O Brasil deixou de ser apenas o país do futebol da bola redonda. Além de esportes como basquete, vôlei e tênis, outra modalidade tomou o País nas últimas décadas: o futebol americano. É cada vez mais comum ver pessoas nas ruas das cidades brasileiras com camisas dos 32 times que disputam a National Football League (NFL), maior campeonato do planeta. O fanatismo já é tão grande que, desde 2015, os brasileiros ocupam a terceira colocação na lista de maiores consumidores da liga, segundo pesquisa do Global Web Index – atrás somente do México e, é claro, dos Estados Unidos, mas à frente de Inglaterra e Alemanha, que já recebem partidas oficiais da NFL.
O professor Paulo Santiago, da Escola de Educação Física e Esporte de Ribeirão Preto (EEFERP) da USP, acredita que o elevado número de fãs brasileiros da NFL – mais de 30 milhões, segundo o Ibope Repucom – é resultado do tamanho da população: cerca de 210 milhões de pessoas. “Tirando a região Norte, que tem uma menor densidade populacional, se você olhar em proporção, o Estado de São Paulo tem o poder de atingir algo como se fosse Alemanha e França juntas. É por isso que, se você investir pouco no Brasil, terá uma grande condição de atingir o mercado e de ter uma boa quantidade de gente consumindo esse esporte”, ressalta.
Na prática, não é bem assim
O numeroso exército de fãs brasileiros da NFL, contudo, não se reflete em uma profissionalização dentro de campo, quando as tropas disputam a bola oval nos gramados do Brasil. Ao todo, o número de jogadores da principal liga do País, a Brasil Futebol Americano (BFA), supera os 5 mil, com 72 equipes divididas em dez categorias ao redor de todo o território nacional. Embora o interesse pela prática desse esporte seja evidentemente grande, poucos são os jogadores que podem viver sem outros empregos.
Daniel Koop, 23, é estudante de Educação Física e começou a prática em Ribeirão Preto com apenas 16 anos. Alto e forte para a idade, o atleta rapidamente ganhou espaço entre os mais experientes, mas precisou abandonar o esporte pelas dificuldades extracampo. “Em 2019, passei na faculdade e fui morar em Bauru. Era muito complicado, porque é uma viagem de umas duas horas e meia para Ribeirão, e todo fim de semana eu voltava para treinar. Tinha treinos pesados de sábado e domingo, saía cansado, desgastado, dava câimbra no meio da viagem, era complicado”, conta o estudante.
No início, Koop ainda aguentou a luta, mas, com o tempo e a vida construída em outra cidade, continuar na equipe em que estava, o Moura Lacerda Dragons, ficou impossível. “Fui me desgastando bastante, não tinha mais tanta disciplina, faltava em treino, e acabei optando por sair. Não estava dando meu melhor pelo time, então não fazia sentido continuar”, completa o agora ex-jogador de defesa, que ainda chegou a participar de partidas pontuais por clubes de outras cidades, como o Corinthians Steamrollers, de São Paulo.
O professor Santiago, todavia, enxerga uma luz para os praticantes do futebol americano, inspirada em outro esporte. Para o especialista, “a profissionalização e o crescimento do futebol americano no Brasil vêm ao encontro do crescimento da NFL. Esse é um processo que a gente pode observar no basquetebol, com muita gente já assistindo à NBA (National Basketball League) no Brasil, o que ajudou a ter uma divulgação maior e incentivar a ter a liga nacional”. Ele acrescenta que “basta as pessoas olharem o Brasil como um local de investimento, não só para propaganda, mas também como um local de formação de jogadores para vender à NFL”.
Se isso acontecer, a perspectiva será animadora para atletas que desejam repetir os feitos de Cairo Santos, kicker do Chicago Bears e primeiro brasileiro da história da NFL. Pelo lado dos clubes, porém, essa não parece ser a solução para um crescimento a longo prazo. Paulo Santiago aposta que, caso esse investimento da principal liga do mundo chegue ao Brasil em um formato semelhante ao que a NBA aplica no Novo Basquete Brasil (NBB), haverá a profissionalização, mas a modalidade aqui será sempre inferior, tanto pela grife NFL quanto pelo poder financeiro estadunidense. “O grande alvo dos jogadores de basquetebol no Brasil é participar da NBA, a liga americana. Fortalecendo a liga [de futebol americano] aqui no Brasil, talvez seja a mesma coisa e o grande alvo seja estar na NFL”, conclui.
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