PEC das Embaixadas é inadequada e contrária aos interesses públicos

A opinião é do professor Alberto do Amaral, para quem a proposta desvaloriza a formação de diplomatas e pode servir como moeda de troca para a obtenção de interesses políticos

 25/08/2022 - Publicado há 2 anos

 

Itamaraty, Ministério das Relações Exteriores do Brasil, a Consultoria do Senado e a Casa Civil emitiram pareceres contrários à PEC 34/2021 – Foto: Wikimedia Commons
Logo da Rádio USP

A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) das Embaixadas, de autoria do senador Davi Alcolumbre, autoriza que membros do Parlamento controlem uma embaixada de forma permanente sem que tenham que deixar o mandato. O professor Alberto do Amaral, de Direito Internacional da Faculdade de Direito da USP, analisa a proposta, que não teve uma repercussão positiva no meio diplomático brasileiro.

De acordo com o professor, a PEC 34/2021 é inadequada e contrária ao interesse público. Além disso, pode desvalorizar a formação de diplomatas. “O mérito é fundamental na carreira diplomática, ela é constituída por várias etapas e, com exceção de uma delas, a ascensão de terceiro para segundo secretário, todas as etapas são galgadas pelos indivíduos por intermédio do mérito até a função de embaixador”, descreve.

O Brasil possui uma escola mundialmente reconhecida de formação de diplomatas, o Instituto Rio Branco, fundado em 1945 em homenagem ao Barão do Rio Branco. O instituto já formou mais de 2 mil diplomatas desde a sua criação. Permitir que parlamentares assumam o controle de uma embaixada pode desvalorizar essa formação.

Interesses distintos

Além disso, a atividade diplomática possui uma lógica diferente da parlamentar: “A diplomacia é uma atividade política que visa a projetar os interesses brasileiros no médio e no longo prazo. A política parlamentar, ao contrário, obedece uma lógica de curto prazo, em que os partidos buscam obter poder”, comenta Amaral.

O ingresso na carreira diplomática exige um conhecimento amplo sobre diversos temas que têm influência no País e no mundo. É necessário compreender as relações internacionais e o modo como os países se organizam para participar da execução da política externa brasileira.

Alberto do Amaral Júnior – Foto: Marcos Santos/USP Imagens

O professor indica que é fundamental para um diplomata ter conhecimento da língua estrangeira, principalmente do inglês e do espanhol, além de outras línguas nas quais os diplomatas exercerão as suas respectivas funções no exterior. Também é preciso que os diplomatas tenham conhecimentos específicos sobre os temas internacionais em negociação. 

Amaral explica que a escolha de deputados e senadores para exercer a chefia das missões diplomáticas pode servir como moeda de troca para obtenção de interesses políticos. “Isso significa que a diplomacia servirá a interesses partidários de curto prazo e não a interesses do País de médio e de longo prazo.”  

Conflito de interesses

A problemática da PEC não está localizada na atuação de um parlamentar como embaixador, mas sim na possibilidade de acumular os cargos. “Um senador ou um deputado reunindo os requisitos técnicos e conhecimentos necessários para o exercício da função diplomática poderia atuar; se isso acontecer, o conveniente seria que este político renunciasse ao seu cargo para exercer a função. Com isso, evitar-se-ia a partidarização da diplomacia e o desincentivo para um candidato à carreira diplomática.”

A competência de indicar o embaixador é do presidente da República e a aprovação do nome precisa ser chancelada por senadores, configurando um possível conflito de interesses. Um senador indicado provavelmente receberia apoio de seu partido, o que pode estremecer a ideia de equilíbrio entre os Poderes previsto pela Constituição. 

O Itamaraty, Ministério das Relações Exteriores do Brasil, a Consultoria do Senado e a Casa Civil emitiram pareceres contrários à PEC 34/2021. Amaral indica que o exame da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania deveria ser um exame muito mais rigoroso do que tem sido. “Inúmeros projetos já foram aprovados sem cumprirem os requisitos constitucionais. Hoje, a Comissão obedece muito mais a interesses políticos de curto prazo, sobretudo dos partidos majoritários, do que propriamente aos interesses do País.”


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar no ar veiculado pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h, 16h40 e às 18h. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.