Mestres de capoeira discutem a difusão de saberes populares na educação

Eventos na USP reúnem especialistas para discutir criticamente a regulamentação, profissionalização e esportivização da capoeira, seguindo pontos de vista distintos, além de aprimorar a formação de mestres e capoeiristas no ensino do esporte

 14/07/2023 - Publicado há 1 ano     Atualizado: 19/06/2024 às 16:24

Texto: Camilly Rosaboni (estagiária)*

Arte: Simone Gomes

Foto: Roger Cipó via Flickr – CC

Neste mês de julho, a USP recebe dois grandes eventos que discutem a capoeira como ferramenta de trabalho e educação. As ações questionam e debatem o ensino de capoeira nas escolas e a relação social e cultural do esporte com a formação do Brasil, além de apresentar estratégias para a diversidade de gênero e inclusão de pessoas com deficiência.

Nos dias 22, das 8 às 12 horas, e 23, das 9 às 17 horas, o Centro de Práticas Esportivas (CEPE) da USP promoverá o Fórum Social Nacional de Capoeira. Para participar, basta se inscrever no site do CEPE até o dia 20 e ter idade mínima de 18 anos. No dia 29, das 9 às 14 horas, haverá o Fórum de Capoeira e Educação, presencialmente na Faculdade de Educação (FE) da USP, e on-line pelo canal de youtube da Faculdade. Não é necessário se inscrever para participar.

Fórum Social Nacional de Capoeira

 

Fórum Social Nacional de Capoeira acontece anualmente, desde 2016, buscando ampliar os conhecimentos sobre a capoeira, para além da atividade física. “Nós, capoeiras e angoleiros, pretendemos abordar suas questões políticas e históricas, por exemplo, a formação da capoeira pela classe negra trabalhadora no Brasil e sua relação com o racismo e aspectos de gênero”, afirma Womualy Omowale Gonzaga dos Santos, professor e mestre de capoeira do CEPE e integrante da Secretaria de Negras Negros e combate ao Racismo do Sindicato dos Trabalhadores da USP (SINTUSP).

Womualy Omowale Gonzaga dos Santos - Foto: Arquivo Pessoal
Womualy Omowale Gonzaga dos Santos - Foto: Arquivo Pessoal

Ao Jornal da USP, Omowale fala sobre a transição entre os modos de conduzir a capoeira. “Essa expressão cultural foi formada pela classe trabalhadora no Brasil, como ato de resistência ao sistema escravocrata. Mas, com a passagem para o regime capitalista, ela também se torna uma forma de trabalho, com a possibilidade de capoeiristas darem aulas”. 

O professor do CEPE ressalta a importância de se discutir condições dignas de trabalho que se distanciem da precarização. “Uma grande diferença entre os dois sistemas econômicos é que o escravista deixava visível a exploração total do trabalho e do corpo do escravizado, mas o capitalista permite uma falsa sensação de pagamento pelo trabalho realizado, sem saber que a remuneração é feita apenas parcialmente”, explica Omowale. “É importante criticarmos, enquanto angoleiros, sobre a esportivização, profissionalização, regulamentação da profissão de capoeirista e a capoeira-esporte-espetáculo nas olimpíadas, assim como refletir o papel do Estado quando se pensa o acesso aos editais de financiamento e incentivo”, complementa ele. 

As atividades do fórum foram pensadas em conjunto com o coletivo Capoeira Angola Nkodya, sob responsabilidade de Lara Lombardi, farmacêutica toxicologista pela USP, juntamente com Omowale. O grupo misto é formado majoritariamente por mulheres e tem um olhar especialmente voltado para a diversidade e inclusão de pessoas na capoeira. “Nós buscamos formas de subverter o lugar historicamente colocado, colaborando para a participação de mais mulheres e pessoas da comunidade LGBTQIAPN+ na capoeira, além de criar espaços de acolhimento com atividades para que os filhos dessas pessoas também possam se integrar”, afirma Lara. “Geralmente, as mulheres são as que mais abandonam a prática da capoeira quando engravidam, por falta de políticas públicas como creches, restaurantes públicos, lavanderias, políticas de emprego e renda”, reforça Omowale.

O coletivo oferece treinos de capoeira e oficinas de instrumentos. Além disso, realiza grupos de estudos sobre questões de gênero, raça e aspectos de classe na história e formação social da capoeira, como parte do Núcleo de estudos de trabalho,gênero e raça/etnia (NEGREM), em uma junção de experiências entre USP, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO) e Universidade Federal Fluminense (UFF).

O grupo Capoeira Angola Nkodya realiza suas atividades no vão do Bloco G, do Instituto de Psicologia da USP, às segundas e quartas-feiras, das 18 horas às 19h30, e aos sábados a partir das 10 horas.

Atividades do Grupo de Capoeira Angola Nkodya – Foto: Lara Lombardi.

Programação

No dia 22, o Fórum Social Nacional de Capoeira se inicia às 9 horas, com a Oficina de Capoeira Angola, ministrada pela Mestra Gege Poggi do grupo Capoeira Angola Aluandê/Florescer-BA. “Como existe uma predominância de homens no ensino de capoeira, nós optamos especialmente por colocar uma mestra dando a aula de capoeira”, afirma Lara.

No dia seguinte, das 9 às 12 horas, haverá a primeira mesa de debate, denominada  História da Capoeira: Da formação e criminalização (século 19) à miragem do empreendedorismo – visões antigas e atuais sobre a Capoeira, que vai tratar da formação sócio-histórico-cultural da capoeira no Brasil. 

Lara Lombardi - Foto: Arquivo  pessoal
Lara Lombardi - Foto: Arquivo pessoal

 

Depois, das 14 às 17 horas, ocorrerá a segunda roda de debate, intitulada Histórico e Atualização para o Combate das Lutas Contra Opressão e Exploração no Brasil: O que a formação das classes trabalhadoras oprimidas podem dialogar com a Capoeira?. “Nessa mesa, teremos a participação da professora e pesquisadora Terezinha Martins dos Santos Souza, uma grande feminista com importantes discussões sobre gênero e raça”, conta Lara.

A programação completa, com a descrição dos participantes das mesas de debate, está disponível neste link e também na ilustração a seguir.

Programação – Arte: CEPEUSP

Fórum de Capoeira e Educação

Fórum de Capoeira e Educação pretende apresentar o andamento do processo legislativo da Lei 17.566, de 8 de junho de 2021, que defende o ensino de capoeira nas escolas, a partir do reconhecimento do caráter educacional e formativo em suas manifestações culturais e esportivas. “Nós queremos reunir lideranças da capoeira para discutir sobre a regulamentação dessa lei”, afirma Valdenor Silva dos Santos, mestre de capoeira, eleito Presidente da Confederação de Capoeira Desporto do Brasil (CCDB) e pesquisador do programa Diversitas, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. O fórum será realizado pela Federação Paulista de Capoeira, em parceria com a FE.

De acordo com os organizadores, trata-se de um espaço para reunir diferentes atores culturais, sociais e políticos para o diálogo e reflexão de pautas emergentes, como a capoeira na educação. “O fórum servirá para registrar vozes que clamam por políticas públicas, a fim de ampliar a capoeira para os mais diferentes espaços nas suas múltiplas dimensões sociais”, afirmam eles. 

 

Ao Jornal da USP, Mestre Valdenor explica a importância de trazer discussões sobre a capoeira para a Universidade. “Cada vez mais se faz necessário trazer debates para a academia que possibilitem alcançar uma visão mais completa e atualizada do contexto de organização da nossa arte/luta, e das suas contribuições para os segmentos da cultura, educação e inclusão social, combate ao racismo, preconceitos e discriminações”, afirma. “Levando ainda em consideração a importância da capoeira para a história social, cultural e política de nosso povo, essas reflexões enriquecem os conhecimentos de ambas as partes”, complementa ele.

Valdenor Silva dos Santos - Foto: Cecília Bastos/USP

Programação

Nas mesas de debate, os participantes vão discutir a preparação de mestres ao utilizar a capoeira como ferramenta de trabalho. “A lei em questão abre espaço para que capoeiristas trabalhem com a capoeira como esporte e na educação. Então, é necessário formar essas pessoas para que elas cheguem às escolas e clubes melhor preparadas para ampliar as oportunidades no mercado de trabalho, na divulgação da capoeira e valorização desta arte ancestral, que se apresenta como esporte”, explica ele.

No dia 29 de julho, às 9 horas, o evento se inicia com uma abertura institucional. Às 10 horas, haverá a discussão do tema Capoeira e Educação: novos olhares sobre a capoeira no contexto escolar. Em seguida, acontecerá o debate Capoeira na escola, atual conjuntura política e a Lei 17566/ 2021: caminhos para a regulamentação?.

Depois do intervalo, às 11h30, o evento segue com a mesa de debate Capoeira e Desporto: perspectivas da capoeira desportiva e seus aspectos formativos. Em seguida, às 12 horas, haverá a discussão sobre Capoeira e Inclusão: a capoeira e as políticas públicas para PCD.

O fórum será finalizado com as mesas de debate As experiências de Workshops de Capoeira no Brasil, às 12h30, e Capoeira Emergente do século 21 e Cultura de Paz, às 13 horas, seguida da roda de encerramento.

A programação completa, com os participantes de cada mesa de debate, pode ser vista no link e também nas ilustrações a seguir.

Fonte de divulgação  – FE

Serviços:

Fórum Social Nacional de Capoeira

Dia 22 de julho, das 8 às 12 horas
Dia 23 de julho, das 9 às 17 horas

No Salão Multiuso do Centro de Práticas Esportivas da USP:  Praça Prof. Rubião Meira, 61 – Cidade Universitária, São Paulo

Fórum de Capoeira e Educação

Dia 29 de julho, das 9 às 14 horas

No Auditório da Faculdade de Educação, no Bloco B: Avenida da Universidade, 308 – Cidade Universitária, São Paulo 

E on-line pelo link

Mais informações: eventoscepe@usp.br / apoioacadfe@usp.br 

* Sob orientação de Tabita Said


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