Marco Temporal é inconstitucional e vulnerabiliza povos indígenas, diz Marta Amoroso

A especialista lembra o direito dos povos tradicionais sobre as terras na Constituição e avalia o critério do Marco Temporal como “uma tentativa de golpe”

 03/09/2021 - Publicado há 3 anos
A terra representa um modo de vida para os povos indígenas, que se configura em torno de uma filosofia de pertencimento e relacionalidade – Fonte: Acervo pessoal do professor Paulo R. Gallo
Logo da Rádio USP

O Supremo Tribunal Federal retomou o julgamento sobre a demarcação de terras indígenas a partir do Marco Temporal. Nesse critério, a reivindicação de terras pelos indígenas só será possível se elas foram ocupadas antes da promulgação da Constituição Federal de 1988. De um lado, ruralistas são favoráveis à tese. Do outro, povos indígenas lutam contra a medida inconstitucional, defendendo o direito originário de posse dessas terras que também é garantido na Constituição.

“É um momento muito sensível”, destaca Marta Rosa Amoroso, professora do Departamento de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e do Centro de Estudos Ameríndios (CEstA) ao Jornal da USP no Ar 1° Edição. “É preciso lembrar que a Constituição de 1988 reafirma o direito dos povos tradicionais sobre as terras e estabelece um prazo para a regularização das terra indígenas no Brasil de cinco anos, a partir de 1988”, explica. O País segue imerso na discussão por conta dessa dívida histórica do Estado que, do ponto de vista jurídico atual, de acordo com Marta, “é uma tentativa de golpe que ameaça a Constituição”.

A terra representa um modo de vida para os povos indígenas, que se configura em torno de uma filosofia de pertencimento e relacionalidade. “Para os povos indígenas, a terra, o rio, as montanhas constituem seus próprios corpos”, explica Marta. Ela ainda cita o filósofo e cacique Babau Tupinambá da Bahia: “Tudo que é vida tem direito. Tudo que é vida tem espírito. E nós, povos indígenas, conversamos com os espíritos”. Para a pesquisadora, esse é um segundo nível incompreendido dessa relação do indígena com a terra, que é desconsiderado em muitos contextos.

“A gente acompanha na mobilização indígena a angústia diante do perigo de tornar essas terras indígenas mais vulneráveis ainda. O que vemos é o garimpo e exploração mineral sendo legalizados, enquanto a discussão do direito à terra atual suspende o direito constitucional”, avalia. Por fim, Marta ainda revela que os povos indígenas são confrontados a todo momento por pessoas que se julgam no direito de avançar sobre as terras tradicionais, o que gera ainda mais vulnerabilidade para essa população que, ao contrário do que acontece, deveria ser amparada pela legislação.


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar no ar veiculado pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 14h, 15h, 16h40 e às 18h. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


Política de uso 
A reprodução de matérias e fotografias é livre mediante a citação do Jornal da USP e do autor. No caso dos arquivos de áudio, deverão constar dos créditos a Rádio USP e, em sendo explicitados, os autores. Para uso de arquivos de vídeo, esses créditos deverão mencionar a TV USP e, caso estejam explicitados, os autores. Fotos devem ser creditadas como USP Imagens e o nome do fotógrafo.