Juízes podem determinar apreensão de CNH e passaporte em casos de dívidas

Roberto Augusto Pfeiffer comenta a decisão do Supremo e explica como a medida será aplicada, em que casos e as exceções previstas em lei

 28/02/2023 - Publicado há 1 ano
Todo tipo de dívida pode estar sujeito à aplicação da apreensão da CNH ou do passaporte – Foto: Detran via Fotos Públicas
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O Supremo Tribunal Federal, por dez votos a um, validou constitucionalmente a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e passaporte por determinação de juízes como medida coercitiva para pagamento de dívidas e cumprimento de ordens judiciais. Os ministros seguiram o voto do relator Luiz Fux. Esse dispositivo já existe desde 16 de março de 2015, na Lei nº13.105, quando foi inserido no atual Código de Processo Civil. Em 2018, ele foi motivo do pedido de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5941) requerido pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que foi julgada improcedente pelo STF em fevereiro. Alguns juízes, porém, já aplicavam essa decisão em alguns casos. 

Com essa decisão do STF, casos com aplicação dessa medida para apreensão da CNH e passaporte, assim como proibir empresas de licitarem como poder público e pessoas físicas a participarem de concursos públicos, serão mais comuns.

Aplicação da medida

A princípio, todo tipo de dívida pode estar sujeita à aplicação da medida, explica Roberto Augusto Pfeiffer, do Departamento de Direito Comercial da Faculdade de Direito da USP. Um exemplo é alguém que se envolve em um acidente de trânsito e não paga, ou está com uma dívida com alguma empresa, como conta de luz atrasada ou boletos bancários não pagos. Isso, claro, se não forem encontrados bens que possam ser penhorados ou não seja possível fazer o bloqueio da conta-corrente por falta de dinheiro.

Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer – Foto: FD-USP

“O credor não consegue cobrar por falta de bens que possam ser vendidos ou mesmo dinheiro apreendido para fazer o pagamento”, diz Pfeiffer. “Nessa hipótese, o juiz vai poder determinar uma maneira de obrigar, de coagir o devedor a pagar. Ele pode, então, determinar, por exemplo, a apreensão do passaporte ou a apreensão da CNH, ou mesmo uma proibição dele participar de um concurso público”, complementa. Essa medida serve como uma coerção para incentivar o devedor a pagar suas dívidas. 

Exceções 

Para quase toda regra existem exceções. Aqui não é diferente: caso a empresa decrete falência ou esteja em recuperação judicial, o juiz não pode determinar essa medida contra pessoa jurídica, proibindo a entrada em licitações. Outra exceção, e talvez a principal nesse assunto, é para aquelas pessoas que necessitam da CNH ou do passaporte para trabalhar, como motoristas de ônibus ou de aplicativos. Isso segue a resolução de proporcionalidade e razoabilidade: em cada caso concreto o juiz vai ver se a medida é razoável naquele caso e se não fere algum direito fundamental. 

Uma pessoa que viaje constantemente a trabalho, ou que precise do carro por conta de um familiar doente, seria poupada dessa medida, pois não seria razoável privá-la desses meios. “Uma situação padrão é aquela que parece muito razoável”, explica Pfeiffer. Da mesma forma, superendividados, desempregados e endividados por conta de tratamentos médicos entram na lista das exceções.

Entretanto, pessoas que levam um padrão de vida luxuoso e, mesmo assim, têm uma dívida, seja de acidente de trânsito ou por ter comprado uma nova televisão e não pagado, estão passíveis de ter seus documentos apreendidos. Outro exemplo seria o de pessoas que passam os bens para nome de familiares ou que nunca têm dinheiro na conta-corrente porque desviam para conta de familiares. “É muito mais naquela situação onde se percebe que o devedor tem condições, mas está escondendo o patrimônio”, lembra o professor.

Motivações e medidas judiciais

Trata-se de uma medida que vai incentivar o devedor a pagar, mas espera-se que não cause um problema maior que o impeça de pagar a dívida. Caso a apreensão fira algum direito dentro da proporcionalidade e da razoabilidade será necessário entrar com uma ação na justiça. “Na minha opinião, acho que foi uma decisão correta do Supremo, justamente para compelir alguns devedores que estão agindo de forma desonesta. Ele deve, mas simplesmente começa a esconder o patrimônio.” 

Ele avalia também que achou correto a decisão não valer para toda e qualquer espécie de dívida, além de fazer uma ressalva para a limitação de participação em concurso público, o qual acha que tem que ser em apenas alguns casos restritos. Já no caso da CNH e do passaporte, tem que ver quando é adequada a aplicação do dispositivo. “Não é uma medida para todo e qualquer caso, mas sim para aqueles casos de devedores que são desonestos”, finaliza. 


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