Uma tese de doutorado realizada na Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP avaliou, pela primeira vez, a relação entre cárie dentária em crianças em idade pré-escolar no Brasil e o alfabetismo em saúde bucal de pais e cuidadores. Alfabetismo em Saúde Bucal (ASB) é definido como a capacidade que as pessoas têm de obter acesso, compreender e usar a informação para promover e manter a boa saúde da boca. Os resultados mostraram que a doença foi mais prevalente em crianças entre três e quatro anos de idade e entre aquelas com um ou mais irmãos. A dimensão da recompensa (oferecimentos dados pelos pais aos filhos após a realização de uma refeição saudável, como comida favorita, brinquedos e atividades especiais) associou-se diretamente à severidade da doença.
“Até onde sabemos, nenhum estudo havia avaliado se o baixo nível de alfabetismo em saúde bucal de pais ou cuidadores poderia contribuir para comportamentos inadequados durante as refeições de seus filhos”, relata a dentista Sofia Maito ao Jornal da USP.
Para chegar aos resultados, Sofia fez um estudo transversal (tipo de pesquisa observacional voltada para a análise de dados de diferentes variáveis de uma determinada população amostral, coletados ao longo de um período de tempo) com crianças de dois a quatro anos de idade durante a Campanha Nacional de Vacinação, em setembro de 2017, em todas as Unidades Básicas de Saúde localizadas em Diadema, São Paulo. O exame de 630 crianças avaliou a prevalência de cárie nesta população.
Os pais também foram entrevistados para obter outras informações, tais como condições sociodemográficas, idade, número de irmãos e aglomeração domiciliar, além dos hábitos de saúde bucal, comportamento durante as refeições e o nível de ASB.
A maioria das crianças era do sexo masculino (52%), 70% delas frequentavam a escola e 81% escovavam os dentes duas ou mais vezes por dia.
As análises também mostraram que a Qualidade de Vida Relacionada à Saúde Bucal (QVRSB) das crianças não foi associada ao ASB, mas a cárie dentária teve impacto negativo neste tópico. O impacto positivo na qualidade de vida foi associado ao número de irmãos, e a maior idade da mãe foi fator importante para reduzir o impacto na QVRSB.
A pesquisa de Sofia deu origem a um artigo publicados na revista Health and Quality of Life Outcomes.
Literatura sobre o tema
Em sua dissertação de mestrado, Sofia já havia estudado a relação entre cárie dentária em crianças e defeitos no esmalte do dente, condição econômica e peso ao nascer. “Por isso, eu já estava um pouco mais familiarizada com a área de odontopediatria e sempre me interessei por temas relacionados às desigualdades sociais e seu impacto na saúde geral e bucal”, diz Sofia ao Jornal da USP.
No doutorado, Sofia quis investigar de que forma o pouco conhecimento em saúde bucal poderia influenciar a ocorrência de cárie e a pior qualidade de vida em crianças em fase pré-escolar.
“Outra hipótese a ser investigada era a de que piores comportamentos dos pais durante as refeições dos seus filhos estariam associados a uma maior ocorrência de cárie dentária”, explica a pesquisadora.
A literatura sobre o tema mostrava que pessoas com baixo alfabetismo em saúde geralmente têm menos informações sobre o tema, piores condições, comportamentos mais insalubres e fazem menos uso de serviços preventivos.
Futuro
Sofia integra, agora, a equipe do Centro de Estudos e Pesquisa em APS e redes (Ceppar) do Hospital Israelita Albert Einstein, e fará seu pós-doutorado dentro da temática de iniquidades em saúde (diferentes formas de acesso, oferta e demanda de serviços na Atenção Primária à Saúde – APS).
Mais informações: e-mail sofiamaito@hotmail.com, com Sofia Maito Velasco