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Os resultados da pesquisa indicam que os programas com alguma base teórica consolidada são cerca de cinco vezes mais eficazes do que intervenções sem uma base teórica estabelecida - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Recuperação de jovens em conflito com a lei é mais eficaz e barata quando embasada pela ciência
Estudo de pesquisadoras do campus de Ribeirão Preto da USP mostra que a redução da reincidência infracional juvenil exige intervenção com bases teóricas, diminuindo custos para o Estado
Programas socioeducativos para adolescentes em conflito com a lei embasados em evidências científicas geram redução de custos para o setor público e permitem uma real oportunidade de reinserção social. A conclusão é de um estudo sobre a eficácia de programas de intervenção na reincidência infracional de adolescentes realizado por pesquisadoras da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP.
Segundo a pesquisadora Lyara Correa Guimarães, que trabalhou sob orientação da professora Marina Rezende Bazon, da FFCLRP, os resultados de seu estudo indicam que os programas com alguma base teórica consolidada são “cerca de cinco vezes mais eficazes do que intervenções sem uma base teórica estabelecida”. O fato preocupa as pesquisadoras pelos “ainda escassos” conhecimentos científicos na área no Brasil.
Na primeira etapa da pesquisa de doutorado, Lyara realizou uma análise a partir de uma revisão sistemática da literatura científica já produzida sobre o tema que comprova a efetividade dos programas de intervenção apresentados. O estudo ainda está em andamento, mas os resultados parciais indicam que, para a efetividade das políticas públicas na área, as evidências fundamentadas na literatura científica devem ser consideradas.
Lyara afirma que os investimentos iniciais em programas socioeducativos realmente eficazes podem reduzir custos posteriores para o Estado. “O que a gente verifica é que o investimento em programas para adolescentes infratores que sejam, de fato, baseados em evidências científicas representa uma economia de até 10 vezes o valor inicial investido”, conta a doutoranda, informando ainda ser fundamental o oferecimento de “oportunidade de muita qualidade para esses jovens”, que precisam de um desenvolvimento pleno e integral para posterior retribuição à sociedade.
Foto: Reprodução/Facebook
A busca por um melhor programa de intervenção, garantem as pesquisadoras, não deve deixar de lado o contexto em que essas intervenções acontecem. Elas observam que, embora não tenha sido encontrada uma diferença significativa sobre o impacto na reincidência juvenil, o programa ocorrido em meio aberto é mais indicado que as internações, mesmo com restrição de alguns direitos e exigência de acompanhamento de uma equipe técnica. Porém, alertam, necessita considerar aspectos como a qualidade, a duração e o foco da intervenção.
Lyara aponta que as intervenções baseadas no aconselhamento, no treino de habilidades e na oferta de diferentes serviços para o desenvolvimento desses jovens reduziram a reincidência das infrações. A pesquisadora lembra ainda que as “intervenções com base terapêutica e de promoção do desenvolvimento são eficazes”, com destaque para a terapia cognitivo-comportamental.
Os próximos passos das pesquisadoras são identificar, descrever e analisar as concepções de profissionais que atuam na execução de medidas socioeducativas sobre as práticas educativas que realizam e quais aspectos consideram relevantes para a implementação de intervenções eficazes.
Foto: Reprodução/Pixabay
Escassez de dados
De acordo com estudo do Conselho Nacional de Justiça, são altos os índices brasileiros de reentrada dos jovens no sistema de justiça. Entre 2015 e 2019, “23,9% dos adolescentes que haviam sido submetidos a uma medida socioeducativa retornaram ao sistema pelo menos uma vez”, conta Lyara, lembrando da sub-representação dos dados oficiais.
A professora explica que o Brasil sofre com “uma lacuna entre aquilo que se pensa e aquilo que se faz como prática” e o conhecimento científico que já vem sendo produzido há muitos anos. E os resultados que agora elas divulgam oferecem novos elementos para que mudanças aconteçam “na direção de uma prática baseada em evidências científicas”, conclui a professora.
Ouça a entrevista das pesquisadoras no link abaixo:
Mais informações: e-mails mbazon@ffclrp.usp.br, com Marina Rezende Bazon, e lyaracorreiag@gmail.com, com Lyara Correa Guimarães
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