Um levantamento da Confederação Nacional de Municípios revela que cerca de 11 milhões de pessoas foram afetadas pelas queimadas em municípios que decretaram situação de emergência. O número de incêndios é o maior desde 2007, afetando 538 municípios em todo o País. Patrícia Faga Iglecias Lemos, superintendente de Gestão Ambiental e professora do Departamento de Direito Civil da Faculdade de Direito, ambos da Universidade de São Paulo, destaca a gravidade do problema e a necessidade urgente de medidas preventivas e punições mais severas para conter os crimes ambientais.
Segundo a especialista, o Brasil já possui uma legislação robusta, como a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, a Lei de Crimes Ambientais e o Código Florestal, que prevê punições para quem provocar incêndios. No entanto, a falha está na aplicação dessas normas. A pena para quem causa incêndios, entre dois a quatro anos de prisão, é considerada insuficiente e raramente aplicada, o que favorece a reincidência de crimes ambientais.
Motivos das queimadas reincidentes
Apesar da crise climática, global e crescente também contribuir para o agravamento das queimadas, a maioria dos focos de incêndio é intencional, aproveitando-se de condições ambientais desfavoráveis, como a seca e altas temperaturas. De acordo com Patrícia, a impunidade para esses crimes, combinada com a baixa fiscalização, favorece a perpetuação das queimadas. Para além das punições, a docente enfatiza a importância das ações de prevenção. Em Estados como São Paulo, a Operação Corta-Fogo é um exemplo de planejamento eficaz para reduzir o impacto dos incêndios, atuando meses antes do período seco. A operação envolve a Polícia Ambiental, os municípios e até a Defesa Civil, visando a prevenir que as queimadas atinjam maiores proporções. Entretanto, essas ações preventivas devem ser amplamente replicadas em outras regiões do Brasil.
Outro sistema de prevenção seria o uso de “aceiros” — faixas de terreno sem vegetação — para impedir que o fogo avance entre as áreas agrícolas ou florestais. Mas a professora destaca que, em muitos casos, o tempo de detecção dos incêndios pelos sistemas de monitoramento ainda é insuficiente: “Uma outra coisa que também acaba atrapalhando é que os próprios radares, o sistema do Inpe e tudo mais, leva um tempo para identificar o incêndio, o que também contribui para que o incêndio tome proporções maiores, porque na hora de atacar na resposta vai levar um tempo maior para verificar se o incêndio está acontecendo”.
Outro fator importante é a articulação entre os entes federativos, desde o governo federal até os municípios. “São muitos fatores. Na questão ambiental, a gestão dos períodos de crise, das questões hídricas e do período seco precisa ter um planejamento maior. Isso integra tanto o governo federal e os seus órgãos, o próprio Ibama, mas também os governos estaduais, por meio das suas Secretarias, e os municípios que precisam estar integrados. Então a Defesa Civil é planejada no nível estadual, mas nós vamos ter pontos de Defesa Civil nos municípios que vão auxiliar em todas essas situações”, complementa.
Ela ainda conclui: “Eu só queria fazer um último reforço, que é também o papel da academia, porque nós temos pesquisadores e dados que podem ser aproveitados pelos governos e essa composição, que inclusive está prevista no ODS 17 da ONU, que são as parcerias entre o público, o privado e a academia. Como professora da USP, eu não posso deixar de reforçar que nós temos muitos pesquisadores trabalhando com essas temáticas e que podem auxiliar naquilo que os governos estão planejando”.
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