Entre 28 de julho e 7 de agosto, uma centena de alunos de astronomia em diversos estágios da vida acadêmica se reuniram no Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP para aprender e trocar experiências sobre a formação das primeiras galáxias, estrelas e buracos negros do Universo. Os estudantes e jovens pesquisadores, que vieram de diversos Estados do Brasil e mais de 30 países, participaram da Escola São Paulo de Ciência Avançada Primeira Luz: estrelas, galáxias e buracos negros na época da reionização, evento financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Com duração de quase duas semanas, o evento foi um dos aprovados na chamada da Fapesp para a realização da Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA). As ESPCAs acontecem anualmente desde 2010 e este ano haverá oito delas em diferentes universidades paulistas. Um dos objetivos principais é reunir jovens pesquisadores e especialistas de renome em suas áreas no Brasil e no mundo para tratar de temáticas na fronteira do conhecimento.
Roderik Overzier, pesquisador associado do Observatório Nacional e co-chair da Escola no IAG, observa que o evento é uma forma de beneficiar estudantes que precisariam pagar muito caro para participar de conferências de alto nível no exterior – ao mesmo tempo em que se atrai alunos de outros países para interagir com os daqui. “É uma ótima oportunidade para troca de experiências. Eles aprendem uns com os outros e apresentam sua ciência uns aos outros”, pontua.
Blaine Lomberg, estudante de doutorado na Universidade de Western Cape na África do Sul, disse ter tido suas expectativas superadas e pensa que a participação na ESPCA será bastante útil para o desenvolvimento da sua pesquisa. Ele trabalha com estrelas pobres em metais, que são, provavelmente, as que surgiram primeiro no Universo. “Tanto as temáticas quanto os participantes são muito diversos e acho que fizeram uma boa combinação de tudo – e tenho falado com muita gente com potencial de colaboração.”
A armênia Naira Azatyan concorda. “As palestras foram todas de altíssimo nível e cobriram muitos aspectos em astronomia. E a Escola foi muito importante para ter contato com estudantes de outros lugares”, conta ela, que estuda regiões de formação estelar em seu doutorado no Observatório de Byurakan.
As discussões sobre diferentes aspectos da vida acadêmica que não apenas a parte científica também foram muito bem recebidas. “Havia palestras sobre carreira e divulgação científica e isso foi muito inspirador – às vezes ficamos meio perdidos entre o fim do doutorado e o começo da carreira e fico feliz por terem abordado estas questões”, conta Yun-Hsin Hsu, mestranda no Instituto Academia de Astronomia e Astrofísica de Sinica em Taiwan.
Houve um esforço ativo no sentido de conferir diversidade ao evento. Segundo Overzier, além da diversidade entre alunos – metade brasileira, metade estrangeira –, os palestrantes foram selecionados levando em conta o equilíbrio de gênero e de idades para além de sua expertise em astronomia.
Para o professor Laerte Sodré Júnior, responsável pelo evento, a Escola foi importante para ampliar o conhecimento de astrônomos no estudo da formação das primeiras estrelas e galáxias. “Queríamos organizar uma Escola neste tema há tempos, especialmente por conta do GMT (Telescópio Gigante de Magalhães), que, quando entrar em operação, nos ajudará a entender melhor o passado do Universo.”
Formação do Universo
A Época da Reionização (EoR, na sigla em inglês) é uma época cósmica importante, mas ainda pouco explorada, que começou logo após a chamada inflação (as “idades escuras” cósmicas) e terminou com a reionização completa do espaço intergaláctico cerca de 1 bilhão de anos após o Big Bang.
Ionização é o processo por meio do qual um átomo ou uma molécula perde ou ganha elétrons para formar íons, deixando de ser neutros. Desde a era cosmológica da recombinação, em que prótons e elétrons se combinaram para formar hidrogênio pela primeira vez (várias centenas de milhares de anos depois do Big Bang), o meio intergaláctico era quase inteiramente composto de hidrogênio neutro. Durante a EoR, o meio intergaláctico neutro passou de completamente neutro para largamente ionizado.
A ionização do hidrogênio neutro requer fótons com comprimentos de onda menores, que foram produzidos pelas primeiras estrelas e galáxias e, provavelmente em menor extensão, pela radiação dos primeiros buracos negros ativos. Assim, a EoR é também a época em que encontramos as primeiras estrelas, galáxias e buracos negros que se formaram no Universo. Espera-se que alguma fração desses primeiros objetos esteja por volta de hoje, por exemplo, na forma de estrelas pobres em metal galáctico ou na forma de satélites anões da Via Láctea. O restante, no entanto, foi incorporado a objetos maiores (galáxias e buracos negros) ou reprocessado pela geração futura de estrelas. Uma compreensão adequada da EoR é, portanto, importante para entender a história da formação da maioria dos objetos no Universo.
A astrofísica que envolve a EoR é também um dos principais impulsionadores científicos da nova instrumentação atualmente em desenvolvimento, em projetos como o Low-frequency Array (Lofar), o Murchison Wide-Field Array (MWA), o Subaru HyperSuprimeCam (HSC) e o Prime Focus Spectrograph (PFS), Telescópio Espacial James Webb (JWST), o Telescópio Gigante de Magalhães (GMT), o Telescópio de Trinta Metros (TMT), o Extremely Large Telescope (ELT) e o Square Kilometre Array (SKA).
Por Meghie Rodrigues, jornalista do GMTBrO – Telescópio Gigante de Magalhães