Análise da mídia ajuda a compreender protestos de 2013 e 2015

Tese de doutorado estuda abordagem midiática dos maiores protestos nacionais desta década

 18/09/2017 - Publicado há 7 anos     Atualizado: 22/09/2017 às 9:19
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Trabalho apresentado em evento da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) investiga manifestações tendo a cobertura da mídia como enfoque – Foto: Marcos Santos – USP/Imagens

No último mês de junho, Marcos Rogério Martins Costa — doutorando da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, apresentou seu trabalho em uma conferência da Unesco na Association Française de Sémiotique, em Paris. O objeto de seus estudos é a abordagem midiática das manifestações nacionais ocorridas nos anos de 2013 e 2015, respectivamente contra o aumento das tarifas e a favor do impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Segundo o pesquisador, partindo-se de um ponto de vista semiótico, tais fenômenos possibilitam explicar muito sobre a situação política atual. E, no entanto, ainda não foram suficientemente analisados.

“Estudos sobre a Jornada de Junho [manifestações de 2013] e os protestos de 2015 são construídos de maneira muito concreta em áreas como a filosofia, sociologia e ciências políticas. Pesquisadores vão às manifestações, elaboram estatísticas, fazem trabalhos de campo, colhem relatos de cidadãos. Esse tipo de pesquisa é muito interessante, entretanto poucos são aqueles que analisam a forma como a mídia interpretou tais fatos e colocou-os em forma de texto”, explica Costa.

Na opinião do doutorando, a imprensa é uma instituição que possui interesses — podem ser eles comerciais, políticos ou até mesmo o posicionamento discursivo do repórter do jornal. Ademais, grande parte dos brasileiros procura informações em veículos já consolidados, fato que sustenta a ideia da sociedade entender e interpretar fenômenos como as manifestações a partir da visão preestabelecida pela mídia.

Mesmo com tema de tamanha importância, a pesquisa de Marcos Costa é a única em seu departamento a estudar os movimentos utilizando como base a semiótica da Escola de Paris — vertente teórica responsável pela interpretação referente à organização do sentido em diversos textos. Para análise, o pesquisador utilizou conteúdos publicados por O Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Mídia Ninja.

“O Estado e a Folha são jornais de grande tiragem e muitos leitores. Já a Mídia Ninja tem papel fundamental na divulgação de imagens referentes à truculência policial, normalmente, não exibidas à primeira vista pelos jornais da grande mídia”, explica.

Para pesquisador, não se pode esquecer que a imprensa é uma instituição que também tem interesses próprios – Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

Analisando textos das duas maiores mobilizações dos últimos tempos, foi possível perceber uma referência entre reportagens construídas em ambos os períodos. “O mais interessante de tudo isso é que matérias em 2013 não utilizavam o modus estabelecido anteriormente para se reportar manifestações de rua. Tentou-se criar uma nova forma, que acabou por não alcançar os leitores inicialmente”, comenta. “Pouco a pouco, foi se reformulando a maneira como se transcrevia o fenômeno, testando o público para descobrir qual o modo mais adequado de falar sobre as reivindicações.”

Seguindo a pesquisa, quando chegam os Protestos de Março, a grande mídia já possui a experiência adquirida em junho de 2013 — algo que facilita na formulação dos discursos e no alcance de metas discursivas. Com isso, muda também a Mídia Ninja, criando um movimento muito mais amplo, com muito mais aderência. Os três veículos comparados modificaram-se na passagem de 2013 a 2015. A hipótese fomenta um diferencial no modo de se produzir e se consumir informação a partir da Jornada de Junho, fato não suficientemente estudado até o momento.

Ou nós voltamos para o passado para reformular o futuro ou ficamos estagnados neste presente.

“Por que está ocorrendo esta reformulação política no Brasil? Porque a Jornada de Junho foi o estopim de algo novo, e isto está borbulhando agora, no ano de 2017. Não sabemos o motivo por não termos estudado de maneira correta o que se passou em 2013. Ou nós voltamos para o passado para reformular o futuro ou ficamos estagnados neste presente.”

Apresentação em Paris

Marcos e Juliete, esposa de Teresa Kean Greimas — fundador da semiótica francesa e homenageado da conferência. Foto: Divulgação / Studio KAENA

Em homenagem ao centenário de nascimento do fundador da semiótica francesa, Algirdas Julien Greimas, a Unesco organizou uma conferência na Association Française de Sémiotique, em Paris. Durante o evento, diversos doutores e especialistas na ciência, entre eles, Marcos Rogério Martins Costa, apresentaram seus estudos aos maiores mestres da disciplina.

 


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