Mostra do Cinema da USP homenageia o diretor Jorge Furtado

Produções do diretor gaúcho - entre programas de TV, curtas e longas-metragens - serão exibidas até 5 de maio

 Publicado: 24/04/2024

Texto: Ricardo Thomé*
Arte: Diego Facundini**

Foto: Divulgação/Cinusp

Teve início na segunda-feira passada, dia 22, a mostra Jorge Furtado: Tudo Isso Aconteceu, Mais ou Menos, do Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp), com curadoria do pesquisador Wilq Vicente. Até 5 de maio, o público será apresentado às diversas facetas da obra do cineasta gaúcho, autor de curtas-metragens, longas-metragens e programas televisivos, que estão sendo exibidos nas salas do Cinusp no Centro Cultural Camargo Guarnieri, na Cidade Universitária, e no Centro MariAntonia da USP, na região central de São Paulo. É a primeira vez que o Cinusp dedica uma mostra a um único diretor desde novembro de 2016. Naquela ocasião, o homenageado foi o fotógrafo Dib Lutfi, na mostra Dib Lutfi: Fotógrafo e Câmera no Cinema Brasileiro. A mostra também acontece a partir deste sábado, dia 27, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo, até o dia 5. Na Cinemateca, a programação será semelhante, mas com algumas produções diferentes, mais recentes e documentais (disponível neste link).

O diretor Jorge Furtado - Foto: Arquivo pessoal

Nesta sexta-feira, dia 26, às 19 horas, no Centro Cultural Camargo Guarnieri, haverá uma sessão especial com a presença de Furtado, quando quando serão exibidos Anchietanos (1997) e Até a Vista (2011). O primeiro, estrelado por nomes como Andrea Beltrão, Murilo Benício, Bruno Garcia e Marco Nanini, é um episódio da série Comédia da Vida Privada (1995). Na trama, um publicitário acaba tendo que promover a campanha do candidato rival de um amigo de infância. Já a obra mais recente é um curta que comenta as dificuldades da produção de um longa-metragem.

Na Cinemateca, neste sábado, dia 27, às 16 horas, será feito o lançamento do livro homônimo da mostra, também com a presença de Furtado. A obra foi organizada por Wilq Vicente e fará parte da Coleção Cinusp, projeto editorial do Cinema da USP Paulo Emílio, e reúne textos de diferentes autores — incluindo Vicente, que também é responsável pelo texto de apresentação a respeito de Jorge Furtado e de seu trabalho. Em seguida, haverá a exibição do curta Ilha das Flores e do longa Saneamento Básico, o Filme

Cena de "Comédia da Vida Privada: Anchietanos" - Foto: Reprodução/Cinusp
Cena de "Até a Vista" - Foto: Reprodução/Cinusp

Destaques

Jornal da USP conversou com Filipe Oliveira e Guilherme Guedes, estudantes de Audiovisual da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP que complementaram a curadoria da mostra Jorge Furtado: Tudo Isso Aconteceu, Mais ou Menos. Para Oliveira, a Sessão de Curtas dos Anos 80 e a Sessão de Curtas dos Anos 90 merecem atenção, uma vez que a carreira de Furtado começou com os curta-metragens.

Na primeira sessão, serão exibidos Barbosa (1988, com direção conjunta de Ana Luiza Azevedo) – que conta a história de um homem, interpretado por Antônio Fagundes, que volta no tempo para tentar impedir a derrota do Brasil contra o Uruguai na decisão do título da Copa de 1950 -, O Dia em Que Dorival Encarou a Guarda (1986, com direção conjunta de João Pedro Goulart), que narra as aventuras do detento Dorival em busca de tomar um banho, Esta Não é a Sua Vida (1991), obra que explora o documentário em busca de responder se existem pessoas “comuns e desinteressantes”, tendo como base a protagonista, Ilha das Flores (1989), obra mais famosa do cineasta, que narra o caminho de um tomate desde a plantação até um lixão, e Temporal (1984, com direção conjunta de João Pedro Goulart), curta que retrata a divisão familiar por meio de um pai que quer construir uma igreja secreta e de suas filhas, que querem fazer uma festa.

Cena de "O Dia em Que Dorival Encarou a Guarda" - Foto: Reprodução/Cinusp
Cena de "Ilha das Flores" - Foto: Reprodução/Cinusp

Já a segunda sessão traz Ângelo Anda Sumido (1997), que mostra o reencontro de dois velhos amigos em meio à “sensação de aprisionamento” causada pela cidade, em tom de humor, Estrada (1995), estrelado por Pedro Cardoso e Débora Bloch, que faz parte parte do telefilme Felicidade É… (1995) e tem como foco a dicotomia entre dois casais de amigos que vão passar o feriado na serra e um motorista que precisa fazer uma entrega com um caminhão velho e sem freios, A Matadeira (1994), que compõe o telefilme Os Sete Sacramentos de Canudos (1996, com direção conjunta de Joel de Almeida, Otto Guerra, Luís Alberto Pereira, Pola Ribeiro, Ralf Tambke e Sandra Werneck) e narra a Guerra dos Canudos sob a perspectiva de um canhão, O Sanduíche (2000), que faz uso da metalinguagem para apresentar dois casais, um que está se separando e outro que está se conhecendo, e Veja Bem (1994), curta experimental que critica as relações de trabalho e de consumo da sociedade moderna e é guiado por poemas de Carlos Drummond de Andrade e de João Cabral de Melo Neto.

Cena de "Estrada" - Foto: Reprodução/Cinusp
Cena de "O Sanduíche" - Foto: Reprodução/Cinusp

Quanto aos longas-metragens, a recomendação de Oliveira é por Saneamento Básico, o Filme (2007). Estrelado por nomes como Wagner Moura, Camila Pitanga, Lázaro Ramos, Fernanda Torres, o filme conta a história de moradores que se mobilizam para a construção de uma fossa para o tratamento de esgoto em uma cidade, mas se veem enganados quando a líder do movimento descobre que a verba da prefeitura só serve para gravar um vídeo de ficção. A partir daí, eles decidem filmar a história de um monstro que viveria em torno da obra. Guedes, por sua vez, destaca O Homem que Copiava (2003), em que André (Lázaro Ramos), operador de fotocópia, recebe uma copiadora a cores e decide copiar dinheiro para realizar o sonho de ter uma vida melhor e ficar com Sílvia (Leandra Leal), o amor de sua vida. O filme também tem Pedro Cardoso no elenco.

Cena de "Saneamento Básico, o Filme" - Foto: Reprodução/Cinusp

Ele também cita dois filmes mais recentes: Real Beleza (2015) e Rasga Coração (2018). O primeiro traz João (Vladimir Brichta), fotógrafo frustrado que acaba se envolvendo com Anita (Adriana Esteves), mãe de Maria (Vitória Strada), modelo promissora para seu trabalho, enquanto o segundo é uma adaptação da peça de teatro homônima de Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, e faz uma reflexão a respeito de como as pautas socioculturais se desenvolveram ao longo das gerações, trazendo o exemplo de Custódio, um homem que lutou pela revolução em sua juventude, mas que cede ao comodismo com o passar dos anos e acaba se tornando um reacionário.

Cena de "Real Beleza" - Foto: Reprodução/Cinusp
Cena de "Rasga Coração" - Foto: Reprodução/Cinusp

Um diretor, muitos estilos

Para Oliveira e Guedes, a mostra é um meio de perpassar os diferentes estilos de produção, sem se restringir a uma única marca – o que é um objetivo do diretor. “Os filmes mais recentes dele vão mais na direção do drama, mas ele começa um pouco mais na comédia ou no coming of age (gênero que enfatiza o amadurecimento das personagens com a chegada da fase adulta), como em Houve uma Vez Dois Verões (2002) e em Meu Tio Matou um Cara (2004)”, explica Guedes. O primeiro filme narra um encontro de férias que acaba desencadeando uma gravidez, enquanto o segundo traz Duca (Darlan Cunha), um jovem que, em meio a decepções amorosas, decide investigar um caso de assassinato assumido por seu tio Éder (Lázaro Ramos), mas que ele suspeita ter sido autoria de outra pessoa, tendo o racismo e a criminalidade como temas. Nomes como Deborah Secco e Dira Paes também compõem o elenco.

Cena de "Houve uma Vez Dois Verões" - Foto: Reprodução/Cinusp
Cena de "Meu Tio Matou um Cara" - Foto: Reprodução/Cinusp

A mescla de temas também é perceptível nos curtas-metragens, como aponta Guedes. “Nos curtas, tem coisas que flertam mais com o experimental, depois para o narrativo, documentário…Ilha das Flores, por exemplo, é essencialmente um documentário, mas usa muito da linguagem narrativa.” Apesar disso, há traços característicos: “Por exemplo, em O Homem que Copiava, há montagens muito semelhantes às que são feitas em Ilha das Flores. Mas parece que, conforme vão passando os filmes, ele quer se desvencilhar um pouco disso e tentar coisas diferentes”. Oliveira completa e cita AnchietanosEstrada e A Matadeira como obras da carreira televisiva de Furtado.

A ideia de fazer uma retrospectiva da carreira do cineasta vem desde antes da pandemia de covid-19 e foi proposta por Wilq Vicente, que hoje cura e realiza a mostra. A princípio, a mostra seria uma comemoração aos 60 anos de vida do cineasta e aos 30 anos do lançamento de Ilha das Flores. “Aí aconteceu a pandemia e o nome, que seria Jorge Furtado 60 Anos, Ilha das Flores 30, não pôde mais ser usado”, relata Guedes.

Abaixo, o teaser de Jorge Furtado: Tudo Isso Aconteceu, Mais ou Menos. O vídeo foi produzido por meio da técnica de stop-motion.

A mostra Jorge Furtado: Tudo Isso Aconteceu, Mais ou Menos, do Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp), está em cartaz até 5 de maio, em sessões às 16, 18 e 19 horas, nas salas do Cinusp instaladas no Centro Cultural Camargo Guarnieri da USP (Rua do Anfiteatro, 109, Cidade Universitária, em São Paulo) e no Centro MariaAntonia da USP (Rua Maria Antonia, 258/294, Vila Buarque, região central de São Paulo, próximo às estações Higienópolis-Mackenzie e Santa Cecília do metrô). Entrada grátis. A programação completa da mostra e mais informações estão disponíveis no site do Cinusp

A mostra acontece também entre 27 de abril e 5 de maio na Cinemateca Brasileira (Largo Senador Raul Cardoso, 207, Vila Clementino, zona sul de São Paulo). Entrada Grátis. A programação completa da mostra está disponível no site da Cinemateca Brasileira.

*Estagiário sob supervisão de Roberto C. G. Castro
**Estagiário sob supervisão de Moisés Dorado


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