Mulheres são maioria entre estudantes de graduação e pós dos cursos de comunicação da USP

Artigo da revista “Organicom” analisa o perfil dos estudantes da USP pelo recorte de gênero e revela predominância feminina na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP

 29/05/2023 - Publicado há 2 anos
Pesquisa da revista Organicom analisa as proporções de gênero nos diferentes grupos que compõem a comunidade universitária – Foto: Amanda Ferreira/LAC

 

A edição de número 40 da Revista Organicom foi publicada em março de 2023 com tom de pioneirismo. Em mais de 18 anos de existência, foi a primeira vez que o periódico abordou como tema a intersecção entre mulheres e a comunicação. De acordo com a pesquisa Mulheres e Homens na USP e na Escola de Comunicação (sic) e Artes, entre 2000 e 2019, publicada no dossiê, quase 55% dos membros da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP eram do gênero feminino em 2019.

A pesquisa analisa as proporções de gênero nos diferentes grupos que compõem a comunidade universitária: estudantes, servidores docentes e servidores técnico-administrativos. O texto indica que, apesar de existir um certo equilíbrio de gênero no corpo discente, a desigualdade na docência é expressiva e perdura ao longo dos anos, tanto na ECA quanto na Universidade. 

A porcentagem de mulheres na ECA em 2019 (55%) representa um crescimento de 1,2% desde 2000. A população feminina da USP também cresceu cerca de 1% neste período, porém, esse aumento não foi suficiente para equilibrar as porcentagens. Em 2019, os homens uspianos ainda somavam 53,2%.

Observando os recortes de vínculos dentro da ECA, é apenas na graduação que o número de mulheres vem subindo: após um crescimento de 5,5%, as graduandas totalizaram quase 58% deste grupo. Tanto na pós-graduação quanto no pós-doutorado, os índices femininos sofreram queda — de 4% e 6%, respectivamente — mas continuaram sendo maioria.

Contudo, a ECA, “assim como o conjunto da USP, trata-se de uma escola altamente masculinizada em seu corpo docente e entre seus servidores técnico-administrativos”, apontam os autores. O desequilíbrio de gênero nesses grupos é bastante significativo e aumentou de 2000 para 2019. A porcentagem de professoras foi de 36% para 34% e a de servidoras variou de 47% para 39%. Apesar da USP ter sofrido quedas e crescimentos de valores diferentes da ECA, os números da Universidade também apontaram para um predomínio massivo de professores e técnicos-administrativos do gênero masculino.

Os dados foram coletados nos Anuários Estatísticos da USP e organizados em gráficos pelo Observatório USP Mulheres. Rodrigo Amaral, Rennan Valeriano e Maria Eduarda Martins, ex-membros do Escritório USP Mulheres — que tiveram suas atividades absorvidas pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) no ano passado — são os autores do projeto e do artigo. No site do observatório, é possível acessar as informações e as estatísticas das outras unidades.

O que os números revelam

Segundo os autores, este artigo pode instigar a realização de novas pesquisas sobre a divisão sexual das carreiras, um discurso presente na esfera familiar, no sistema escolar e no mercado de trabalho, que define quais carreiras são femininas e quais são masculinas. Esses novos estudos poderão “investigar as dinâmicas de reprodução que levaram à concentração de cada gênero em determinadas áreas e à pouca alteração dessa distribuição no curso de 20 anos”, acreditam. 

Já na pós-graduação, o artigo constata uma grande presença feminina. Os números evidenciam o papel da USP para as mulheres como uma possível ferramenta de mobilidade social através do estudo. Por outro lado, os baixos índices de mulheres na docência “confirmam como a mesma universidade frustra o investimento feminino na educação, restringindo o acesso das mulheres ao magistério superior ou, àquelas que conseguem tornar-se docentes, a progressão interna e o acesso às posições de liderança”, afirma o texto.

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A pesquisa ainda apontou que, na Universidade, somente 30,6% das docentes mulheres conseguiram chegar à titularidade ao longo de 20 anos, o que também aumenta a discrepância entre as remunerações masculina e feminina. De acordo com Daniela Verzola Vaz, doutora em Economia citada no artigo, no funcionalismo público são combinadas segregações ocupacionais e hierárquicas. Ou seja, as mulheres tendem a ser concentradas em posições de menor prestígio social e baixa remuneração ou, para aquelas que alcançam cargos de maior prestígio e remuneração, o acesso às funções de liderança é bloqueado.

Analisando as proporções de gênero dos servidores técnico-administrativos na USP, os autores perceberam uma reprodução da divisão sexual do trabalho. Este é um sinal de que esse fenômeno extrapola os limites das salas de aula e se reproduz nas unidades como um todo. O artigo traz como exemplo as históricas presenças majoritárias de homens nas áreas de exatas e de mulheres nas ciências biológicas, tanto entre estudantes e docentes quanto entre funcionários. Além disso, a queda da participação feminina na composição de servidores “permite observar como as mulheres foram as mais afetadas pelas políticas de demissão incentivadas e adotadas em meados da década passada.”

Ecanas na Organicom

Essa edição do periódico apresenta outros dois trabalhos com participação “ecana”. O artigo “Feminismo e Comunicação: uma relação necessária”, escrito pela professora Claudia Lago, do Departamento de Comunicações e Artes (CCA), aborda e incentiva a interseção do campo da comunicação com os estudos feministas e de gênero, de modo que esta relação passe a nortear pesquisas na área.

Além disso, a professora Maria Aparecida Ferrari, do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP), desenvolveu outro artigo, em conjunto com Milene Rocha Lourenço Leitzk, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM) da ECA. O “Guia bibliográfico sobre mulheres e feminismos: novas perspectivas para o campo da comunicação” reúne e comenta uma série de referências especializadas sobre estudos de gênero, mulheres e feminismos, a fim de estimular pesquisas no campo.

Texto de Mariana Zancanelli, do Laboratório Agência de Comunicação (LAC) da ECA


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