Foto: Rodrigo Kenan

Outubro Negro inicia discussões para “enegrecer” o conhecimento produzido na USP

Iniciativa explora a produção de saberes, cuidados e ativismos negros, além de homenagear a filósofa e ativista Sueli Carneiro; série de eventos é produzida pela Faculdade de Saúde Pública

 06/10/2022 - Publicado há 2 anos     Atualizado: 10/10/2022 às 18:54

Texto: Camilly Rosaboni

Arte: Ana Júlia Maciel

Durante todo o mês de outubro, acontece na USP o Outubro Negro: traçando saberes, cuidados e ativismos negros, promovido pelo Coletivo Negro Carolina Maria de Jesus e o Departamento de Saúde, Ciclos de Vida e Sociedade da Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP. A iniciativa conta com o apoio da Comissão de Cultura e Extensão da FSP e do Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma) da USP. O evento terá palestras, minicursos e rodas de conversa. De acordo com os organizadores, os temas escolhidos são assuntos que estão impactando a sociedade, no momento. É necessário fazer inscrição em cada palestra. A programação completa está no link.

Desde 2018, o Outubro Negro é realizado para discutir sobre as condições de vida e saúde da população negra. Além disso, o evento analisa os efeitos do racismo e da luta antirracista no Brasil. “[É uma forma de] valorizar os saberes dos pesquisadores(as) negros(as), e de pessoas negras de modo geral, que possam contribuir com o nosso espaço e com a nossas vivências enquanto pessoas negras”, diz Melissa Tarrão, integrante do Coletivo negro da FSP. Para 2022, os idealizadores buscam discutir  os saberes, cuidados e ativismos negros e homenagear Sueli Carneiro, filósofa e ativista antirracista.

“É uma forma, também, de trazer um conhecimento que a Universidade como um todo, de forma hegemônica, não discute e não incorpora”, afirma Melissa. “Grande parte do conhecimento produzido na universidade é hegemônico, branco e ocidental. Afinal, por muito tempo, majoritariamente pessoas brancas de uma determinada classe social ocupavam esse espaço. Atualmente, após a inserção de ações afirmativas, esse cenário vem mudando, mas tudo aquilo que não se enquadra no parâmetro branco e ocidental é excluído deste espaço e não é validado. Dessa forma, trazer esses conhecimentos para serem discutidos dentro da Universidade também é uma forma de resistência”, complementa. 

Melissa Tarrão - Foto: Arquivo pessoal

Programação

No dia 13 de outubro, o evento começa com o minicurso Decolonizando a pesquisa acadêmica: uma perspectiva negra e interseccional, que acontece das 17h30 às 20h30. O curso terá como referência as contribuições de Conceição Evaristo, Carolina Maria de Jesus, Patricia Hill Collins, Carla Akotirene, Audre Lorde e Grada Kilomba, escritoras ícones da intelectualidade e da luta pelos direitos das mulheres negras. Na atividade, serão abordados os fundamentos, paradigmas e metodologias que possam ressignificar a pesquisa acadêmica, a partir de uma perspectiva negra e interseccional.

A ministrante do curso será Sulamita Rosa, pesquisadora das relações étnico-raciais e de gênero na Faculdade de Educação (FE) da USP. Sulamita foi apoiada como liderança negra pelo Fundo Baobá, uma organização sem fins lucrativos que reúne recursos no Brasil e no exterior para mobilizar a equidade racial para a população negra. O evento acontece no Ceuma (R. Maria Antonia, 258/294 – Vila Buarque, São Paulo). A inscrição deve ser feita pelo link.

No dia 17 de outubro, das 19 às 21 horas, ocorre a  Epistemologia de terreiro. Durante o evento, haverá um “giro epistemológico” com o objetivo de compreender o terreiro como um espaço de religiosidade, educação, saúde e promoção de saberes ancestrais de matriz africana para reafirmar a existência de corpos e memórias pretos. O convidado para o debate será Sidnei Nogueira, babalorixá*, pensador preto decolonial e doutor em Semiótica e Linguística Geral pela USP. A atividade ocorrerá no Auditório Paula Souza da FSP (Av. Dr. Arnaldo, 715), com inscrição pelo link.

Dia 20 de outubro, das 19 às 21 horas, haverá a Roda de conversa Estéticas e Imaginários Pretos: artes, políticas e saúde. A pauta a ser analisada faz parte de pesquisas sobre a ancestralidade, cultura e cotidiano negros, feitas por Allan da Rosa, doutor em Educação pela USP e professor de cultura afro-brasileira, movimentos políticos e culturais periféricos, e diásporas africanas pela América Latina na Educação de Jovens e Adultos (EJA). O pesquisador questiona o que é estético e o que é político nas artes. O evento será no Ceuma. A inscrição pode ser feita neste link.

O último evento será no dia 24 de outubro, das 19 às 21 horas, com a Roda preta: Intelectualidade e ativismo de Sueli Carneiro. Na atividade, o Coletivo Carolina Maria de Jesus fará uma roda de entrevistas com a própria Sueli Carneiro, que é filósofa, doutora em Educação pela USP e coordenadora executiva do Geledés, uma organização da sociedade civil que se posiciona em defesa de mulheres e negros. “Pensamos que seria interessante valorizar os saberes e a produção, e homenagear alguém que ainda estivesse vivo”, informa Melissa Tarrão. O encerramento será no Auditório Paula Souza da FSP. Para se inscrever, é necessário acessar o link.

O Outubro Negro começou no dia 3, com a apresentação artística Sarau Jogando com Comunidade Cultural Quilombaque e a mesa de debate Raça, classe e território: questões para a saúde mental

Coletivo Negro Carolina Maria de Jesus

Dois eventos importantes marcaram o nascimento do Coletivo Negro Carolina Maria de Jesus na FSP. Em outubro de 2017, a roda de conversa Afirmando a Negritude na FSP e o sarau Pedaços de Fome homenagearam a escritora negra Carolina Maria de Jesus. No ano seguinte, a USP aderiu às cotas em seu vestibular. Segundo os organizadores, foi diante desses dois eventos, juntamente a denúncias de racismo na Universidade, que estudantes de graduação e pós-graduação da FSP enxergaram a necessidade de firmar o coletivo. A intenção do grupo era criar um espaço de resistência, luta antirracista e acolhimento, desde o que chamam de epistemicídio – privação de saberes por pessoas brancas – até a remoção de barreiras visíveis e invisíveis para a comunidade negra da FSP.

O grupo também colabora com a consolidação de uma Comissão Antifraude às Cotas Raciais na FSP, incentivando a criação de mais cotas raciais em programas de bolsas de pesquisa e pós-graduação.

Mais informações: coletivonegrofsp@gmail.com 

*Babalorixá – [Bàbálórìṣà] comumente conhecido como pai de santo, dirigente religioso de determinado terreiro, responsável pelas iniciações, obrigações, pela matrigestão e demais procedimentos religiosos internos e externos. Também conhecido como Pai Sidnei de Xangô, o professor Sidnei Nogueira é coordenador e professor do Instituto Ilê Ará SP – Instituto Livre de Estudos Avançados em Religiões Afro-Brasileiras.


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