A intermitente crise política que engolfou o Brasil nos últimos tempos – e que tem inserido militares de alta patente e com cargo no governo na questão – tem chamado a atenção de vários analistas pelo risco que ela pode representar para a democracia no País. É exatamente sobre isso que fala o professor Pedro Dallari em sua coluna desta semana. “O Brasil vive uma crise política muito séria, maior inclusive do que tem transparecido no noticiário. Há uma crise militar que traz a ameaça de um golpe de Estado. A presença do general Eduardo Pazuello em uma manifestação política no Rio de Janeiro no último domingo, juntamente com o presidente da República, é o fato indicativo da dimensão dessa crise”, afirma Dallari. “Isso porque o general Pazuello, ex-ministro da Saúde, é um general da ativa e não pode ter nenhum tipo de atividade política, conforme o regramento das Forças Armadas. Cabe aí, em função desse ato de indisciplina, a aplicação de uma punição administrativa pelo comandante do Exército. Mas o presidente sabia que essa presença do ex-ministro constituía uma irregularidade, e o general também sabia que estava praticando um ato irregular e uma indisciplina. Ambos apostaram conscientemente na crise”, analisa o professor. “Se Pazuello não for punido pelo comandante do Exército, isso fragilizará a estrutura e a hierarquia das Forças Armadas. E, se for dada, ela poderá ser revogada pelo presidente, o que geraria uma crise institucional muito grave”, avalia ele.
No entender de Dallari, porém, a crise já existe. “A crise já está dada, na verdade. O presidente pressiona para submeter os comandantes das Forças Armadas à sua vontade – ou para levá-los a se demitirem, o que abriria caminho para que aliados seus ocupassem esse espaço”, afirma o colunista. “Bolsonaro conta, para isso, com o novo ministro da Defesa que, ao contrário do anterior, tem sido absolutamente dócil e subserviente às vontades do presidente da República”, diz ele. Mas o colunista ainda não vê um quadro favorável, neste momento, para um golpe. “É claro que, a princípio, o quadro não é favorável a um golpe de Estado. O presidente vem contando com apoio de uma parcela cada vez menor da população, principalmente em função da desastrosa – e mesmo criminosa – conduta durante a crise da covid-19. Mas, de todo modo, o presidente pode precipitar uma situação de golpe – como Donald Trump ameaçou nos Estados Unidos – e, mesmo que essa tentativa seja fadada ao fracasso, pela falta de apoio, trará muito sofrimento e dificuldade para a sociedade brasileira”, acredita Dallari. “É fundamental, nesse momento, que a sociedade reaja, defenda a democracia e se oponha à conduta cada vez mais irresponsável do presidente da República, que é uma ameaça à cidadania no Brasil”, conclui o colunista.
Globalização e Cidadania
A coluna Globalização e Cidadania, com o professor Pedro Dallari, vai ao ar quinzenalmente, quarta-feira às 8h, na Rádio USP (São Paulo 93,7; Ribeirão Preto 107,9) e também no Youtube, com produção da Rádio USP, Jornal da USP e TV USP.
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