Conselho Nacional de Justiça tem pouca influência sobre magistratura paulista, sugere estudo

Análise de 178 pedidos de “habeas corpus” solicitados durante a pandemia e embasados em recomendação do Conselho Nacional de Justiça mostra que 84% deles foram negados. Para os pesquisadores, isso indica pouca influência do órgão sobre a magistratura paulista

 27/10/2021 - Publicado há 3 anos     Atualizado: 18/06/2024 as 10:58
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Estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto (FDRP) da USP e representantes da Defensoria Pública de São Paulo verificou que 84% dos habeas corpus solicitados ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) durante a pandemia da covid-19 foram negados. Os pedidos tinham como base a Recomendação n° 62 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para o controle da propagação do novo coronavírus em ambientes penais com ocupação acima da capacidade. 

A Recomendação n° 62 foi publicada em março de 2020, orientando juízes e tribunais sobre os “novos protocolos de emergência de saúde pública voltados ao sistema de justiça penal e socioeducativo”, conta a aluna da FDRP, Luiza Barroso Pereira e Silva, que participou da pesquisa. Assim, o documento recomendava reavaliação de prisões provisórias e saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto para mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, idosos, indígenas, pessoas com deficiência, ou que se enquadrem no grupo de risco, e para indivíduos presos em estabelecimentos penais com ocupação acima da capacidade.

Luiza diz que o resultado indica a “pouca influência do CNJ sobre a magistratura paulista”. E o que mais influenciou a negativa aos habeas corpus, segundo o levantamento dos pesquisadores, “foi a avaliação das condições médico-sanitárias das penitenciárias” consideradas “boas ou ao menos suficientes para contenção do novo coronavírus e o tratamento de possíveis doentes”.

No entanto, informa a aluna, tais decisões não são compatíveis com as reais condições das prisões brasileiras e se referem “a processos penais, em sua maioria, relativos a crimes de drogas, sem empregos de violência ou grave ameaça, e tendo homens figurando como réus”. Segundo Luiza, esse tipo de resposta é frequente nas câmaras do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP).

Discordância entre o CNJ e a magistratura paulista 

A negativa à maioria dos pedidos, avalia Luiza, revelou discordâncias entre as “justificativas dos magistrados” e a “iniciativa do CNJ”, mesmo nos habeas corpus concedidos. Para a equipe da pesquisa, as controvérsias indicam pouca influência da recomendação, além de a “não menção” do documento nas discussões dos pedidos pelo TJSP também apontar para “instabilidade na sanção institucional do CNJ”. Segundo Luiza, mesmo os acórdãos que a mencionam apresentam juízo de valor, com ponderações e críticas sobre as considerações do CNJ que intensificam essa instabilidade.

O estudo Acesso à Justiça e Desigualdades em tempos de Covid-19: analisando decisões judiciais em Habeas Corpus do estado de São Paulo foi realizado entre agosto de 2020 e julho de 2021, com análise de 178 acórdãos do TJSP do período de março a setembro de 2020.

Além de Luisa, participaram da pesquisa a professora Fabiana Cristina Severi, a aluna de pós-graduação Camila Maria De Lima Villarroel e os representantes da Defensoria Pública do Estado de São Paulo da região de Ribeirão Preto, Hamilton Neto Funchal, Joyce Santos De Oliveira e Rafael Bessa Yamamura que também são mestres em Direito pela FDRP.

O relatório está disponível para leitura no site da FDRP por aqui, e pode ser acessado nas versões 1 e 2

Mais informações: e-mail fabianaseveri@usp.br 

Ouça no player abaixo entrevista da pesquisadora na íntegra ao Jornal da USP no Ar, Edição Regional.

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