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O meio acadêmico se mobiliza para lidar com o ChatGPT da melhor maneira possível – Fotomontagem: Jornal da USP - Fotos: Pexels, Wikipedia e Wikimedia Commons
ChatGPT e o meio acadêmico: como lidar com a nova ferramenta?
Docentes assimilam a influência da ferramenta e preparam evento para discutir formas de incorporar tecnologias de geração de linguagem em suas atividades
Os filmes de inteligência artificial, em sua maioria, costumam retratar um futuro distante, no qual a inteligência artificial (IA) alcança um grau elevado de desenvolvimento, tornando-se uma entidade digna de ser considerada uma forma de vida. Em 30 de novembro de 2022, o futuro pareceu estar mais próximo com o lançamento do ChatGPT, um modelo de linguagem de IA que pode conversar como se fosse uma pessoa real. O meio acadêmico se mobiliza para lidar com a nova ferramenta da melhor maneira possível, para que seja usada na elaboração de artigos científicos, dissertações e teses como um recurso a mais no acesso a informações, e não substituindo o trabalho intelectual dos autores dos estudos. A USP já tem evento programado para discutir essas questões.
O ChatGPT é um modelo de linguagem natural desenvolvido pela OpenAI, uma empresa de pesquisa em inteligência artificial que usa de uma tecnologia IA baseada nas chamadas redes neurais, para gerar textos com base nas informações fornecidas pelo usuário. A ferramenta cresce em popularidade em uma sociedade fundamentada em tecnologia, em todas as áreas do conhecimento, atraindo cada vez mais usuários. Em dados retirados do próprio ChatGPT, são mais de 1 milhão de pessoas por semana usufruindo desse algoritmo. Ele também alude informações de cunho monetário – no dia de seu lançamento, contou com um aporte inicial de US$ 1 bilhão e, hoje, foi avaliado em US$ 30 bilhões.
A gama de conhecimento dessa inteligência é considerável, o leque vai de uma conversação amigável a conselhos de mães, de um emotivo pedido de casamento a uma redação no modelo do Enem, de traduções certeiras à sugestão de sinônimos, da monetização de textos publicitários à aprovação na primeira fase do concurso da OAB e na prova de residência médica nos EUA, como aconteceu recentemente.
No meio acadêmico
Essa enorme versatilidade fez a ferramenta, naturalmente, desembarcar no universo acadêmico. Nesses últimos meses, o chat tem chamado a atenção de universidades em todo o mundo, pela sua capacidade de gerar textos complexos e responder a perguntas de maneira precisa e eficiente. Tem a possibilidade de modificar a forma como alunos e professores aprendem e ensinam.
Com seu potencial de sintetizar frases complexas, formular respostas originais, compreender, interpretar e argumentar hermeticamente, o ChatGPT representa uma quebra de paradigmas. É o que afirma o professor Osvaldo de Oliveira Júnior, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP. “Isso muda completamente o cenário trivial da inteligência artificial, uma vez que a fronteira da IA convém na incapacidade da máquina entender textos. O ChatGPT, no cenário atual, é uma demonstração.
O professor diz que o futuro é um protótipo de IA com a capacidade de raciocinar. “É uma maneira nova jamais vista de gerar e transmitir conhecimento. Até hoje, todo o alicerce científico, filosófico ou de cunho geral conta com uma intervenção humana. As máquinas são ferramentas que findam uma informação previamente elaborada. Ao inferir esse tipo de conquista, o fenômeno do princípio do conhecimento muda”, analisa.
Ao ser “entrevistado” para essa reportagem, o ChatGPT foi perguntado sobre suas limitações. O algoritmo “respondeu” que, embora treinado em uma grande quantidade de dados, ainda tem conhecimento limitado sobre o mundo real e pode ter dificuldade em entender alguns contextos, conceitos técnicos ou informações muito específicas.
As limitações perdem força quando pensadas em um futuro já muito próximo, é uma questão de tempo, uma vez que essas ferramentas serão treinadas. “De modo didático, treinar uma ferramenta para uma área específica fará com que ela tenha um conhecimento muito mais amplo de que qualquer humano, pois sua capacidade de processamento, de análise de resultados e o quantitativo de informações em determinado gênero que ela terá armazenado serão absurdos. Ela vai ser um pesquisador excepcional naquela área, provavelmente muito acima da média dos humanos, mesmo dos humanos especializados naquele assunto”, afirma Oliveira Júnior.
Assim, o professor afirma que é inegável não pensar no uso da IA como fonte ou ferramenta de trabalhos e estudos. “Porque, em alguns casos, as informações disponíveis pelo ChatGPT são essenciais para um trabalho científico, um artigo ou até mesmo um estudo, e os elementos oferecidos pelo chat serão contabilizados e significativos.” Oliveira Júnior sugere que, da mesma forma que as revistas estão pedindo para que os autores que utilizaram o ChatGPT o mencionem, o meio acadêmico deve usá-lo e citá-lo como referência.
“Não podemos impedi-las, mas sim achar uma melhor maneira de observá-las e estudá-las.” É combater o mau uso, evitar o abuso, é ousar compreender como ela funciona, apropriar o conhecimento e aperfeiçoar aquilo que ela prepara.
ChatGPT na USP
O professor Márcio de Castro Silva Filho, pró-reitor de Pós-Graduação da USP, diz que a Universidade está se preparando para incorporar o aumento de tecnologias de geração de linguagem, como o ChatGPT, de maneira eficaz em suas atividades. Silva Filho afirma que realizou e continuará a realizar seminários e que as discussões sobre seus benefícios e malefícios são bem-vindas. “No momento, a instituição se organiza para um grande fórum interno que contará com docentes de diversas áreas do conhecimento, a fim de discutir o algoritmo, como incorporá-lo nas nossas rotinas, os prós e contras, os potenciais e limites, as recomendações de diretrizes para sua utilização, e outras alegações cabíveis”. O evento a que o professor se refere é ChatGPT: Potencial, Limites e Implicações para a Universidade, organizado pelo Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP, em parceria com Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e o Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto.BR (Nic.br).
Será na forma on-line, no dia 21/3, das 9h às 17h30. É um evento público e gratuito e sem inscrição prévia. A transmissão ao vivo pode ser acompanhada em iea.usp.br/aovivo. Mais informações você encontra em iea.usp.br/eventos.
O pró-reitor admite que há uma preocupação em relação à utilização do ChatGPT para realização de TCC’s , artigos e trabalhos. “Acredito que o desdobramento dessa questão vai gerar debates que vão culminar em providências que visem a não atrapalhar o processo criativo, gramatical e de reflexão dos jovens, ante a possibilidade de que o uso dessa ferramenta possa subtrair-lhes desse exercício. No caso da USP, a solução não é um bloqueio à sua utilização, mas sim um uso responsável”, adianta.
O ChatGPT concorda com a posição do pró-reitor e confirma que “o afastamento das tecnologias IA’s dos meio acadêmicos é uma visão um tanto quanto inocente que paira sobre o cenário atual”. Desse modo, o chat propõe um incentivo no desenvolvimento de tecnologias que possam ser usadas em conjunto com ele próprio para identificar e mitigar o uso indevido da ferramenta.
No plano geral
As consequências de uma tecnologia de linguagem tão avançada como o ChatGPT atingem diversas áreas e especialidades do conhecimento, diversas faixas etárias e camadas sociais. Afeta o ambiente social-econômico e até mesmo o cultural. Em um viés positivo, Oliveira Júnior ressalta que o algoritmo culmina em uma maior eficiência nos quesitos tempo e aperfeiçoamento, principalmente no ambiente de trabalho.
Em contrapartida, os malefícios são vários, segundo o professor. Ele enfatiza a problemática do desemprego estrutural, caracterizado pela modernização das atividades produtivas e de consumo por meio da inserção de ferramentas tecnológicas na produção econômica. “A substituição da mão de obra humana por máquinas e equipamentos em grande escala é uma adversidade do século 21 que já preocupa especialistas. É importante frisar que a troca do homem pela tecnologia até então se deu exclusivamente na mão de obra braçal por máquinas de alta tecnologia. Porém, como um aviso prévio, o cenário é propício para um acentuamento desse problema: grande parte dos trabalhos intelectuais será substituída por máquinas.”
Ele continua dizendo que “o ChatGPT pode nunca entender como o humano entende, pode nunca saber de fato o que ele está fazendo, mas, se a máquina consegue realizar uma tarefa intelectual no ponto de vista de lucro e saldo positivo para a economia, é o que interessa no universo capitalista vivido em sociedade”.
Por sua vez, o ChatGPT conclui “dizendo” que tem um futuro promissor, que vai depender do desenvolvimento contínuo da tecnologia subjacente à inteligência artificial e ao aprendizado no quesito dados informativos disponíveis, mas afirma confiar no treinamento oferecido pela sua empresa de criação, a OpenAI.
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