Cinema da USP traz obras da televisão para a telona

Em cartaz até o dia 25, nova mostra apresenta produções criadas originalmente para a TV

 05/06/2023 - Publicado há 1 ano

Texto: Emilly Gondim
Arte: Carolina Borin Garcia

Nova mostra do Cinema da USP é composta de produções feitas para a televisão – Foto: Reprodução/Cinusp

Com uma programação voltada para produções feitas para a televisão, a nova mostra do Cinema da USP (Cinusp), Da Telinha pra Telona, segue com sessões até o próximo dia 25. Ressignificando o formato desses filmes, o cinema propõe sessões imersivas, com experiências sensoriais mais sensíveis e de impacto coletivo, diferente da TV em casa, em que se está exposto a interferências externas e a uma relação individual com a produção cinematográfica. “Ainda assim, o cinema não é um espaço de chanceler de validação, obras são feitas para televisão e obras são feitas para o cinema, e não há problema algum nisso”, explica Gabriel Machado Barbosa, curador responsável pela mostra.

E não são somente filmes em longa-metragem que compõem a programação do Cinusp. Boa parte das sessões será composta de seriados.

Uma das produções presentes na mostra é o seriado estadunidense Twin Peaks: o Retorno (2017), de David Lynch. Para transmitir a temporada inteira desse seriado, o Cinusp dividiu os episódios em três partes, sempre nas sessões de sexta-feira. “Os episódios têm uma linguagem muito experimental, estando presente em várias listas de melhores filmes da década, o que é curioso”, diz Barbosa.

Decálogo (1988), de Krzysztof Kieślowski, foi feito para a TV estatal polonesa. O seriado tem dez episódios e cada um deles aborda um dos Dez Mandamentos judaico-cristãos, em histórias independentes. O Cinusp vai transmitir os episódios 5, Não Matarás, e 6, Não Cometerás Adultério, nos dias 15 e 17.

A obra que resume a proposta da programação Da Telinha Pra Telona é Problemas Pessoais (1980), de Bill Gunn, inicialmente filmada como uma telenovela para uma rede de TV dos Estados Unidos. Barbosa observa que “o diretor utilizou aparatos tecnológicos reduzidos, comparado ao cinema, para fazer uma obra visualmente única”. Gunn a descreveu como uma “metanovela” por trazer uma linguagem do  experimentalismo do videotape. Entretanto, não foi televisionada. O diretor decidiu juntar os dois episódios e vender como filme em pequenas sessões. As transmissões da obra na mostra do Cinusp serão nos dias 7 e 20, na sala da Cidade Universitária, e no dia 10, no Centro Maria Antonia.

Gabriel Machado Barbosa - Foto: Arquivo Pessoal

O curador Gabriel Machado Barbosa - Foto: Arquivo pessoal

Já no dia 14, sábado, haverá uma sessão especial, intitulada Senta que Lá Vem Risada e voltada para os programas de comédia do horário da tarde. Terá episódios das primeiras sitcoms de sucesso, I Love Lucy (1951) e Monty Python (1969), acompanhadas de produções contemporâneas, como A Grande Família Atlanta.

Nos dias 20 e 25, serão exibidas sessões de O Mistério Está no Ar, com obras televisivas que apelam para o misterioso e o fantástico, como Twilight Zone (1959) e Doctor Who (1963), que completa 60 anos em 2023.

Outro filme a ser exibido na mostra é O Absolutismo: a Ascensão de Luís XIV (1966), de Roberto Rossellini. Para o curador, o longa representa a “essência” do diretor, que na época passou a produzir filmes visando à televisão, um meio que Rossellini considerava como uma plataforma educacional.

A mostra Da Telinha Pra Telona, do Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp), acontece até 25 de junho na Nova Sala (Rua do Anfiteatro, 109, Cidade Universitária, em São Paulo) e Sala Maria Antonia (Rua Maria Antonia, 294, Vila Buarque, em São Paulo, próximo às estações Higienópolis-Mackenzie e Santa Cecília do Metrô). Entrada grátis. Mais informações e a programação completa da mostra estão disponíveis no site do Cinusp.

Trecho de “O Absolutismo: a Ascensão de Luís XIV”, de Roberto Rossellini, uma das obras apresentadas na nova mostra do Cinema da USP – Vídeo: Reprodução/YouTube

Da televisão para o cinema

As obras audiovisuais são feitas pensadas no formato e no meio de distribuição. Se é para o cinema, os equipamentos de filmagem e equipe normalmente são mais sofisticados. As produções para a televisão são de média duração e repartidas em partes, que são transmitidas ao longo da programação. A linguagem é outra diferença. Conforme o público de cada canal ou finalidade do produto, será empregada uma espécie diferente de linguagem, para atingir o objetivo. É o que explica Gabriel Machado Barbosa, um dos curadores do Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp) e responsável pela mostra Da Telinha Pra Telona.

As produções audiovisuais para a TV são mais rápidas e o estágio de pré e pós-produção tem demandas de tempo diferentes. “Por exemplo, a novela é gravada em uma semana, o episódio é editado em outra e cerca de alguns meses depois está no ar. Longas-metragens levam cerca de um ano para serem transmitidos no cinema”, explica Barbosa.

O curador ressalta as diferenças também na forma de consumir. A televisão e o stream – modelo que entrou em cena há pouco tempo na história do audiovisual – são experiências mais individualistas, com pouca presença de outras pessoas. O espectador também está sujeito a ruídos externos ou a situações que o forcem a pausar a obra.

Cenas de filmes e séries que compõem a mostra "Da Telinha Pra Telona, do Cinema da USP - Imagens: Reprodução/Cinusp

“No cinema você entra em uma sala escura gigante com mais de 30 desconhecidos para ficarem juntos por 1h30 ou mais, sujeito a um comportamento em manada único da sua sessão, num pacto coletivo”, compara o curador.

De todo modo, seja no cinema, seja na televisão, o importante é que as produções sejam transmitidas. “O importante é não deixarmos as obras morrerem. Elas só morrem quando não tem nenhum telespectador para revisitá-las”, conclui.


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