Especialistas discutem as relações entre cinema e psicanálise

Colóquio acontece nos dias 16 e 23 deste mês, às 14 horas, com transmissão pelo Facebook

 11/11/2020 - Publicado há 4 anos
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Montagem com câmera e rolos de filme – Foto: Pixabay

O cheiro de pipoca, o silêncio do ambiente, sentado em uma sala escura e vidrado na grande tela. A história se desenrola, a música gera expectativa, é quase possível esquecer a realidade. Você já se sentiu tão envolvido pela experiência do cinema que poderia jurar que estava sonhando ou vivendo dentro daquele universo? É exatamente sobre isso que professores do Instituto de Psicologia (IP) e da Escola de Comunicações e Artes (ECA), ambos da USP, vão discutir no Colóquio Psicanálise e Cinema: os Sonhos, os Chistes e a Fabulação, nos dias 16 e 23 de novembro, das 14 às 17 horas, com transmissão ao vivo pela página do Laboratório de Pesquisas e Intervenções em Psicanálise (Psia) do Instituto de Psicologia no Facebook. O evento é também uma disciplina de pós-graduação, em que podem se inscrever pós-graduandos da USP em qualquer área do conhecimento.

Renato Tardivo, professor do Instituto de Psicologia da USP e um dos coordenadores do colóquio – Foto: Arquivo Pessoal

O colóquio tratará da psicologia como uma das chaves de leitura do cinema e das maneiras como esses campos se sobrepõem. O evento contará com duas mesas de debates. A primeira, no dia 16, com o tema Os Sonhos, os Chistes e o Cinema, terá a mediação de Fernanda Fazzio, do Psia, e a participação dos professores Daniel Kupperman, do Instituto de Psicologia da USP, e Tales Ab’Sáber, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A outra mesa de debates, no dia 23, abordará o tema Personagens Reais em Eduardo Coutinho e na Clínica Psicanalítica, com o professor do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão da ECA Ismail Xavier e o professor Renato Tardivo, professor do Instituto de Psicologia e um dos coordenadores do evento.

Segundo Tardivo, a temática do evento foi inspirada no seu trabalho de pós-doutorado, que abordou as conexões entre a obra do cineasta Eduardo Coutinho (1933-2014) e a psicanálise. Ele afirma que há uma série de paralelos que podem ser feitos entre a psicologia e o cinema, que surgem aproximadamente no mesmo período, no final do século 19. Conceitos da psicanálise como a sublimação, a fabulação e o humor são frequentes nos filmes, exemplifica. Tardivo cita ainda os filmes surrealistas do diretor norte-americano David Lynch, que exploram uma dimensão onírica, como ilustrativo da psicanálise. 

O professor Ismail Xavier, da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP – Foto: Elaine Ramos

Para o professor Ismail Xavier, o Surrealismo dos anos 1920 é justamente uma das correntes da história do cinema que escancaram elementos da psicologia. “É um movimento importante porque, em vez de contar histórias que procuravam ser realistas e que tinham verossimilhança, fazia com que as personagens atuassem como se estivessem dando livre manifestação aos seus impulsos mais variados”, afirma Xavier, utilizando como exemplo o filme Um Cão Andaluz, em que os desejos são expressos nas ações e representam o inconsciente de forma livre, sem censura. Segundo ele, alguns gêneros cinematográficos o melodrama, por exemplo admitem mais possibilidades de análise. 

Xavier afirma que a psicanálise não é apenas um método de leitura do cinema, mas também um auxílio para a compreensão das emoções do espectador e sua interação com o filme. Ele conta que a experiência cinematográfica pode se assemelhar às experiências mentais em que narrativas são desenroladas, como os sonhos e devaneios. Nos anos 60, na França, destaca o professor, críticos teóricos como Christian Metz, sob influência do psicanalista Jacques Lacan,  passaram a trabalhar a psicanálise no ambiente do cinema. Metz discorre sobre a relação do espectador com a experiência de ir ao cinema, colocando-a em paralelo ao sonho. 

“O sonho também é cinematográfico, porque também é imagem, possivelmente é som, eles compõem uma narrativa importante que tem um efeito sobre nós”, diz Xavier. Por outro lado, Metz diferencia a vivência do cinema dos sonhos em alguns aspectos: no caso do sonho, tudo o que temos como experiência é aquilo que está sendo produzido no nosso subconsciente – por nós e para nós –, enquanto aquilo que vemos durante o filme não é uma alucinação, é uma impressão de realidade, acrescenta o professor.

Outra diferença está no impacto gerado pelas duas experiências. Mesmo sabendo que está diante de um filme, o espectador pode ter reações intensas aos acontecimentos. Para Xavier, isso acontece porque as imagens possuem força e se aproximam da realidade. Mesmo assim, estas são elementos externos, que geram menos impacto do que os aspectos trazidos em um sonho, próprios do indivíduo. 

Tanto Xavier quanto Tardivo ressaltam a existência de limites da conexão entre psicanálise e cinema. Para Xavier, o artista não deve tentar “pintar uma teoria”. A psicanálise não deve servir como base para ilustrar a teoria, deve ser um instrumento de análise. Ele afirma que o principal objetivo deve ser construir histórias, sem se preocupar com as ferramentas que serão utilizadas para a análise. Para Tardivo, por mais que a psicanálise possa causar um efeito positivo no público e levar o espectador a fazer conexões entre o filme e sua própria vida, não se deve procurar elementos da psicologia de maneira excessiva e deixar de perceber outras dimensões da obra.

O Colóquio Psicanálise e Cinema: os Sonhos, os Chistes e a Fabulação será realizado nos dias 16 e 23 de novembro, das 14 às 17 horas, com transmissão ao vivo pela página do Laboratório de Pesquisas e Intervenções em Psicanálise (Psia) do Instituto de Psicologia no Facebook. Grátis. Alunos da pós-graduação da USP podem se matricular através do e-mail cpgip@usp.br (disciplina PSC6049).


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