Filmes exploram as relações entre as rochas e a vida humana

Até 3 de março, mostra do Cinema da USP exibe 22 produções, entre longas e curtas-metragens do Brasil e do exterior

 26/02/2024 - Publicado há 4 meses
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Cartaz da mostra Uma Pedra no Caminho, do Cinema da USP Paulo Emílio (Cinusp) – Foto: Divulgação/Cinusp

Desde o dia 19 passado, o Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp) apresenta a mostra de filmes Uma Pedra no Caminho, que se estende até 3 de março.  Ao todo, são 22 filmes, sendo dez longas-metragens e 12 curtas-metragens, exibidos nas salas do Cinusp instaladas no Centro MariAntonia da USP, na região central de São Paulo, e no Centro Cultural Camargo Guarnieri, também da USP, na Cidade Universitária. O foco da mostra está em explorar as diferentes possibilidades de relações entre os objetos inanimados do relevo e o ser humano. “Como uma rocha, um objeto duro e inerte, pode deixar as pessoas moles, em movimento, envoltas em uma narrativa?”, questiona Clara Barra, uma das curadoras do evento, explicando a ideia inicial que deu origem à mostra.

O evento inclui duas sessões seguidas de debates. Nesta quarta-feira, dia 28, às 16 horas, no Centro Cultural Camargo Guarnieri, depois da Sessão de Curtas, a professora Eliane Del Lama, do Instituto de Geociências da USP, vai abordar a relação entre rochas, memória e cultura. Já no dia 1º, também às 16 horas no Camargo Guarnieri, o professor Francisco William da Cruz Júnior, do mesmo instituto, é o convidado para falar sobre o estudo das cavernas, após a exibição do filme O Buraco.

Destaques

Para a curadora Clara Barra, é possível dividir Uma Pedra no Caminho em dois eixos: o documental e o narrativo. Dentre as obras documentais, ela destaca O Fogo Interior: um Réquiem para Katia e Maurice Kafft (2022), do cineasta alemão Werner Herzog, e Wolfram, a Saliva do Lobo (2010), dos portugueses Joana Torgal e Rodolfo Pimenta.

O primeiro é uma homenagem a um casal que dedicou a vida a estudar o vulcanismo e acabou morrendo numa erupção vulcânica. Já o segundo sobrepõe elementos da mineração à presença humana em uma mina portuguesa, de modo a trazer a relevância que esses elementos podem ter, enfatizando a exploração ilegal de pessoas que ocorre no meio da mineração. 

O Fogo Interior será exibido nesta sexta-feira, dia 1º, às 19 horas, no Camargo Guarnieri, na mesma sessão que inclui o curta-metragem Cristais Líquidos (1978), do francês Jean Painlevé, que mostra imagens da passagem de cristais do estado líquido para o estado sólido por meio de um microscópio de polarização, ao som de uma trilha sonora que mistura música clássica e eletrônica. Wolfram, a Saliva do Lobo, por sua vez, será apresentado neste sábado, dia 2, às 16 horas, no Centro MariAntonia, na mesma sessão do curta italiano Surfarara (1955), que mostra um dia de trabalho dos mineradores de enxofre na Sicília.

No que diz respeito aos filmes narrativos, a curadora do Cinusp destaca os estadunidenses Joias Brutas (2019), dirigido por Benny e Josh Safdie, e Como Era Verde Meu Vale (1941), que tem direção de John Ford.

O filme de 2019, que tem Adam Sandler como protagonista, conta a história de um vendedor de diamantes que se torna viciado em apostas esportivas e vê numa pedra, a opala negra, a oportunidade de pagar suas dívidas. Clara enfatiza o viés histórico por trás do filme, uma vez que “na Idade Média, lidar com joias era visto como algo impuro e, portanto, destinado àqueles então considerados impuros, como os judeus”. Joias Brutas será exibido nesta quarta-feira, dia 28, às 19 horas, no Camargo Guarnieri, e no domingo, dia 3, às 18 horas, no MariAntonia, com o curta-metragem austríaco Um Jogo com Pedras (1965), de Jan Švankmajer, que se vale de pedras, de uma torneira e de uma caixa de música para criar figuras e texturas.

Como Era Verde Meu Vale retrata a família Morgan, que vive aos pés de uma montanha e trabalha em uma mina de carvão que acaba por ter implicações sociais prejudiciais à família. A sessão que exibe o filme – nesta terça-feira, dia 27, às 19 horas, no Camargo Guarnieri – também mostra Minas (1991), curta sul-africano dirigido por William Kentridge que, diferentemente do longa estadunidense, traz um discurso declarado e problematiza o trabalho nas minas de carvão de forma política, tendo como foco a opressão sofrida pelos trabalhadores negros das minas de carvão da África do Sul.

Clara também destaca que os curtas presentes na mostra têm um teor experimental e também trabalham a estética, a dureza e o reflexo das pedras na vida humana. Ela cita a Sessão de Curtas, nesta quarta-feira, dia 28, às 16 horas, no Camargo Guarnieri, como “um exemplo do que une o abstrato ao bruto e a arte à pedra”. Os curtas exibidos na sessão são: Bassae (1964), do francês Jean-Daniel Pollet, Canção de Pedra (1963), do japonês Toshio Matsumoto, Círculos de Pedra (1983), da estadunidense Barbara Hammer, e Cais Espiral (1970), do também estadunidense Robert Smithson.

Confronto de ideias

A curadora de Uma Pedra no Caminho confirma que o título da mostra é uma referência ao poema No Meio do Caminho (1928), de Carlos Drummond de Andrade. Ela enfatiza o quanto o dinamismo e a subjetividade humana — temas mais tradicionais no cinema — podem ser alterados direta ou indiretamente por elementos como pedras, rochas e vulcões.

Isso se observa, por exemplo, em Stromboli (1950), do italiano Roberto Rossellini, que narra a história de uma refugiada lituana que se vê obrigada a se casar com um pescador italiano, com quem vai viver em uma ilha próxima a um vulcão. Lá, os costumes são conservadores e distintos daquelas a que ela está habituada. Na mesma sessão está Altiplano (2018), da chilena Malena Szlam, curta que apresenta diferentes paisagens da Cordilheira dos Andes. As duas obras estão previstas para serem exibidas nesta quinta-feira, às 16 horas, no Camargo Guarnieri, e no domingo, dia 3, às 16 horas, no Centro MariAntonia.

 

Outra sessão conjunta (terça-feira, dia 26, às 19 horas, no Camargo Guarnieri) apresenta duas obras brasileiras: o longa é Rejeito (2023), de Pedro de Filippis, que reflete sobre o rompimento de barragens nas cidades de Mariana (MG), em 2015, e de Brumadinho, em 2019, os impactos sofridos pela população e a reação das mineradoras, e o curta Pedreira de São Diogo (1962), que conta sobre a união de operários e moradores para impedir a destruição da comunidade onde vivem, ameaçada pelas atividades de uma pedreira.

Na temática das pedras preciosas, Desejos Proibidos (1953), de Max Ophüls, narra a história de uma mulher que, no século 19, vende os brincos que ganhou do marido para pagar suas dívidas, mas vê o destino colocá-los em seu caminho novamente. Na mesma sessão, será exibido o curta iraniano As Joias da Coroa do Irã (1965), de Ebrahim Golestan, que reflete sobre as desigualdades no Irã, tendo como ponto de partida o tesouro real iraniano. Os filmes estarão em cartaz nesta terça-feira, dia 27, às 16 horas, no Camargo Guarnieri, e no sábado, dia 2, às 18 horas, no MariAntonia.

Apenas dois dos longas-metragens têm sessões exclusivas. São eles: Eternidade (2017), do peruano Óscar Catacora, e O Buraco (2021), que também aparece com o nome original Il Buco, do italiano Michelangelo Frammartino. Enquanto o filme italiano se passa em uma caverna no sul da Itália, onde pesquisadores fazem uma expedição e são vigiados por um pastor que lá vive e fica doente, o peruano conta a história de um casal de idosos que vive em uma área remota da Cordilheira dos Andes e tem a esperança de reencontrar seu filho em meio às dificuldades de viver isolado. O Buraco poderá ser visto no dia 1º, às 16 horas, na mesma sessão que inclui debate com o professor Francisco William da Cruz Junior. Eternidade será exibido nesta quinta-feira, dia 29, às 19 horas, no Camargo Guarnieri.

A mostra Uma Pedra no Caminho, do Cinema da USP Paulo Emilio (Cinusp), está em cartaz até 3 de março, em sessões às 16, 18, 19 e 20 horas, nas salas do Cinusp instaladas no Centro Cultural Camargo Guarnieri da USP (Rua do Anfiteatro, 109, Cidade Universitária, em São Paulo) e no Centro MariaAntonia da USP (Rua Maria Antonia, 258/294, Vila Buarque, região central de São Paulo, próximo às estações Higienópolis-Mackenzie e Santa Cecília do metrô). Entrada grátis. A programação completa da mostra e mais informações estão disponíveis no site do Cinusp.

*Estagiário sob supervisão de Roberto C. G. Castro


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