O trabalho de matemáticos em um campo de estudos emergente, chamado sistemas dinâmicos, tem ajudado engenheiros a entender melhor efeitos como a vibração em uma ponte ao longo do tempo ou a relação entre o petróleo obtido de águas profundas e os dutos marítimos pelos quais percorre até chegar à superfície, por exemplo. Dessa forma, tem permitido projetar estruturas mais bem adaptadas a fenômenos que podem ocorrer durante o funcionamento.
Alguns dos principais pesquisadores dessa área relativamente nova da matemática estiveram reunidos, entre os dias 29 de julho e 9 de agosto, na São Paulo School of Advanced Science on Nonlinear Dynamics, na Escola Politécnica (Poli) da USP.
Durante o encontro, realizado com apoio da Fapesp, por meio do programa Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA), foi abordada a aplicação de modelagem matemática em sistemas dinâmicos na engenharia mecânica – que inclui a civil, mecatrônica, naval e oceânica – e elétrica.
A Escola reuniu professores do Brasil e do exterior e 120 participantes, entre estudantes de doutorado e jovens pesquisadores de 30 países. “A ideia da Escola foi mostrar como a modelagem matemática em sistemas dinâmicos pode ser aplicada para tentar solucionar problemas de engenharia ou para desenvolver estruturas e componentes que apresentem determinados comportamentos físicos desejados em certas aplicações”, disse José Roberto Castilho Piqueira, professor da Poli e coordenador da Escola, à Agência Fapesp.
De acordo com Piqueira, o campo dos sistemas dinâmicos estuda fenômenos que evoluem ao longo do tempo, como o clima, as epidemias, as reações químicas e os sistemas planetários.
Ao serem modelados por matemáticos, por meio de equações diferenciais, é possível prever comportamentos que podem perturbar a estabilidade estrutural desses sistemas. “Essa área da matemática, que foi iniciada pelo matemático francês Henri Poincaré [1854-1912] há mais de cem anos, teve muito sucesso no Brasil”, disse Piqueira. “O professor Maurício Peixoto, do Impa [Instituto de Matemática Pura e Aplicada], que faleceu em abril, iniciou os estudos nessa área no Brasil, em que o país passou a ter uma grande tradição. O matemático brasileiro Artur Avila [ganhador, em 2014, da Medalha Fields, a máxima distinção na matemática] fez importantes descobertas nesse campo”, afirmou.
Entre as décadas de 1970 e 1980, descobriu-se que, além de sistemas dinâmicos lineares, também há outros não lineares, que podem apresentar comportamentos caóticos passíveis de serem previstos se suas condições iniciais forem perfeitamente conhecidas.
Alguns exemplos desses sistemas dinâmicos não lineares na engenharia são estruturas de construção civil, como pontes, além de circuitos transistorizados e diodos, na microeletrônica, e fluidos que se relacionam com as estruturas pelas quais escoam.
Em um duto para exploração de petróleo em águas profundas, por exemplo, há relações entre o fluido e a estrutura pela qual passa, que são descritíveis por dinâmicas não lineares. Se essas dinâmicas forem simplificadas e tratadas como lineares, vão emergir fenômenos inesperados durante o funcionamento dessas estruturas, que poderiam ter sido previstos, explicou Piqueira. “Isso acontece também em estruturas de engenharia civil que apresentam fenômenos, como vibrações mecânicas em diferentes frequências”, exemplificou.
Controle de dispersão
Na área de dinâmica de fluidos, o trabalho feito nos últimos anos pelo matemático Roberto Camassa, pesquisador da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, nos Estados Unidos, e um dos professores da Escola, ajudou a explicar como a forma de um tubo afeta o espalhamento de partículas transportadas por um fluido ao longo da direção do fluxo.
Os pesquisadores observaram durante o estudo, publicado em 2016 na revista Science, que tubos circulares e elípticos causam uma distribuição simétrica das partículas ao longo da direção do fluxo. Já os tubos retangulares geram uma assimetria.
Para chegar a essas conclusões, Camassa e seus colaboradores fizeram uma série de equações e simulações computacionais para estudar a distribuição de um corante em uma variedade de formas de tubos.
Pelos cálculos dos pesquisadores, as partículas do corante seriam arrastadas pelo fluido, mas a velocidades diferentes, dependendo de suas posições, e o fluxo seria mais rápido no centro dos tubos do que na área próxima de suas paredes.
As simulações mostraram que o controle da dispersão reside unicamente na relação entre a largura e a altura de um tubo, e não nas propriedades do fluido ou de um produto químico nele dissolvido.
Um soluto viajando por um cano com um diâmetro estreito, por exemplo, bombeia seu alvo rapidamente, mas, se a mesma solução passar por um cano com um diâmetro largo, o soluto escoa lentamente até o alvo.
“Esse é um dos princípios universais da natureza que governam a forma da dispersão de solutos e pode ser usado para otimizar os resultados em muitas indústrias que lidam com produtos químicos dissolvidos em fluxos de fluidos”, disse Camassa.
Algumas das áreas que poderiam se beneficiar das descobertas são as de química medicinal e gestão ambiental, nas quais o controle da dispersão de fármacos, substâncias químicas ou poluentes ao se aproximar do destino final é um fator crítico para otimizar o efeito esperado, indicou o pesquisador.
Elton Alisson / Agência Fapesp
Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.