O ano de 2019 não foi tranquilo nem para o Brasil nem para o resto do mundo. No País, com a posse do novo governo e a guinada ideológica, aprofundaram-se ataques contra a cultura, educação e ciências. Além disso, desastres como os de Brumadinho e as queimadas da Amazônia marcaram o ano. Conflitos entre EUA e China, Brexit e revoltas na América do Sul foram alguns dos diversos acontecimentos internacionais de 2019.
Para fazer um balanço do ano, o Diálogos na USP recebeu Pedro Dallari, professor de Direito Internacional do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da USP e coordenador do Centro Ibero-Americano (Ciba) da USP. Contribuiu também José Álvaro Moisés, professor de Ciências Políticas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP e diretor do Núcleo de Pesquisa de Políticas Públicas (NUPPs) da USP.
Pedro Dallari acredita que o período é de turbulência, o que dificulta a análise dos acontecimentos para além de um simples relatório. Não há uma explicação que resolva tudo, é preciso considerar as especificidades de cada local e as diferentes realidades. O professor ainda comenta sobre a atual insatisfação popular, que gera um quadro de instabilidade generalizada e se materializa em cada país de forma específica.
Álvaro Moisés diz que, olhando para o mundo do ponto de vista político, é possível reconhecer que a democracia liberal está em crise, principalmente em razão do espaço em que as pessoas se sentem representadas e que se tornou limitado. As lideranças democráticas também fragilizaram a cultura democrática, pois, ao invés de responderem à população e propor mudanças, seguem se isolando cada vez mais de seus eleitores.
Vive-se o início de um novo ciclo político, marcado pela ascensão da extrema-direita e pela queda de políticas sociais. As lideranças tradicionais brasileiras não souberam se adaptar aos novos tempos e, nesse vácuo, surgiu um líder que, de certa forma, fez a conexão entre o combate à corrupção, uma nova política frente à criminalidade e uma promessa vaga de retomada da economia. Álvaro Moisés o definiu como um “ciclo político conservador, de extrema-direita, populista e com uma forte mentalidade autoritária”.
Pedro Dallari questiona se há uma crise “da” democracia ou “na” democracia. A primeira seria mais no âmbito da sociedade de querer trocar de regime; já a segunda se refere à insatisfação popular quanto à forma que a democracia está sendo conduzida. A segunda opção seria a mais correta. O professor explica que o que levou à eleição do governo não foi necessariamente o posicionamento de extrema-direita, mas a corrupção, o desemprego, a precariedade dos serviços públicos, o quadro insatisfatório no geral. Pesquisas de opinião, como do Datafolha, mostram que mesmo os eleitores de Jair Bolsonaro não se identificam com seus posicionamentos. “A democracia se coloca em risco, pois o simples fato do voto de protesto pode colocar no governo líderes antidemocráticos”, explica Dallari.
Álvaro Moisés fala que, em vários países do mundo, governos populistas se utilizam das eleições em um primeiro momento de forma democrática e, depois, questionam tal democracia. O professor ainda diz que a visão do Brasil no meio internacional vem sendo distorcida. Antes, o País tinha a imagem de moderado do ponto de vista de grandes acordos e estava cooperando no cenário. Agora, é visto como irresponsável, principalmente em razão de questões ambientais.
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