia a dia, dentre as quais ela destaca a prática de esportes, de atividades físicas e o exercício meditativo da filosofia. Ela afirma que, assim como a arte, essas práticas auxiliam o ser humano a ampliar a compreensão sobre os próprios limites para estimular o máximo potencial de cada indivíduo. 

“Isso de poder colocar as coisas em perspectiva, que é propiciado não só pela arte, mas também pelos esportes e pela filosofia, não apenas nos ajuda a suportar a pressão, como também é essencial para compreender as relações que engendram essas dificuldades, quiçá encontrar soluções mais efetivas para verdadeiramente melhorar a vida humana”, finaliza.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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