Hibridização em borboleta amazônica permite o surgimento de novas combinações genéticas

Segundo Marcelo Duarte, o processo, raro no reino animal, confirma que a especiação híbrida é um mecanismo viável de diversificação biológica

 Publicado: 11/06/2024
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A nova borboleta se originou através do cruzamento de outras duas espécies ancestrais – Foto: NSG group/Flickr/CC0 1.0
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Na natureza, é comum ver uma espécie originar outras duas ou mais, por meio do isolamento de populações e outros fatores. Contudo, o processo contrário, em que ocorre a hibridização de duas espécies para a formação de uma nova, é um fenômeno raro no reino animal. Em estudo publicado na revista científica Nature, a descoberta de uma nova espécie de borboleta amazônica híbrida, a Heliconius elevatus, foi confirmada.

De acordo com Marcelo Duarte, professor e diretor do Museu de Zoologia (MZ) da Universidade de São Paulo, a nova borboleta, que se originou através do cruzamento de outras duas espécies ancestrais — Heliconius melpomene e Heliconius pardalinus —, mantém uma linhagem evolutiva independente por, pelo menos, 180 mil anos. Dessa forma, a borboleta híbrida coexiste com suas espécies parentais há muito tempo, apesar do período ser considerado curto na escala evolutiva.

Marcelo Duarte – Foto: Arquivo pessoal

A espécie, referente à família Nymphalidae, pertence ao bioma amazônico, ocorrendo, segundo o Sistema de Avaliação do Risco de Extinção da Biodiversidade (Salve) do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), na Guiana Francesa, Guiana, Venezuela, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia e Brasil, com registros nos Estados do Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima. Sem ameaças identificadas que indiquem risco de extinção da espécie no futuro próximo, ela foi categorizada como Menos Preocupante (LC).

O especialista explica que a borboleta possui um fluxo gênico significativo com uma das espécies parentais, a Heliconius pardalinus, a qual uniformiza cerca de 99% de seu genoma. Apesar disso, Duarte afirma que a introgressão de traços específicos de Heliconius melpomene — que representa 1% do seu genoma total — a diferencia significativamente da primeira espécie. “Esses traços incluem o padrão de cores, que é crucial para a camuflagem e a seleção de parceiros, diferenciando-a claramente da Heliconius pardalinus, mas aproximando-a de Heliconius melpomene em aparência.”

No geral, o docente acrescenta que as diferenças genéticas da nova espécie em relação às duas ancestrais incluem padrão de cor das asas, formas das asas, preferências por plantas hospedeiras, feromônios sexuais e escolha de parceiros, o que facilitou sua adaptação e coexistência com as espécies parentais.

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Conforme Duarte, a introgressão de traços adaptativos de uma espécie em outra foi crucial para a diferenciação e sucesso evolutivo da Heliconius elevatus. Ele ainda explica que o processo de hibridização, que permite a combinação de traços adaptativos de duas espécies distintas, pode conduzir à especiação, e complementa: “A hibridização ocorre frequentemente quando há sobreposição geográfica e ecológica significativa entre espécies, permitindo que novas combinações genéticas surjam e sejam testadas pela seleção natural”.

Ele ainda diz que a descoberta da nova borboleta confirma que a especiação híbrida, embora rara, é um mecanismo viável de diversificação biológica, especialmente em ambientes complexos e biodiversos como a Amazônia. “Isso amplia nossa compreensão de como as barreiras reprodutivas podem se desenvolver, mesmo na presença de fluxo gênico significativo, desafiando as visões tradicionais de especiação e destacando a importância de fatores ecológicos e comportamentais na manutenção da diversidade genética e fenotípica”, finaliza.

*Sob supervisão de Paulo Capuzzo e Cinderela Caldeira


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