PL 529/20 torna universidades e pesquisas reféns do cenário econômico

Giselle Beiguelman comenta projeto que pode retirar reservas das três universidades públicas do Estado de São Paulo, além da Fapesp

 14/09/2020 - Publicado há 4 anos
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“O PL 529 é um projeto de lei encaminhado pelo governador João Doria à Assembleia Legislativa de São Paulo e inclui dispositivos que podem retirar o superávit, o saldo positivo das três universidades estaduais paulistas – USP, Unicamp e Unesp e também da Fapesp, nossa principal agência de pesquisa”, protesta Giselle Beiguelman em sua coluna Ouvir Imagens, na Rádio USP (clique e ouça o player acima). “Com isso, retira-se a possibilidade dessas instituições se programarem a longo prazo e, pior, transformam as universidades e a pesquisa científica em reféns do cenário econômico e das suas flutuações.”

Giselle Beiguelman aponta o projeto como “um desastre anunciado no País dos desmontes”. E destaca: “E a coisa não para por aí…”. A professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP refere-se às outras más notícias que ameaçam a cultura. “Como já foi noticiado pelos jornais, o acervo do arquiteto Paulo Mendes da Rocha foi doado à Casa de Arquitectura de Portugal, uma instituição de excelência, mas que não é pública nem brasileira.”

Ela observa que a FAU/USP lamentou, em nota divulgada, a decisão do arquiteto, destacando não só o valor material do acervo, mas que integraria o maior arquivo público de arquitetura, urbanismo e design. “Isso acontece poucas semanas depois do ataque que o Museu de Arte Contemporânea da USP sofreu com a decisão judicial de leiloar as obras do Banco de Santos, que estavam sob sua guarda, sem ressarcir o investimento de R$ 20 milhões feito ao longo de 15 anos. É, portanto, mais um indicativo do desmonte da pesquisa e da cultura no País.”

O caso do acervo do Paulo Mendes pode, segundo Giselle Beiguelman, ser entendido como um voto de desconfiança no futuro da memória do Brasil. “O que, no quadro atual, apesar de lamentável, é compreensível.” Porém, destaca que o do MAC-USP mostra como o desprezo pelo investimento público pode comprometer o valor do patrimônio cultural coletivo. “Desmembradas e vendidas como valiosas bananas unitárias, as obras perdem sua integridade e seu sentido, o que ocorrerá certamente com o portfólio do fotógrafo Man Ray e outras obras seriadas que estão sendo oferecidas como itens desconexos.”

A professora conclui: “Nesse sentido, é difícil não vislumbrar nesse enredo uma conexão sombria entre as peças e os efeitos do desmonte do Estado e do valor da coisa pública. É esse desmonte que explica como se relacionam as propostas do PL529, a exportação de um acervo precioso para a pesquisa e dilaceração de um acervo preservado por 15 anos por uma instituição pública”.


Ouvir Imagens 
A coluna Ouvir Imagens, com a professora Gisele Beiguelman, vai ao ar quinzenalmente, segunda-feira às 8h, na Rádio  USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP,  Jornal da USP e  TV USP.

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